Sábado, 05 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 4 de julho de 2025
Aos 61 anos de idade, Marisa Orth, com mais de trinta anos de carreira no cinema e na televisão, e mais de quarenta anos nos palcos, fala sobre comédia, cinema e sua trajetória profissional.
O papo não poderia deixar de começar com o sucesso de Sai de Baixo, série que marcou a televisão brasileira entre 1996 e 2002 e ganhou um especial em 2013. No programa, ela interpretava Magda Antibes, a esposa nada inteligente do empresário corrupto Caco Antibes (Miguel Falabella).
“Eu sou grata pela Magda. Ela é uma entidade que eu recebi, e que tem vida própria hoje; já virou um adjetivo”, diz. “Ela me deu prestígio, e tenho saudade dela — é raro você interpretar uma personagem por seis anos. Você acaba se tornando expert naquela pessoa. Então a Magda me melhorou muito como atriz, porque é difícil pra caramba fazer aquilo, embora ninguém perceba.”
Orth não se incomoda de ser associada à personagem cômica, e pretende seguir na parceria com Falabella. Em 2025, a dupla se apresenta no teatro com o terceiro espetáculo juntos, Fica Comigo Esta Noite.
“É uma honra e um carma”, brinca. “Ninguém se esquece do Caco e da Magda. Eu e ele somos um terceiro produto. A gente inegavelmente tem química, e sabemos trabalhar juntos”. A atriz ainda rasga elogios ao colega, a quem chama de “mestre da comédia”.
“Ninguém vira engraçado”
Mas como alguém aprende a ser comediante? No caso de Orth, isso aconteceu “tentando e levando bronca”, enquanto se inspirava nos grandes humoristas cariocas, cearenses e norte-americanos.
A atriz ainda destaca a experiência fundamental no musical A Família Addams, em que interpretou a matriarca Mortícia Addams, e elogia as colegas de sua geração — Denise Fraga, Andréa Beltrão, Fernanda Torres — como inspirações para se tornar uma intérprete melhor. Mesmo assim, ela crava: “Melhorei, mas a pessoa tem que nascer para a coisa. Ninguém vira engraçado: ou você nasce engraçado, ou não. Não tem jeito”.
Ela estima que a tradição brasileira para o humor se deve à sólida dramaturgia que se desenvolvia no teatro, quando ainda dava os primeiros passos na carreira. Por isso, sublinha a importância de autores como Mauro Rasi (1949-2003) e Vicente Pereira (1949-1993), além dos grupos e coletivos.
“Foi o fim da ditadura, o fim de um tempo de opressão. O movimento gay se fortaleceu e os autores gays apareceram. Obrigatoriamente, na vida deles, era preciso misturar o drama e a comédia, senão não se sobrevivia”, explica. “Foi o tempo das lutas identitárias pelo direito dos homossexuais e das mulheres. Para as minorias entrarem no mainstream, a gente precisa fazer piada, senão, não deixam entrar.”
“O humor chique”
A conversa se aprofunda quando Orth é convidada a comparar o humor de antigamente com as novas formas de comédia. Ela nota que “de repente, o humor virou chique, o humor estava na moda”. Agradece ao filho por apresentá-la aos espetáculos de comédia de improviso, e pontua que o nascimento do Porta dos Fundos foi “um acontecimento”. “Mas foi um processo orgânico: o humor estava muito repetido, velho. A gente precisava fazer humor com coisas mais inteligentes, e dar um salto qualitativo”.
A atriz se felicita do impacto que a internet, os celulares e as redes sociais exerceram na proliferação do humor. Assim, relembra as palavras de Alexandre Machado — autor de Os Normais — para quem “o celular supre nossa necessidade de humor”. Por isso, confessa ser consumidora de “humor de internet”, “um humor trash, um humor de Reels”.
“Pensa em quantos comediantes e quantas coisas engraçadas você vê todos os dias. Mais pessoas têm a oportunidade de contar piadas, e às vezes nem são pessoas engraçadas, mas a edição é engraçada — um corte na hora certa, por exemplo. Às vezes é uma pegadinha que a pessoa faz com a própria mãe, em estilo reality show. Tem muitas formas de humor dentro da internet”, Orth diz, considerando o acesso generalizado à internet como uma democratização da comédia.
“Os Normais e Anna Muylaert”
Relembrando sua trajetória no cinema, especificamente, ela cita Os Normais: O Filme (2003) como um dos filmes que mais gostou de fazer. Imediatamente, o sorriso ilumina o rosto da atriz: “Que filme engraçado! Como eu entendia bem o texto do Alexandre [Machado] e da Fernanda [Young]! Eu lia o roteiro e já ouvia a minha voz. Adorei trabalhar com Evandro Mesquita”, relembra.
Outro destaque de Orth vem da parceria com Anna Muylaert. Juntas, a atriz e a cineasta já fizeram o curta-metragem A Origem dos Bebês Segundo Kiki Cavalcanti (1995), além dos longas-metragens Durval Discos (2002) e É Proibido Fumar (2009).
“Somos amigas desde que a gente tem treze, quatorze anos”, ela recorda. “O objetivo da Anna já era fazer cinema. Ela ganhou uma câmera Super8, e fazia curtas, criava projetos. Ela é uma madrinha para mim: eu sei mais sobre cinema graças a ela. Além disso, ela sempre valorizou muito o trabalho dos atores”.
A respeito da direção de atores, a atriz esclarece que adora ser dirigida, e aproveita para alfinetar os cineastas que têm o que chama de “certo medo do ator”: “Isso não está certo, mesmo que o ator ganhe mais do que o diretor — é um pouco desta síndrome de jogador de futebol. Mas o diretor tem que ser soberano e conceituar a obra. Se a atriz é consagrada, então ela é boa no que faz. E atrizes boas querem ser dirigidas.”