Sábado, 05 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 29 de dezembro de 2023
Num 2023 em que o CDI predominou como maratonista de fôlego, a arrancada final foi da bolsa, que cruzou a linha de chegada em primeiro lugar no ranking das aplicações financeiras tradicionais. O Ibovespa avançou 22,28% no ano, resultado mais forte desde 2019.
O índice de ações do setor imobiliário ganhou 53,27% e o de dividendos, 26,84%. No universo dos alternativos, o bitcoin correu por fora e subiu 136%. Na renda fixa, o melhor resultado foi do o IMA-B 5+, de títulos públicos atrelados à inflação (Tesouro IPCA) com prazo acima de cinco anos, com valorização média de 19,16%.
As ações não eram o investimento campeão desde 2019, quando o índice de “small caps” – empresas de menor liquidez e capitalização de mercado – avançou 58,2% e bateu as demais categorias. Esta também é a primeira vez em quatro anos que o Ibovespa entrega uma rentabilidade real positiva (de 17,07%), ou seja, descontada a inflação, agora controlada após a escalada de preços pós-pandemia.
Mas será que 2024 chega com “energia potencial” para os ativos considerados de maior risco seguirem nessa toada? Para Fernando Lovisotto, executivo-chefe de investimentos da Vinci Partners, há boas chances de o movimento se prolongar.
A aprovação da reforma tributária tirou da frente uma trava para investidores com perfil de longo prazo num momento em que o ciclo de corte de juros avança, com a Selic podendo ficar abaixo de 10% ao ano, dos 11,75% atuais. No ambiente externo, a interpretação de que as taxas americanas alcançaram o seu pico foi um presente de Natal antecipado pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) que permitiu o rali de meados de novembro para cá.
“Por mais que a bolsa tenha subido, por diversas métricas continua barata e ainda não teve realocação dos portfólios locais”, afirma Lovisotto, referindo-se à posição técnica dos institucionais. Ele cita que as entidades de previdência aberta têm cerca 2% alocados em bolsa enquanto as fechadas, 6%, um nível muito baixo. “Não teve movimento generalizado para ativos de risco, o investidor ainda não começou a se mover.”
A sua expectativa é que o dinheiro se movimente para classes mais arriscadas, de longo prazo, devagar porque o juro real ainda seguirá alto, considerando-se uma Selic média de 9,75% e a inflação na casa dos 4%. “Isso faz com que as pessoas não tenham necessariamente a ‘faca no pescoço’ para se mexer”, prossegue o executivo da Vinci.
O mercado de crédito tem prêmio e deve atrair investidores para papéis como debêntures incentivadas e certificados de recebíveis imobiliários (CRI), pelo benefício fiscal que potencializa o retorno. O Tesouro IPCA, que vem pagando cerca de 5% mais a correção monetária, segue como estratégia de defesa e também de ataque, à medida que o pagamento de juros semestrais pode ser progressivamente investidos em bolsa. “Não vai ser uma mudança muito estrutural, mas como está pouco alocado, qualquer fluxo faz muita diferença”, diz Lovisotto.
Até o estrangeiro, que até aqui vinha fazendo tiros de curto prazo na bolsa, pode se animar para uma alocação com viés de longo prazo na renda fixa. Nos últimos dias de 2023, já se via fluxo para notas do Tesouro Nacional série F (NTN-F, prefixadas), um ativo tradicionalmente comprado pelo capital externo, observa o executivo da Vinci. “Se o Brasil fizer tudo certo, tem chances de recuperar o selo de ‘investment grade’ [grau de investimento, ou selo de bom pagador], chutaria em um ou dois anos.” Além da reforma tributária, o fato de o país ganhar relevância como exportador de petróleo extraído da camada de pré-sal ajuda no fiscal.
Os maiores receios dos investidores globais foram tirados um a um de cena no último mês e meio e as bolsas americanas reagiram “com razão”, segundo Andrew Reider, CIO da gestora de fortunas WHG. Se dois meses atrás a expectativa era que o Fed aumentaria os juros, com o PIB dos Estados Unidos mostrando forte resistência, no período mais recente houve uma guinada para um discurso mais pró-afrouxamento monetário.
Fora do bloco das grandes empresas de tecnologia, ele observa que o restante das ações que compõem o índice S&P500 estava com múltiplos deprimidos. Parte do atraso foi corrigida, mas agora entra numa fase do ciclo em que o Fed começa mais a ajudar do que atrapalhar, com possível revisão dos lucros das companhias para cima diante da premissa de um custo de capital menor.
Para as bolsas na América Latina, a visão já era construtiva, mas o ambiente externo é que vinha dominando, diz Reider. “O Brasil aumentou os juros antes de todo mundo. A gente já estava com a cabeça de que a inflação ia surpreender para baixo e que na região o país seria um dos vencedores.”
Ele lembra que no início do ano muito se falava em reabertura da China e a economia desapontou, enquanto no bloco dos emergentes o Brasil foi relativamente bem. O grande direcionador começou a ser o quanto o Banco Central (BC) conseguiria cortar a Selic, algo que também dependia do controle de preços lá fora, havia aquela sensação de que “nunca mais voltaria para a meta [de inflação], o que mudou drasticamente e atropelou qualquer outra preocupação. Por isso, há mais otimismo com o tema corte de juros para o próximo ano”.