Sábado, 26 de abril de 2025

Aposentados e pensionistas: para a Polícia Federal, o INSS pouco fez para cobrir as fraudes

A megaoperação deflagrada nesta semana pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria-Geral da União (CGU) para combater descontos irregulares em aposentadorias e pensões gerou um novo constrangimento ao governo Lula da Silva. Até agora, o escândalo derrubou parte da cúpula do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre eles seu presidente, Alessandro Stefanutto, o que é pouco diante da dimensão dos desvios. Quem deveria ter sido demitido, sem delongas, era o ministro Carlos Lupi, da Previdência Social.

Não faltaram indícios de que havia algo de muito errado com o sistema de convênios do INSS com entidades e associações de aposentados. O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou indícios de fraude ainda em 2023 e, no ano seguinte, determinou que o INSS adotasse medidas para impedir prejuízos aos beneficiários.

Uma amostra da CGU com 1,3 mil beneficiários do INSS revelou que 97% deles não haviam dado consentimento para os descontos. Até assinaturas falsas foram forjadas para viabilizar os desvios.

A imensa maioria não tinha conhecimento de que os valores eram descontados em folha ou acreditava que se tratava de procedimento obrigatório.

Enquanto isso, as associações prosperavam. Em conjunto, as entidades investigadas arrecadaram quase R$ 8 bilhões desde 2016, dos quais R$ 2,848 bilhões somente no ano passado. A maioria delas não tinha estrutura nem documentação para prestar os serviços que diziam oferecer. Pudera: o esquema alcançou 6 milhões de beneficiários.

Uma das entidades investigadas, a Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec), arrecadou R$ 135 em contribuições de associados em 2021. No ano seguinte, suas receitas saltaram para R$ 14,9 milhões. Em 2023, já estavam na casa dos R$ 91 milhões, e só entre janeiro e março de 2024 arrecadou R$ 71,6 milhões. Por determinação da Justiça, a associação teve os bens bloqueados.

Para a Polícia Federal, o INSS pouco fez para coibir as fraudes, o que justificou o pedido para afastar a cúpula do órgão. Somente agora os convênios serão suspensos, e os descontos, cancelados. De fato, é inacreditável que um esquema como esse tenha durado tanto tempo, o que torna insustentável não apenas a permanência de Stefanutto no cargo, mas a de Carlos Lupi à frente do Ministério da Previdência.

A bem da verdade, seu nome jamais deveria ter sido cogitado para a pasta. Não é a primeira vez que Lupi se enrola com casos de corrupção. Em 2011, ele era ministro do Trabalho e foi demitido pela então presidente Dilma Rousseff por recomendação da Comissão de Ética Pública. À época, servidores subordinados a ele na pasta foram acusados de extorquir entidades para regularizar sua situação junto ao ministério e de autorizar a criação de sindicatos fantasmas, que não representavam categorias de trabalhadores.

Com a eleição de Lula, Lupi foi reabilitado e voltou frequentar a Esplanada dos Ministérios, desta vez na Previdência Social. Na função, tentou reduzir à força os juros do empréstimo consignado a aposentados e pensionistas em meio à subida da taxa básica de juros, negou a existência do astronômico déficit na Previdência Social e colocou em dúvida até mesmo as projeções do governo sobre as despesas com beneficiários, invariavelmente subestimadas.

Até aí, suas declarações eram quase anedóticas. Mas, na quarta-feira passada, sem qualquer constrangimento, Lupi assumiu a responsabilidade pela indicação de Stefanutto e ainda defendeu o aliado – que, por sua vez, só pediu demissão depois que Lula determinou que deixasse o cargo. Logo, não se deve esperar que o ministro tenha o bom senso de sair do Ministério por iniciativa própria para poupar o governo de mais um vexame.

