Quarta-feira, 06 de agosto de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 25 de agosto de 2024
O governo Lula promoveu reformas vitais para o País, como a tributária, mas, ao mesmo tempo e com frequência, se engaja em retrocessos, ameaçando reeditar políticas fracassadas do passado. Desde que assumiu a Presidência pela primeira vez, em 2003, ele critica as agências reguladoras – órgãos de Estado, não de governos – por sua demasiada independência. Na quarta-feira (21), emitiu um decreto que levanta os temores de que pode mais uma vez tentar enquadrá-las. O presidente reuniu-se também na quarta com os fundos de pensão estatais para discutir formas para que possam investir seus recursos no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O velho PAC deixou milhares de obras inacabadas e um legado de corrupção e prejuízos para as fundações, que tiveram de ser cobertos pelos cotistas. Não há qualquer garantia de que o novo programa será mais virtuoso que o anterior.
As agências reguladoras são independentes e foram criadas em 1997, quando deslanchou o processo de privatização das estatais, no governo Fernando Henrique Cardoso. Lula quis trazê-las de volta para o seio do Executivo e subordiná-las aos ministérios, mas nunca teve sucesso. Em 2007 tentou aprovar a Lei Geral das Agências Reguladoras, que não prospere no Congresso. Continua descontente até hoje. Em decreto publicado no Diário Oficial, o governo tenta revisar a regulação geral, com a Estratégia Regula Melhor, no âmbito do Pró-reg, criado em outubro passado. O governo nega com veemência que seu objetivo seja subjugar os entes reguladores.
O presidente Lula e alguns ministros querem apensar as agências aos ministérios. A perda de independência obrigaria os reguladores a seguirem orientações frequentemente políticas, não técnicas, dos governos de turno, e os pilares da regulação – confiabilidade, previsibilidade, estabilidade das regras – seriam destruídos. Como é sabido que da qualidade da regulação depende a atração de investimentos, o governo não terá nada a ganhar e muito a perder com isso.
O que está em jogo é o poder político, expresso na quantidade de cargos que poderão ser divididos entre partidos da disforme base governista. O processo de loteamento das agências se iniciou nos governos petistas e continua agora, atendendo ao apetite sempre desperto das legendas do Centrão. Vale mais a influência política, que tende a se refletir na consecução de interesses particulares, do que a preocupação com regras técnicas e regulação justa.
Limitar a independência das agências pode ter consequências muito desastrosas para o país, que teve uma experiência prática sobre o tema. Se a Anvisa, durante a pandemia, não fosse independente e não tivesse assegurado que iria vacinar menores de 12 anos contra a covid-19, apesar das ameaças, desafios e calúnias do então presidente Jair Bolsonaro, que queria impedi-la, possivelmente as mortes seriam em maior número do que as 700 mil registradas.
Fundos de pensão
O presidente Lula se reuniu com Funcef (fundo da Caixa Econômica Federal), Petros (Petrobras), Previ (Banco do Brasil) e Postalis (Correios), quatro dos maiores fundos de pensão estatais, para que invistam em obras do PAC, por meio de ampliação do do leque de investimentos permitidos. Esses fundos tiveram prejuízos e estiveram envoltos em corrupção, objeto da Operação Greenfield, em 2015. Os Fundos de Investimentos em Participações eram veículos para isso. Previ, Funcef e Valia (Vale) perderam dinheiro, por exemplo, com o FIP Sondas, da Sete Brasil, companhia escolhida para produzir mais de duas dezenas de plataformas para a Petrobras e que faliu ruidosamente depois. No novo cardápio de aplicações estariam as debêntures de infraestrutura.
A experiência de pouco atrás francamente desaconselha a atração dos fundos. “O histórico recente da participação dos fundos estatais em iniciativas apoiadas pelo governo é trágico”, diz Marcos Mendes, pesquisador do Insper. Como entidades privadas, têm de proteger o patrimônio de seus cotistas e garantir-lhes a melhor rentabilidade com segurança. O governo em geral não é um bom assessor financeiro. “Investimentos que focam em agendas políticas são inconcebíveis”, afirma Geraldo Ferreira, conselheiro independente de empresas. “Os resultados já conhecemos e os cotistas sofreram muito no bolso”. (Opinião/Valor Econômico)