Terça-feira, 24 de junho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 23 de junho de 2025
Cobras podem gerar medo, repulsa e até pavor em muitas pessoas. Ser então atacado e mordido por um desses répteis é ainda pior de se imaginar, isto sem contar com a possibilidade de ter injetado no corpo um veneno potencialmente letal. E o que pensar de se deixar ser envenenado propositalmente? O americano Tim Friede fez isso, e bem mais de uma vez. Na verdade, ele contabiliza ter passado de 200 mordidas de cobras, com injeção de veneno em mais de 650 vezes, entre 2008 e 2018.
Uma das situações mais memoráveis – e perigosas – foi em setembro de 2001. Friede foi até o porão de sua casa em Wisconsin, Estados Unidos, onde mantinha os répteis como animais de estimação. Numa manobra inesperada, uma cobra egípcia conseguiu morder um dos dedos de seu dono. Em menos de uma hora depois, uma cobra de monóculo cravou as presas em seu bíceps direito.
“Sei como é a sensação de morrer por causa de uma picada de cobra”, disse Friede por videochamada de sua casa na pequena cidade americana de Two Rivers, Wisconsin.
Ele foi levado às pressas ao hospital pela esposa e um vizinho. Quatro dias depois, Friede acordou de um coma. Em 2022, ele falou sobre o episódio, em entrevista à revista National Geographic.
“Duas picadas de cobra, uma após a outra, em uma hora”, lembrou. “Eu basicamente fiquei sem reação e morri. Não foi divertido. Eu tinha imunidade suficiente para uma picada, mas não para duas. Eu estraguei tudo.”
Friede suportou essa dor porque queria obter imunidade total ao veneno, uma prática chamada mitridatismo, que ninguém deveria tentar por conta própria.
O ex-mecânico, hoje na casa dos 50 anos, teve seu interesse despertado por esses animais ainda na adolescência, quando começou sua “coleção” particular, mantendo em casa como se fossem de estimação os que achava na cidade, contou à National Geographic. Com risco constante de ser envenenado, Friede começou a buscar uma forma de desenvolver imunidade. A ideia foi de estimular seu corpo a produzir anticorpos em resposta à toxina, caso fosse picado de forma surpresa. Ele começou a extrair o veneno das cobras que mantinha antes de injetá-lo repetidamente em si mesmo – tendo como precaução diluir o veneno.
Alguns anos depois de iniciar esse experimento peculiar, Friede teve a ideia de que ele poderia ser a base para um tipo melhor de antídoto. No mês passado, um estudo publicado na prestigiosa revista Cell mostrou que os anticorpos no sangue deles protegem contra vários venenos de cobras.
Agora, os pesquisadores esperam que a hiperimunidade de Friede possa até mesmo levar a um antídoto universal. A maioria dos soros antiofídicos atuais abrange apenas uma ou algumas das 600 cobras venenosas do mundo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), até 138.000 pessoas morrem de picadas de cobra a cada ano, enquanto 400 mil sofrem amputações ou outras deficiências. No entanto, acredita-se que esses números sejam muito subestimados porque as vítimas geralmente vivem em áreas remotas e pobres.
(Com O Globo)