Domingo, 15 de junho de 2025

Como funciona implante para tratar depressão resistente aplicado pela 1ª vez no Brasil

Pela primeira vez no Brasil, dois pacientes receberam implantes de um aparelho de estimulação do nervo vago para tratar depressão resistente. O tratamento, que já vinha sendo usado em pacientes com crises epilépticas, consiste em estimular diretamente o cérebro: o implante ativa o nervo vago, que envia sinais elétricos ao órgão, afetando os neurotransmissores e as áreas cerebrais associadas ao humor.

“O que se observou nos pacientes que tinham crises de epilepsia e também sofriam com depressão é que ambos os quadros acabavam melhorando com o uso dos implantes. E aí começou-se a estudar quais seriam os mecanismos do sistema nervoso em que poderiam explicar aquela melhora”, descreve o médico Wuilker Knoner Campos, presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.

Os resultados das pesquisas levaram à autorização do uso do dispositivo em pacientes com depressão resistente nos Estados Unidos, na Inglaterra, e, em 2019, no Brasil – o terceiro país a oferecer a alternativa de tratamento.

As cirurgias foram realizadas no dia  (11) por Knoner Campos no Hospital SOS Cárdio, em Florianópolis (SC).

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que o sistema que será usado, da marca LivaNova, tem indicação para o “tratamento da depressão crônica ou recorrente para pacientes que estejam em um importante episódio depressivo resistente ao tratamento ou intolerante ao tratamento.”

De acordo com o neurocirurgião, os pacientes foram escolhidos pela área de psiquiatria do hospital. Para receber o implante, eles tinham que ter passado, sem resultados suficientemente satisfatórios, por outros tratamentos já estabelecidos para depressão resistente.

Esses tratamentos incluem o uso de cetamina (um anestésico aprovado pela Anvisa para esse fim em 2020); a estimulação magnética transcraniana, uma técnica não invasiva que envolve a aplicação de campos magnéticos de baixa intensidade para estimular áreas específicas do cérebro; e a eletroconvulsoterapia, que envolve a indução controlada de convulsões por meio da aplicação de correntes elétricas no cérebro.

“Um deles é médico e, na realidade, tinha alguma resposta ao fazer a eletroconvulsoterapia, que hoje é considerada o tratamento padrão ouro para o quadro, mas sofria com lapsos de memória, que é um dos possíveis efeitos colaterais. Além disso, esse tratamento (eletroconvulsoterapia) requer que o paciente seja sedado, então a cada sessão é um dia ‘perdido’.”

No contexto brasileiro, o tratamento é ainda considerado bastante recente e não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Para que um paciente seja elegível para o implante, é necessário que receba uma recomendação por parte de um psiquiatra e seja encaminhado a um neurocirurgião familiarizado com a tecnologia.

De acordo com Campos, após as primeiras cirurgias, é esperado que o procedimento se torne mais popular dentro da rede privada de saúde.

Como funciona o implante

Para compreender como o implante age contra a depressão, é fundamental explorar as funções influenciadas pelo nervo vago – alvo do tratamento. Este nervo, que se estende do crânio aos órgãos abdominais, desempenha um papel vital na regulação de diversas funções orgânicas, incluindo coração, pulmões e intestino.

“No tronco cerebral, encontramos o ‘núcleo do trato solitário’, onde as fibras do nervo vago estão conectadas. Esse núcleo processa informações de todo o corpo e reage a alterações, como o aumento da frequência cardíaca. Ele também intercede em problemas, como distúrbios digestivos, regulando a acidez. Esse controle neurológico é crucial, com o nervo vago desempenhando um papel central.”

A teoria do uso do estimulador de nervo vago na depressão baseia-se na influência positiva nos aspectos cerebrais do humor e regulação emocional.

Estudos sugerem que a estimulação do nervo vago pode modular redes neurais desequilibradas na depressão, contribuindo para a melhoria dos sintomas.

A forma como o aparelho estimulador é implantado se assemelha muito à do popular marca passo. Na cirurgia, uma incisão é feita para colocá-lo sob a pele abaixo da clavícula esquerda ou próximo da axila esquerda.

Na sequência, uma segunda incisão é realizada no pescoço para fixar três pequenos eletrodos ao nervo vago esquerdo, e esses eletrodos são ligados ao gerador por um condutor sob a pele. O paciente fica sob anestesia geral durante o procedimento e é esperado que receba alta no mesmo dia.

“Os riscos da cirurgia são considerados muito baixos – são relacionados à cirurgia em si [como infecção, sangramentos e coágulos sanguíneos], e não ao aparelho. Os efeitos colaterais são leves e incluem rouquidão, tosse e soluço, que podem ocorrer porque o nervo vago está ligado ao diafragma”, aponta o neurocirurgião Wuilker Knoner Campos.

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