Quarta-feira, 15 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 14 de outubro de 2025
Com seu voluntarismo característico, o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou que a guerra entre Israel e Hamas em Gaza “acabou”. De fato, ao devolver os últimos reféns israelenses vivos em seu poder, o grupo terrorista Hamas perdeu a única moeda de troca de que dispunha para negociar com Israel em seus termos.
Logo, em tese, a guerra deflagrada pelo Hamas em 7 de outubro de 2023 – com o assassinato brutal de centenas de civis israelenses inocentes e a captura de outros tantos, o que motivou uma resposta impiedosa de Israel em Gaza – acabou.
É justo o ceticismo em torno do acordo, porque o histórico do Oriente Médio não autoriza otimismo, mas há razões para acreditar que as condições para a sustentação do cessar-fogo e do avanço das negociações sobre o futuro de Gaza estão dadas e são razoavelmente sólidas.
A principal delas é que os países que apadrinham Israel, sobretudo os EUA, e o Hamas, casos da Turquia e dos árabes no Golfo Pérsico, decidiram pressionar seus apadrinhados a aceitar o fim do conflito e o avanço do diálogo.
O Hamas, que deu início à guerra por perceber que sua causa – a destruição de Israel – estava sendo abandonada por mais e mais países árabes, aceitou devolver os reféns restantes porque foi convencido de que ficaria sem apoio nenhum de seus habituais patrocinadores.
Para estes, o fim da guerra era uma urgência, porque havia o crescente temor de que Israel poderia atacar qualquer país da região – como fez com Irã, Catar, Síria, Líbano e Iêmen – se isso fosse considerado necessário em sua luta implacável contra o Hamas. Enquanto o Hamas mantivesse os reféns em seu poder, portanto, Israel teria o pretexto militar de que precisava para fazer o que bem entendesse.
Israel, por sua vez, foi pressionado pelo presidente Trump a ceder e aceitar o acordo, mesmo que seu alegado objetivo na guerra, a destruição completa do Hamas, não tenha sido atingido.
Muito ainda será dito sobre as reais motivações de Trump para emparedar o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, que se sentia livre para tomar suas decisões militares, mesmo as mais temerárias, porque julgava que, a despeito de eventuais atritos, sempre teria o apoio dos EUA e, particularmente, de Trump.
Contudo, os interesses de Trump no Oriente Médio vão muito além de Israel. Hoje, o presidente americano faz mesuras ao autocrata da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, e empreende negócios bilionários com os emires e príncipes árabes, numa extensão ainda desconhecida.
Recorde-se, a título de curiosidade, que o governo do Catar ofereceu a Trump de presente um Boeing 747-8, avaliado em US$ 400 milhões, tamanha a proximidade. Não por acaso, consta que Trump resolveu pressionar Israel a encerrar o conflito depois que os israelenses atacaram o Catar a pretexto de eliminar líderes do Hamas.
Logo, parece haver uma confluência de interesses entre os EUA e os países do Oriente Médio em torno do fim do conflito entre Israel e Hamas e da pacificação da região.
Não será um caminho simples, é claro. Enquanto Trump nem sequer mencionou em seu discurso de ontem a possibilidade de constituição, no futuro, de um Estado palestino, os árabes ressaltaram que esse Estado é necessário não apenas para superar a questão palestina, mas também para garantir a segurança de Israel.
De todo modo, o absoluto cansaço com a guerra, tanto em Israel como nos territórios palestinos e no mundo árabe, parece ter sido determinante para o avanço verificado nos últimos dias.
Trump certamente vai reivindicar a maior parcela de responsabilidade pelo fim dos conflitos – ele até cobrou, a sério, que lhe dessem o Prêmio Nobel da Paz –, mas o fato é que, se a guerra realmente acabou, foi em razão do crescente isolamento do Hamas e também de Israel, em meio à destruição quase completa de Gaza, do sofrimento indizível dos palestinos, da exaustão do Exército de Israel e da pressão da sociedade israelense contra um governo que jamais colocou a vida dos reféns entre suas prioridades. Trump, não por acaso visto como herói em Israel, teve o mérito de dar o empurrão que faltava. (Opinião/jornal O Estado de S. Paulo)