Segunda-feira, 29 de setembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 9 de outubro de 2021
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação vai deixar de receber R$ 565,6 milhões que iriam para a principal fonte de fomento à pesquisa no país, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Inicialmente, a pasta teria à disposição R$ 655,4 milhões no fundo. Mas 86,3% do valor previsto foi congelado, restando R$ 89,8 milhões. A mudança foi autorizada pelo Congresso, diante de um pedido do Ministério da Economia para mudar o projeto de lei que havia criado o crédito complementar para o FNDCT.
O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, afirmou ontem, em Campinas, que foi “pego de surpresa” pela decisão e quase deixou o cargo ao ser informado do congelamento, na quinta-feira.
Com o congelamento, há espaço para, com outras fontes de recurso, distribuir verbas a outros ministérios. O governo poderá descongelar o valor previsto inicialmente para o fundo. Entidades científicas afirmam que a medida pode prejudicar a pesquisa no país, afetando a concessão de bolsas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e manutenção de institutos. Em nota ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), oito instituições dizem que “a manobra do Ministério da Economia afronta a ciência nacional”.
Surpresa
Pontes criticou o congelamento de verbas para o fundo depois de visitar uma feira de produtos desenvolvidos com nióbio ao lado do presidente Jair Bolsonaro, defensor do uso do metal. A feira foi no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, instituição que pode ser afetadas pelo congelamento. Pontes explicou que o dinheiro seria para subvenção de empresas, financiamentos de startups, melhoria de infraestrutura de laboratórios de universidades e bolsas do CNPQ. Editais já lançados não poderão ser executados, se a retenção não for revertida.
“Tudo isso passa a ficar em risco com a redistribuição desses recursos. Por isso tenho falado da urgência da reposição para a gente conseguir executar este ano. Não adianta vir o recurso em novembro, como a gente vai fazer um edital em um mês? Não é aplicável.”
O ministro admitiu que ficou contrariado na quinta-feira, ao ser perguntado se iria deixar o cargo:
“Eu estava muito, mas muito chateado. Se me perguntasse isso ontem (quinta-feira, 8), provavelmente iria falar: “sim”. Hoje, vendo tudo isso aqui, principalmente aqueles jovens recebendo a medalha, eu pensei: “Pô, eu tenho que continuar para ajudar a levar isso para frente”. Eu me sentiria muito mal em sair e deixar todo esse pessoal.”
Pontes classificou a decisão de “equivocada”. O ministro enfatizou a necessidade de busca de tecnologias para a solução de problemas complexos.
“Isso depende de um tripé de pessoas qualificadas, fomento de infraestrutura e manutenção do sistema. Toda vez que falta orçamento, sim, você coloca em risco esse tripé que mantém a estrutura funcionando.”
Segundo o ministro, o presidente o apoia e se comprometeu a ajudá-lo, mas a área técnica do Ministério da Economia tem mais peso.
“Isso não depende dele (Bolsonaro), depende muito mais da Economia.”
Ao invés de liberar o dinheiro para a área científica, o governo fez repasses para seis pastas. O maior valor foi para o Ministério do Desenvolvimento Regional (R$ 252 milhões), para a ações de defesa civil, habitação e infraestrutura hídrica.
O Ministério da Educação recebeu R$ 112 milhões para bolsas e apoio à educação básica. Comunicações recebeu R$ 100 milhões para programas de inclusão digital. Outras pastas contempladas foram Agricultura (R$ 58 milhões), Saúde (R$50 milhões) e Cidadania (R$ 28 milhões).
Em nota sobre o remanejamento, o Ministério da Economia lembrou que da verba que ficará no fundo para pesquisas, R$ 63 milhões serão para produção e fornecimento de remédios e R$ 19 milhões para laboratórios.
Ritmo de repasses
No ofício enviado ao Congresso para ser autorizado a remanejar o Orçamento, o Ministério da Economia argumentou que a redução dos recursos do fundo foi decidida por causa do ritmo de empenho dos recursos. A pasta diz que, em nove meses, só foram empenhados R$ 87,4 milhões de um orçamento autorizado de R$ 104,7 milhões e não seria adequado elevar os recursos para R$ 655 milhões.
Em nota, o Ministério da Economia diz que a decisão de alterar a destinação do orçamento suplementar ocorreu para “cumprir decisão governamental quanto à necessidade de remanejar recursos neste momento, a qual foi referendada pela Junta de Execução Orçamentária (JEO)”.
Entidades científicas rejeitaram o argumento.
“O grande prejudicado imediatamente vai ser o CNPq, que já lançou editais. Os institutos nacionais de ciência e tecnologia, que fazem pesquisas em várias áreas, inclusive trabalhando com Covid, já estavam prejudicados por falta de recursos”, avisa o presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich.
O CNPq tem 79.649 bolsas vigentes, que não serão afetadas. Mas a medida compromete novas ações como a “Chamada Universal”, lançada no final de agosto, e que prevê R$ 250 milhões para pesquisas em várias áreas. Desse total, R$ 200 milhões viriam do FNDCT.