Sábado, 05 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 4 de julho de 2025
A batalha digital deflagrada nos últimos dias pelo PT e apoiadores do governo, com respostas de partidos da base e oposição, marca uma virada no uso da inteligência artificial (IA) na arena política. Na esteira da crise da derrubada do aumento do IOF, vídeos feitos com ferramentas cada vez mais baratas e ágeis reforçaram a estratégia de “pobres contra ricos”, adotada pela esquerda, em ataques diretos ao Congresso e ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Especialistas apontam que o baixo custo da criação de imagens sintéticas, aliado à velocidade com que são feitas e disseminadas, dá a elas mais capacidade de resposta à urgência dos debates e gera preocupação com sua aplicação no contexto eleitoral. O risco, alertam, é que as peças enveredem para a desinformação.
Relatório da consultoria Bites mostra que a mobilização digital começou em 17 de junho, um dia após a reação do Congresso às mudanças no IOF começar a se desenhar.
No último dia 27, o perfil oficial do PT publicou um vídeo gerado por IA para enfatizar o slogan “Taxação BBB: bilionários, bancos e bets” e disparar a mensagem de que a gestão Lula vai aliviar para os mais pobres e aumentar a taxação dos ricos.
Em resposta, figuras da oposição, como o governador mineiro Romeu Zema (Novo), e até partidos da base, como PP e União Brasil, também lançaram mão de ferramentas de IA para rebater os argumentos.
Ferramentas
O movimento do PT foi seguido por páginas de esquerda divulgando vídeos contra o Congresso. O foco passou a ser Motta, apelidado de “Hugo Nem Se Importa”, que virou alvo de paródias com os conteúdos artificiais. Os vídeos gerados por IA são produzidos, em sua maioria, pelo perfil “brasilsatiradopoder”, no TikTok. Uma das publicações satiriza situações de privilégio que seriam vividas pelo Congresso, apontado como “inimigo do povo”. “Um brinde ao Hugo Nem Se Importa, o herói do Brasil que segue a elite e ignora o povo”, diz o homem na publicação compartilhada por diversos perfis pró-governo.
Ao divulgar uma peça com imagens geradas com auxílio da tecnologia e que mira no presidente da Câmara, o influenciador Thiago dos Reis, um dos mais proeminentes da bolha petista, foi na mesma linha: “Mais um excelente vídeo expõe a hipocrisia de Hugo Motta, cachorrinho dos bilionários”, escreveu.
O pico da repercussão da mobilização governista aconteceu na quarta-feira, com 280 mil menções e 1,7 milhão de interações, mas o engajamento se manteve em patamar elevado ao longo dos últimos dias. Os dados indicam que a gestão Lula conseguiu pautar o debate nas redes, com o apoio de perfis como o do próprio presidente, o do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) e de influenciadores ligados ao Planalto. A agilidade da reação governista à derrubada das medidas no Congresso chama a atenção. Ao contrário da crise do Pix, por exemplo, que colocou Lula nas cordas em janeiro, a resposta de agora foi célere.
Em parte, a velocidade pode ser explicada pela facilidade com que essas imagens podem ser criadas. A maioria das peças de qualidade produzidas por IA, hoje, chega até a misturar mais de uma ferramenta, segundo o professor da Universidade Anhembi Morumbi Lucas Lespier. Nos vídeos espalhados por petistas nos últimos dias, observa ele, isso fica evidente, dada a construção de ambientes em 3D.
“Há ferramentas novas que são relativamente simples de serem adquiridas, não têm valores altos. E há um interesse delas em entrar no Brasil. Para professores e estudantes, por exemplo, liberaram 15 meses grátis”, diz o pesquisador. “Outras têm pacotes razoáveis por nove, dez dólares por mês. Para campanha política, que tipicamente é algo caro, estamos falando de valores irrisórios. Barateia muito a campanha. Na hora de pensar em vantagens, não há como não falar nos custos e na agilidade.”
Já os perigos, aponta Lespier, recaem sobre o potencial de desinformação, sobretudo quando não há o aviso de que o conteúdo foi feito por IA.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem se debruçado sobre a IA e seus efeitos nas campanhas. No ano passado, a Corte publicou uma resolução que determina que o eventual uso da tecnologia em peças eleitorais seja informado pelos candidatos. Também se preocupou em proibir a inteligência artificial para difamação e distorção da realidade por meio dos “deepfakes”. Na semana passada, a ministra Carmen Lúcia designou um grupo de trabalho para aprimorar as regras antes de 2026, dada a velocidade com que a tecnologia se desenvolve.
Fora do período eleitoral, no entanto, questões relacionadas ao uso de IA na política vão para a Justiça comum, explica o advogado Eduardo Damian Duarte, especialista em direito eleitoral. (Com informações do jornal O Globo)