Quinta-feira, 23 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 14 de janeiro de 2023
Da euforia à desolação, o humor dos entusiastas da chamada “revolta dos manés” mudou após a prisão de extremistas no levante contra o Congresso, o Palácio do Planalto e a sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Sobre grupos e canais de aplicativos de mensagem pairam os sentimentos de frustração, receio e tensão. Há usuários que só puderam lamentar o desfecho da investida golpista em Brasília.
Os atos de vandalismo do último domingo tinham por mote uma fala do ministro Luís Roberto Barroso, do STF: “Perdeu, mané”. A declaração foi dada em Nova York, quando o magistrado foi abordado por um apoiador de Jair Bolsonaro, candidato derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva. Desde a eleição, nas ruas, nas redes sociais e em plataformas como Whatsapp e Telegram, bolsonaristas põem em xeque a vitória do petista.
Após a prisão dos extremistas em Brasília, dezenas de grupos de Whatsapp mudaram de nome, mensagens foram apagadas e membros debandaram.
“Que mistura de sentimentos. Eu sinto raiva, tristeza, decepção. É como estar em luto e não saber quando irá terminar. Sinto muito pelas pessoas de bem que lá estão (presas) e as pessoas de mal soltas por aí”, afirmou uma integrante do grupo Peladeiros 1. Há também relatos de desilusão: “Exército nos abandonando mais uma vez”.
O grupo, que é fechado, já se chamou Resistência Joinville. Após a prisão dos extremistas em Brasília, dezenas deles mudaram de nome, mensagens foram apagadas e membros debandaram. “Estamos à beira da loucura. Entramos na era do medo”, disse uma usuária do Peladeiros 1, grupo especialmente afetado pela ação policial: o organizador e administrador, o influenciador bolsonarista Eduardo Gadotti Murara, de Joinville (SC), foi detido e está preso em Brasília.
Medo
Desde então, usuários estão paranoicos. Há o medo constante de que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, leia as mensagens. O sentimento é replicado em grupos, tanto do Whatsapp como do Telegram. Foi de Moraes a ordem para prender manifestantes em flagrante, pôr fim aos acampamentos na frente de instalações militares, prender Anderson Torres – ex-secretário da Segurança Pública do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça de Bolsonaro – e afastar o governador Ibaneis Rocha (MDB).
No Instagram, Murara é dono de uma página em que fazia lives sobre a rotina do acampamento no Quartel-general do Exército em Brasília.
Nos primeiros dias de janeiro, o influenciador fez a convocação para uma “festa” – código usado por bolsonaristas nas plataformas digitais para os protestos, a “festa da Selma”. Tratava-se do ato em Brasília. Catarinenses que não pudessem se deslocar para a capital federal receberam a orientação de procurar o acampamento no quartel de Florianópolis. Murara transmitiu ao vivo a invasão dos prédios públicos da Praça dos Três Poderes.
No grupo do Whatsapp, a reação após as forças de segurança retomarem o controle da situação foi imediata. Todas as mensagens enviadas no domingo foram apagadas. O verde e amarelo cedeu lugar a uma foto de uma bola de futebol.
“Estou preocupada com Eduardo. Não deu sinal”, disse um usuário na madrugada de terça (10). Na tarde do mesmo dia, uma usuária perguntou se Murara havia sido preso. Uma pessoa que mantém contato com o influenciador bolsonarista confirmou a informação, o que causou comoção entre os integrantes. Em seguida, uma dezena de mensagens foi apagada. “Pessoal, tem de evitar falar certas coisas aqui. Pode ser que o telefone do Eduardo esteja com o Xandão (apelido dado a Moraes)”, respondeu outro usuário.
Desolação
A tristeza dominou os bolsonaristas. “Já chorei tanto hoje. O povo não merece isso”, afirmou uma integrante do grupo. Em grupos do Telegram, os relatos se repetem. A presença cada vez maior de supostos petistas infiltrados nos grupos para provocar bolsonaristas eleva a tensão no aplicativo de mensagens: “Tá com medo do Xandão?”, questionou um membro, que trocou a foto de perfil para a de Moraes. Dezenas de usuários trocaram ofensas entre si em seguida.
Em alguns grupos, há a crença de que os atos violentos foram causados pela ação de “infiltrados”. Na opinião de Patrícia Rossini, pesquisadora da Universidade de Glasgow, no Reino Unido, há uma “dissociação da realidade”. “Para algumas pessoas, há uma dissociação entre eles e as pessoas que cometeram os atos violentos. Elas não se veem como parte ou contribuidoras daquele movimento de vandalismo”, disse.