Terça-feira, 03 de dezembro de 2024

Após revelações da Polícia Federal, líderes do Congresso Nacional agem para barrar projeto de anistia

O relatório com mais de 800 páginas em que a Polícia Federal (PF) reúne os indícios de uma trama golpista articulada no governo de Jair Bolsonaro foi visto com preocupação por líderes do Congresso. A avaliação de parlamentares é que os detalhes da operação que visava evitar a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçam o movimento para barrar o projeto que prevê anistia a golpistas, em discussão na Câmara.

Líderes de partidos afirmaram que a conclusão do inquérito da PF, com indiciamento de 37 pessoas, aumentou a pressão contra os favoritos para comandar o Congresso no ano que vem — o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), na Câmara, e o senador Davi Alcolumbre (União-AP), no Senado — para não cederem aos apelos de bolsonaristas e enterrarem qualquer projeto sobre anistia.

A pressão não se limita ao PT e a outros partidos de esquerda. Integrantes do União Brasil, MDB e PSD avaliam que não há clima para discutir o assunto no curto prazo e que a anistia ficará travada pelo menos até 2025.

No Senado, integrantes do MDB querem que Alcolumbre assuma um compromisso público contra qualquer aceno a pedidos considerados golpistas. O partido, que tem a terceira maior bancada da Casa, com 10 senadores, é uma das poucos siglas que ainda não declarou apoio à candidatura de Alcolumbre.

O partido deve decidir apoiar o senador do União Brasil na próxima semana e entregar a ele uma lista de demandas, entre elas o compromisso de não dar andamento a iniciativas encaradas contra a democracia.

“Seja o que for decidido (sobre apoio a sucessão no Senado), vamos propor um roteiro político”, disse o senador Renan Calheiros (MDB-AL).

Da mesma forma, o PSD, que é maior bancada do Senado e o partido presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (MG), é contra discutir anistia e disse que as articulações para um golpe “não foram um momento isolado”.

“Isso não foi um ato isolado, teve um planejamento. Se não tivesse sido o comandante do Exército e da Aeronáutica, poderíamos estar vivendo um momento terrível no país”, disse o líder do PSD, Omar Aziz (AM).

Aziz lembra que, segundo a PF, o próprio Pacheco poderia ser um dos alvos de uma tentativa de golpe. Relatório da investigação aponta que uma das versões da minuta de decreto golpista, discutida no Palácio da Alvorada, previa a prisão do presidente do Senado.

“O PSD não concorda com isso (anistia). O Pacheco também (não concorda), lógico, ele foi uma das pessoas que mais sofreu com isso tudo, vem sofrendo ainda”, disse Aziz.

Por parte de Hugo Motta, a bancada petista o pressiona para travar o andamento da proposta de anistia. O atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), determinou que ela seja debatida em uma comissão especial da Casa. No entanto, petistas avaliam que o fato de o colegiado nem sequer ter sido criado é um sinal claro de que a iniciativa não vai avançar.

Em conversas reservadas com aliados, Motta tem dito ver pouco espaço para a comissão especial sobre a anistia ser criada em breve. O PSD, por exemplo, nem começou a discutir quais deputados pode escolher para compor o colegiado e nem tem previsão de fazer isso.

Pauta econômica

Líderes partidários da Câmara também argumentam que a pauta econômica congestionada não dará espaço para a oposição tentar avançar com o projeto de anistia. O governo anunciou nesta semana um pacote de ajuste fiscal que precisa ser aprovado pelos parlamentares para entrar em vigor.

Já a oposição não desistiu de pressionar pelo assunto. Deputados bolsonaristas pretendem procurar Lira na semana que vem para pedir um prazo para que a comissão seja criada.

O PT, por sua vez, pressiona na direção contrária e solicitou o arquivamento do projeto. “É de todo inoportuno e inconveniente para o processo democrático e paz nacional”, diz o partido em um pedido de arquivamento feito na semana passada, após ser revelada uma tentativa de golpe com o assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.

Antes de ser enviado para uma comissão especial, o projeto estava na Comissão de Constituição e Justiça, comandada pela bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC) e com o caminho livre para ser aprovado naquele colegiado. Após pressão do PT e da base do governo, Lira conseguiu convencer o PL, partido de Bolsonaro, a remeter a proposta a a uma comissão especial para ser mais debatido. Na prática, a manobra fez com que a iniciativa voltasse algumas casas.

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