Domingo, 06 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 6 de julho de 2025
A declaração final do Brics traz críticas a ações de Israel na Faixa de Gaza, no Líbano e na Síria, mas preserva Tel Aviv e o governo Donald Trump de responsabilidade pelos recentes ataques contra o Irã, membro do grupo, apesar de condenar a ofensiva.
No mesmo documento, o Brics blinda outro integrante, a Rússia, de críticas pela Guerra da Ucrânia enquanto condena nos termos mais fortes ações militares de Kiev contra civis e infraestruturas em território russo.
“Condenamos os ataques militares contra a República Islâmica do Irã desde 13 de junho de 2025, que constituem uma violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas”, diz o documento.
Após discussões, os negociadores conseguiram evitar linguagem mais dura proposta pelos iranianos, com termos como “deploramos”, considerados muito fortes no jargão diplomático. Mas o bloco aponta a “violação do direito internacional e resoluções relevantes da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)” com os “ataques deliberados” à infraestrutura civil e instalação nucleares no Irã.
A declaração menciona Israel ou “israelense” sete vezes e não cita os Estados Unidos, que se juntaram a Tel Aviv em ataque a instalações nucleares iranianas. Uma citação nominal a Washington tem sido evitada pelo grupo em declarações anteriores sobre o conflito, apesar de pressão do Irã, China e Rússia.
Em linhas gerais, o Brics decidiu repetir pontos de um texto sobre os ataques contra o Irã publicado no final de junho, desviando de apelos de Teerã pela responsabilização direta de Washington e Tel Aviv.
O objetivo do tom mais equilibrado foi evitar que o Brics fosse retratado como um bloco anti-Ocidente e anti-Trump. As resistências ao tom agressivo defendido pelos representantes iranianos vieram de países como Índia, que tem intensa cooperação de inteligência com Tel Aviv, e de Emirados Árabes Unidos e Etiópia. O Brasil também atuou para moderar o resultado final do documento.
“Reiteramos nosso apoio às iniciativas diplomáticas destinadas a enfrentar os desafios regionais. Conclamamos o Conselho de Segurança das Nações Unidas a se ocupar desta questão”, diz a declaração em outro trecho.
Já o conflito no Leste Europeu é praticamente ignorado nos 126 parágrafos da declaração final. Por outro lado, há condenação de ataques ucranianos à Rússia, sem qualquer menção às ofensivas do país invasor ao território ucraniano.
Nos poucos trechos em que a Guerra da Ucrânia aparece, o grupo reitera de forma branda as posições tomadas no âmbito das Nações Unidas. A condenação “nos termos mais fortes” ocorre apenas contra ataques à infraestrutura civil em território russo, nomeando alguns episódios.
“Condenamos nos termos mais fortes os ataques contra pontes e infraestrutura ferroviária deliberadamente mirando civis nas regiões russas de Briansk, Kursk e Voronej em 31 de maio, 1º e 5 de junho de 2025, resultando em múltiplas mortes de civis, incluindo crianças”.
Negociadores do Brics acordaram um texto de consenso no sábado (5). Dois pontos eram obstáculos nas negociações: como lidar com o conflito entre Irã, Israel e EUA e como equacionar uma disputa entre Brasil, Egito e Etiópia sobre uma eventual reforma do Conselho de Segurança da ONU.
As dificuldades encontradas nas negociações nos últimos dias evidenciaram os desafios representados pela ampliação do número de membros do Brics, em 2023.
Se, por um lado, o bloco ganhou peso e ambição para se tornar um novo polo de poder global, por outro, enfrenta obstáculos maiores para alcançar consensos. Dentro do próprio Itamaraty, há a avaliação de que a ampliação do Brics trouxe complexidades, nomeadamente pelo grande número de novos integrantes do Oriente Médio, região onde há inúmeras particularidades e crises.
O posicionamento da delegação do Irã —país que se incorporou ao Brics na expansão de 2023— extrapolou a pressão por uma condenação mais dura contra os bombardeios sofridos em junho. Como a Folha mostrou, o princípio do regime iraniano de nem sequer reconhecer o direito de Israel existir foi uma das principais travas.
O Irã opunha-se a aceitar na declaração conjunta menções à solução de criação de dois Estados —um israelense e outro palestino— como fórmula para superar o conflito no Oriente Médio. Para Teerã, a inclusão dessa referência significaria um reconhecimento implícito ao Estado de Israel, algo que o regime dos aiatolás rejeita desde a revolução islâmica de 1979.
Na linguagem acordada no documento final, o bloco mantém a tradição de apoiar a “adesão plena do Estado da Palestina às Nações Unidas no contexto do compromisso inabalável com a solução de dois Estados.” Com informações do jornal Folha de S.Paulo.