Terça-feira, 27 de maio de 2025

A estratégia da direita no Brasil para ganhar as eleições presidenciais no ano que vem

Fora do governo federal desde 2022, representantes da direita têm encontrado um novo campo de articulação política longe dos holofotes de Brasília. A estratégia envolve emplacar projetos e iniciativas que envolvem bandeiras ligadas ao bolsonarismo em câmaras municipais, assembleias legislativas e governos estaduais, para que sirvam de base para um movimento que visa a pavimentar o caminho para retomar o poder em 2026. Essas proposições são inspiradas no trinômio “Deus, pátria e família”, o que reforça o vínculo de integrantes da vertente política com grupos religiosos.

Um dos principais itens desse movimento de base é a expansão das escolas cívico-militares. Embora o programa federal lançado no governo de Jair Bolsonaro tenha sido encerrado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, houve uma ampliação do modelo pelo País. A iniciativa consiste na gestão compartilhada das instituições de ensino entre educadores e militares, categoria que forma uma das bases do bolsonarismo.

Dados do Censo Escolar mostram que o número de colégios públicos com “militar” no nome saltou de 283 em 2022 para 367 em 2024. Goiás, governado por Ronaldo Caiado (União), lidera esse avanço. Em São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou em abril a transformação de até cem escolas em cívico-militares ainda em 2025, o dobro das 45 existentes. Os dois são cotados como o nome da direita para concorrer ao Palácio do Planalto em 2026.

Pautas de costume

Além da educação, a direita tem encontrado nas pautas de costumes e nas homenagens políticas um canal eficiente de mobilização da base.

“Existe um movimento forte da direita nas câmaras e assembleias. A direita parou de apenas reagir: agora propõe, lidera e ocupa espaço”, afirmou a vereadora de São Paulo Zoe Martínez (PL).

No legislativo paulistano, o vereador Lucas Pavanato (PL) apresentou um projeto de lei este mês para instituir um momento semanal de leitura voluntária da Bíblia durante os intervalos escolares. Em Manaus, proposta semelhante foi protocolada pelo vereador Raiff Matos (PL), que defendeu a medida como um instrumento de “edificação espiritual” opcional.

Também na Câmara Municipal de São Paulo, a vereadora Amanda Vettorazzo (União Brasil) protocolou em abril o chamado “projeto anti-Oruam”, que pretende impedir a contratação de artistas com letras consideradas apologéticas ao crime ou às drogas, como forma de proteger crianças e adolescentes. Medidas semelhantes foram apresentadas em ao menos outras 20 capitais.

Essas proposições se somam a outras com o cunho de defesa da família, como o projeto que torna obrigatório o sepultamento de nascituros e natimortos — já protocolado ou aprovado em cidades como Goiânia (GO), São José dos Campos (SP) e São Paulo. A medida ecoa o discurso antiaborto, em sintonia com o que defendem grupos religiosos. Em ano pré-eleitoral, essas articulações locais ganham peso, pois ajudam a construir palanques regionais e lançar pré-candidaturas para 2026, inclusive ao Congresso Nacional.

Para Lucas Louback, da organização de defesa da democracia Nossas, o avanço de pautas bolsonaristas em câmaras e assembleias faz parte de uma estratégia cultural e digital do movimento.

“O bolsonarismo se estruturou como uma máquina de disputa cultural, sobretudo dentro do digital. Com a derrota de Bolsonaro em 2022, esse projeto passou a se voltar para as prefeituras e câmaras municipais. O que estamos vendo agora é o desdobramento dessa trilha: do embate simbólico on-line ao poder institucional local”, disse ele.

O cientista político Marco Antônio Teixeira, da FGV, avalia que os projetos apresentados conseguem ao mesmo tempo colocar em evidência políticos alinhados ao bolsonarismo e criar uma espécie de agenda política para o ex-presidente.

Reorganização

Mas não é apenas nos legislativos estaduais e municipais que a direita vem se reorganizando. Desde o início do ano, parlamentares de PL, Republicanos e outras legendas conservadoras se movimentam no Congresso de forma coordenada para ocupar o plenário e avançar em temas que desgastam o governo federal.

Na Câmara, o grupo liderado pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS) faz reuniões semanais com os 20 vice-líderes da oposição e organizou um cronograma de participação no plenário, com foco na ocupação da tribuna e na produção de conteúdo para redes sociais. A ideia é garantir que, independentemente do tema em pauta, haja uma voz da direita presente para marcar posição e gerar cortes que reverberem nas plataformas digitais.

Para a antropóloga Isabela Kalil, que estuda a extrema- direita, o bolsonarismo entrou em uma nova fase de “baixa intensidade”, marcada pela capilarização local e pela fragmentação das pautas. “O bolsonarismo saiu do plano estritamente nacional e foi se capilarizando principalmente nas cidades do interior”, afirmou.

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