Quarta-feira, 24 de setembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 23 de setembro de 2025
A projeção de inflação acima da meta pelo próximo um ano e meio – o tal “horizonte relevante”, sempre destacado nas avaliações do Banco Central (BC) – basta para justificar a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa básica de juros (Selic) estacionada nos atuais (e pesados) 15% ao ano.
Lá está, no comunicado da reunião do Copom, que a projeção oficial para o primeiro trimestre de 2027, com base no cenário atual – que inclui o alto nível de juros –, é de 3,4% ao ano, acima, portanto, da meta de 3% que o BC é obrigado a perseguir.
Ainda que o sistema de metas permita o intervalo de 1,5 ponto porcentual para cima ou para baixo, a decisão comprova que o Copom preferiu agir no modo segurança, mirando o centro do alvo, a fazer apostas em eventuais mudanças benignas de cenário no futuro.
A considerar a probabilidade de aumento de gastos públicos que costuma ocorrer em períodos eleitorais, a campanha presidencial largamente antecipada que já se observa e o aumento das incertezas externas sob a batuta destrambelhada de Donald Trump, seria de fato uma aposta de altíssimo risco.
Desde a adoção, em janeiro, do novo sistema de meta contínua, que verifica mês a mês o resultado da política monetária sobre o IPCA, a inflação rompeu o limite máximo por seis vezes consecutivas, o que obrigou o presidente do banco, Gabriel Galípolo, a escrever em julho a carta explicando os motivos do descumprimento.
Estavam lá, com destaque, ainda que não com essas palavras, a economia sobreaquecida (em especial por políticas de incentivo), a perda de credibilidade do mercado (desancoragem) e a depreciação cambial.
Nada substancialmente positivo aconteceu desde então para trazer as expectativas de inflação a um patamar mais baixo de maneira sólida. Houve algumas melhoras pontuais, como a primeira deflação do ano, em agosto (-0,11%), mas com grande contribuição de fatores extras, como a redução nas contas de luz daquele mês.
O mercado de trabalho aquecido, com a menor taxa de desemprego da História (5,6%), eleva a pressão inflacionária.
Há dez trimestres consecutivos – desde o início de 2023, portanto –, a economia brasileira cresce acima de sua capacidade, de acordo com levantamento da Fundação Getulio Vargas.
A demanda aquecida é um poderoso motor inflacionário e pode ser explicada em grande parte pelos incentivos do governo ao consumo. Mas, para o gastador Lula da Silva, a inflação “está razoavelmente controlada”, como declarou em fevereiro, quando o IPCA em 12 meses já passava de 5%.
No mesmo dia em que o Copom decidiu manter inalterada a taxa de juros de 15%, em vigor desde junho, o Fomc (o Copom norte-americano) reduziu em 0,25 ponto porcentual a taxa básica dos Estados Unidos, para o intervalo entre 4% e 4,25%, sob forte pressão do governo Trump.
Indicou, ainda, que deve fazer mais duas reduções ainda neste ano, numa decisão amparada em dados imprecisos, como o aumento da ocupação resultante da política anti-imigração de Trump, que trouxe ainda mais instabilidade ao mercado internacional, já sacudido pelo tarifaço. Para o Brasil, no curto prazo deve representar um maior fluxo de dinheiro, capital especulativo atraído por juros mais altos.
Efeitos extraordinários devem continuar a ter peso secundário sobre a decisão do BC. São os fatores estruturais que importam, como uma política fiscal crível, comprometida com a sustentabilidade da dívida.
Ao contrário do que costuma acontecer com a meta fiscal, em que expectativas de arrecadação e despesas são constantemente “calibradas” de acordo com o interesse do governo, a definição da Selic tem recorrido a dados efetivos e duradouros.
Quando a estimativa para o “horizonte relevante” chegar (e se mantiver) ao centro da meta, haverá segurança para afrouxar a política monetária.
Mas isso não depende tanto do banco, que atua mais como um “guardião” da meta e para isso estica a corda até o ponto de não causar recessão. No conjunto dos fatores de maior influência, o equilíbrio das contas públicas ocupa papel relevante. (Opinião/jornal O Estado de S. Paulo)