Sábado, 27 de dezembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 27 de dezembro de 2025
A humanidade atravessa um momento paradoxal: nunca tivemos tanto acesso à informação e, ao mesmo tempo, nunca estivemos tão expostos à desinformação. O avanço das tecnologias digitais e das redes sociais transformou cada cidadão em potencial emissor de conteúdo, mas essa democratização trouxe consigo um efeito colateral devastador — a proliferação das fake news.
O que antes se limitava a boatos locais, transmitidos de boca em boca, hoje se espalha em segundos para milhões de pessoas, atravessando fronteiras e moldando percepções coletivas. É como se vivêssemos em uma arena global onde a verdade disputa espaço com versões fabricadas, e muitas vezes perde.
A pandemia de Covid-19 foi um exemplo emblemático desse fenômeno. Enquanto a ciência corria contra o tempo para desenvolver vacinas e protocolos de segurança, narrativas falsas sobre supostos perigos dos imunizantes ou curas milagrosas se espalhavam com força nas redes.
O resultado foi trágico: milhares de pessoas rejeitaram tratamentos eficazes, alimentadas por teorias conspiratórias que pareciam mais sedutoras do que os dados científicos. Em política, o cenário não é diferente. Eleições em diversos países foram marcadas por campanhas de desinformação, em que versões distorcidas dos fatos influenciaram votos e corroeram a confiança nas instituições. A verdade, nesse contexto, tornou-se apenas mais uma peça no tabuleiro da disputa narrativa.
Esse ambiente é descrito pelo conceito de “pós-verdade”, termo que ganhou notoriedade nos últimos anos. A pós-verdade define uma era em que os fatos objetivos têm menos peso na formação da opinião pública do que emoções e crenças pessoais.
Em outras palavras, não importa se algo é verdadeiro; importa se aquilo reforça o que já acreditamos ou desejamos acreditar. É por isso que notícias falsas prosperam: elas oferecem conforto emocional diante da complexidade do mundo, simplificam dilemas e criam inimigos claros. A pós-verdade não é apenas uma crise de informação, mas uma crise de confiança e de racionalidade.
O problema se agrava pela irresponsabilidade de quem compartilha essas informações sem verificar sua veracidade. Muitas vezes, não há intenção maliciosa, mas sim descuido ou busca por engajamento rápido. O ato de “clicar em compartilhar” tornou-se quase automático, e cada gesto impulsivo contribui para a construção de um ambiente tóxico, em que a desinformação se multiplica como um vírus.
As consequências são profundas: sociedades polarizadas, aumento da intolerância, descrédito da ciência e fragilização da democracia. É como se estivéssemos vivendo um delírio coletivo, em que versões fabricadas se sobrepõem à realidade e moldam comportamentos em escala global.
No entanto, apesar do cenário sombrio, há espaço para esperança. Iniciativas de checagem de fatos, o fortalecimento do jornalismo profissional e a educação midiática são caminhos possíveis para enfrentar a desinformação. Plataformas digitais começam a adotar mecanismos de combate às fake news, ainda que de forma tímida e insuficiente.
O reconhecimento do problema já é um primeiro passo, mas estamos longe de encontrar uma solução definitiva. A verdade pode estar em crise, mas não está derrotada. Cabe a cada um de nós assumir a responsabilidade de buscar, questionar e valorizar os fatos, resistindo à tentação das narrativas fáceis e sedutoras. Só assim poderemos construir uma sociedade menos vulnerável às ilusões e mais comprometida com a realidade.
* Renato Zimmermann é desenvolvedor de negócios sustentáveis e ativista da transição energética