O governo ainda deve muitas respostas sobre o esquema, mas talvez a maior dúvida resida sobre o ressarcimento dos recursos descontados irregularmente dos aposentados e pensionistas ao longo dos últimos anos. O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, garantiu que “um dia” os valores terão de ser restituídos e disse que os bens e recursos apreendidos das entidades serão usados para compensar as perdas. O mínimo que se espera é que esse dia não demore a chegar. (Opinião/Estadão Conteúdo)

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A megaoperação deflagrada nesta semana pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria-Geral da União (CGU) para combater descontos irregulares em aposentadorias e pensões gerou um novo constrangimento ao governo Lula da Silva. Até agora, o escândalo derrubou parte da cúpula do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entre eles seu presidente, Alessandro Stefanutto, o que é pouco diante da dimensão dos desvios. Quem deveria ter sido demitido, sem delongas, era o ministro Carlos Lupi, da Previdência Social.

Não faltaram indícios de que havia algo de muito errado com o sistema de convênios do INSS com entidades e associações de aposentados. O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou indícios de fraude ainda em 2023 e, no ano seguinte, determinou que o INSS adotasse medidas para impedir prejuízos aos beneficiários.

Uma amostra da CGU com 1,3 mil beneficiários do INSS revelou que 97% deles não haviam dado consentimento para os descontos. Até assinaturas falsas foram forjadas para viabilizar os desvios.

A imensa maioria não tinha conhecimento de que os valores eram descontados em folha ou acreditava que se tratava de procedimento obrigatório.

Enquanto isso, as associações prosperavam. Em conjunto, as entidades investigadas arrecadaram quase R$ 8 bilhões desde 2016, dos quais R$ 2,848 bilhões somente no ano passado. A maioria delas não tinha estrutura nem documentação para prestar os serviços que diziam oferecer. Pudera: o esquema alcançou 6 milhões de beneficiários.

Uma das entidades investigadas, a Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec), arrecadou R$ 135 em contribuições de associados em 2021. No ano seguinte, suas receitas saltaram para R$ 14,9 milhões. Em 2023, já estavam na casa dos R$ 91 milhões, e só entre janeiro e março de 2024 arrecadou R$ 71,6 milhões. Por determinação da Justiça, a associação teve os bens bloqueados.

Para a Polícia Federal, o INSS pouco fez para coibir as fraudes, o que justificou o pedido para afastar a cúpula do órgão. Somente agora os convênios serão suspensos, e os descontos, cancelados. De fato, é inacreditável que um esquema como esse tenha durado tanto tempo, o que torna insustentável não apenas a permanência de Stefanutto no cargo, mas a de Carlos Lupi à frente do Ministério da Previdência.

A bem da verdade, seu nome jamais deveria ter sido cogitado para a pasta. Não é a primeira vez que Lupi se enrola com casos de corrupção. Em 2011, ele era ministro do Trabalho e foi demitido pela então presidente Dilma Rousseff por recomendação da Comissão de Ética Pública. À época, servidores subordinados a ele na pasta foram acusados de extorquir entidades para regularizar sua situação junto ao ministério e de autorizar a criação de sindicatos fantasmas, que não representavam categorias de trabalhadores.

Com a eleição de Lula, Lupi foi reabilitado e voltou frequentar a Esplanada dos Ministérios, desta vez na Previdência Social. Na função, tentou reduzir à força os juros do empréstimo consignado a aposentados e pensionistas em meio à subida da taxa básica de juros, negou a existência do astronômico déficit na Previdência Social e colocou em dúvida até mesmo as projeções do governo sobre as despesas com beneficiários, invariavelmente subestimadas.

Até aí, suas declarações eram quase anedóticas. Mas, na quarta-feira passada, sem qualquer constrangimento, Lupi assumiu a responsabilidade pela indicação de Stefanutto e ainda defendeu o aliado – que, por sua vez, só pediu demissão depois que Lula determinou que deixasse o cargo. Logo, não se deve esperar que o ministro tenha o bom senso de sair do Ministério por iniciativa própria para poupar o governo de mais um vexame.

O governo ainda deve muitas respostas sobre o esquema, mas talvez a maior dúvida resida sobre o ressarcimento dos recursos descontados irregularmente dos aposentados e pensionistas ao longo dos últimos anos. O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, garantiu que “um dia” os valores terão de ser restituídos e disse que os bens e recursos apreendidos das entidades serão usados para compensar as perdas. O mínimo que se espera é que esse dia não demore a chegar. (Opinião/Estadão Conteúdo)

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