Quinta-feira, 15 de maio de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 14 de maio de 2025
Diferentemente dos últimos governos — inclusive, mas não só, os do PT —, a administração Lula tem enfrentado vários tipos de crises, mas não acusações de corrupção ou de negligência em episódios de desvio de recursos públicos. Nosso justificado pessimismo com os padrões morais da política não deve nos impedir de reconhecer isso.
Mas agora, com a descoberta de quadrilhas mancomunadas com funcionários públicos desviando parte da aposentadoria de velhinhos há anos, impunemente, o nível da crise mudou. Roubar a bolsa do órfão e da viúva é indignidade que ofende qualquer um com o mínimo de decência.
Saber que o governo não só fracassou em impedir como também demorou a agir, mesmo alertado, é politicamente indesculpável. E, obviamente, é tarde demais para dizer que não sabia ou que não podia ter feito algo para impedir que bilhões fossem desviados em seu turno de guarda.
Demorou para o governo entender que o escândalo do INSS é uma bomba política. E é curioso como ainda há quem ache que isso pode não afetar a imagem de um governo que já se encontra em seu pior momento. Agora, vem o corre-corre.
O ministro da Casa Civil responsabilizou a Controladoria-Geral da União por não emitir os alertas em tempo e com a gravidade merecida. O ministro da CGU, por sua vez, recorreu a um vídeo para minimizar o escândalo, acusar os críticos de espalharem fake news e elogiar o rigor de Lula na apuração. O fato é que, até agora, duas demissões depois, ninguém no governo assumiu qualquer responsabilidade por inação ou conluio.
Sem falar nas respostas que beiram o absurdo, como a alegação de que o governo, por meio da (sua?) Polícia Federal, foi quem desbaratou uma operação que atravessou todo o mandato de Lula. Ou a cartilha de 30 páginas — acreditem —, em papel, distribuída pela liderança do PT na Câmara com o título “Desmentido Nikolas Ferreira”. Sim, o PT veio com uma cartilha impressa para uma luta de reels de 15 segundos.
O que se viu até aqui foi a repetição do velho padrão que quase destruiu o PT em gestões passadas. Em vez de reconhecer a gravidade dos fatos e reagir com compromisso com apuração e responsabilização, o governo recorre à fórmula de sempre: negação de responsabilidade, transferência de culpa, autoelogio, ataque aos críticos.
Conhecemos esse roteiro, e ele tem dois problemas. Primeiro, é a resposta mais previsível e, por isso mesmo, a de menor credibilidade. O PT sempre nega culpa, responsabilidade ou gravidade, enquanto se autoelogia e ataca a credibilidade dos críticos — e não se afastou uma vírgula desse script neste caso. Segundo, esse tipo de resposta preguiçosa e automática é lido como cinismo e irrita mais do que convence a opinião pública.
Mesmo em um escândalo em que a acusação é de negligência, não de corrupção, o PT não consegue adotar um novo protocolo? Não. Temos a reincidência de uma estratégia fracassada, só que agora diante de um público mais desconfiado e de uma oposição mais ágil nas redes.
Toda crise é uma janela de oportunidade para a luta política e para a disputa pelo controle das imagens públicas dos envolvidos, por meio de uma guerrilha de atribuições de responsabilidade. Nikolas Ferreira, por exemplo, transformou o caso em um vídeo com mais de 100 milhões de visualizações. Desde o episódio do Pix, o deputado descobriu como é moleza surrar a comunicação do governo, que, incapaz de acompanhar o que se passa nas redes digitais, nunca está preparado com informações nem é capaz de produzir conteúdo para enfrentar seus detratores.
O manual de comunicação de crise é claro: quanto maior a percepção de responsabilidade, mais o público espera reconhecimento e ação concreta. A resposta eficaz deve ser rápida, bem informada, coordenada, transparente. Ignorar, retardar ou adotar o mesmo discurso de sempre reforça a ideia de que nada mudou.
Entre o suicídio reputacional — que seria admitir culpa plena, com risco de destruição política—, que os seus detratores desejam, e a velha negação arrogante e infantil adotada, há um meio-termo: reconhecer em que falhou, explicar como isso aconteceu e anunciar medidas concretas para impedir que se repita. Isso se chama ação corretiva. É o mínimo que se espera de quem governa.
A crise no INSS é um teste de maturidade política para o governo. O PT tem uma chance rara de mostrar que aprendeu com os erros do passado e que está disposto a inaugurar um novo protocolo de resposta a escândalos — um que inclua responsabilização, transparência e respeito pela indignação legítima dos cidadãos. (Opinião de Wilson Gomes/Folha de S.Paulo)