Terça-feira, 21 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 3 de fevereiro de 2024
Novo diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Marco Cepik defende que o papel do general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ao qual estava subordinada a Abin durante o governo Bolsonaro, numa suposta agência paralela de inteligência, deve ser esclarecido. “Por omissão ou cometimento do ato, qual foi seu envolvimento nos atos que estão sendo investigados?”, questionou. O militar foi intimado pela Polícia Federal para depor na próxima terça-feira (6) sobre o funcionamento de uma Abin paralela.
Cepik também defendeu a sindicância sobre a contratação do programa espião de monitoramento de celulares israelense FirstMile no governo Michel Temer, usado pelo governo Bolsonaro. “A ideia de que houve obstrução ao processo investigatório me parece inconsistente, mas se há uma preocupação tem de ser apurado”, respondeu Cepik, um estudioso da inteligência no Brasil e na América Latina.
1. Nos últimos dias falou-se muito sobre a participação do general Augusto Heleno na Abin paralela. Heleno deve ser alvo de uma investigação?
Não posso me manifestar quanto ao cotidiano administrativo do comportamento do general Heleno, que era o ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). O fato é que a Abin estava, naquele momento, subordinada à estrutura do GSI e, portanto, havia uma relação de autoridade entre o ministro e o diretor da Abin, Ramagem. Ele [Heleno] pode dizer que não esteve envolvido com o FirstMile, ou com a decisão disso ou daquilo, mas ele era o ministro-chefe e essas dúvidas da sociedade devem ser esclarecidas. Qual era o papel dele? Isso, como seria com qualquer agente público, deve ser esclarecido. Por omissão ou cometimento do ato, qual foi seu envolvimento nos atos que estão sendo investigados?
2. Qual é sua expectativa sobre as investigações sobre a existência de uma Abin paralela no governo de Jair Bolsonaro? Já há indícios de que isso, de fato, ocorreu e foi usado para investigar opositores e jornalistas, entre outros?
O tempo da política e a ansiedade da cidadania para ter respostas sobre isso são um pouco diferentes dos tempos da investigação, da apuração e do juízo. Teremos de aguardar o final das investigações da Polícia Federal, o inquérito, e eventualmente a tradução disso num procedimento judicial para ter certeza. Não vou me antecipar. A Polícia Federal tem insistindo, e a sindicância, de fato, apurou, que houve utilizações irregulares, mas a gente não sabe a extensão. As condutas individuais estão sendo averiguadas. Há indícios, e para saber se esses indícios vão se comprovar ou não, teremos de aguardar os resultados dos trabalhos apuratórios, tanto da Corregedoria em sede administrativa, quanto da Justiça, do inquérito policial, e depois do eventual processo de juízo.
3. O que se pode confirmar até agora?
Havia pessoas operando dentro da Abin e de outros órgãos públicos, nas polícias, para avançar a agenda do presidente de maneira irregular nesses órgãos. Estamos falando do uso de ferramentas e de procedimentos na gestão Ramagem na Abin. Mas existem, também, processos na Polícia Rodoviária Federal, e na própria Polícia Federal. Tudo isso é consistente com as declarações do presidente à época, que disse não confiar no sistema de inteligência brasileiro e que tinha a inteligência dele.
Esta rede de colaboradores do presidente [Bolsonaro] era informal, aparentemente, mas ela se manifestou em relatórios, e algumas ações que agora estão vindo à luz. Existe uma preocupação legítima da cidadania quanto a isso. Espero que o resultado das apurações comprove ou não essa hipótese investigativa, e que os fatos e as condutas dos indivíduos sejam apurados e que eles respondam por isso.
4. Qual é sua expectava sobre a sindicância sobre o programa israelense FirstMile?
Se espera que a investigação apure qual foi a legitimidade dos atos que foram monitorados, dos telefones que foram monitorados, sua quantidade exata, e que se separe claramente o que era um uso que à época era amparado por um parecer da Advocacia-Geral da União daquilo que configura claramente desvio de finalidade. Teremos a exata dimensão do dano causado para a democracia. Não é confortável para a cidadania saber que um órgão pode usar um sistema comprado para fazer uma coisa, para fazer outra. Quais números [foram espiados], com que impacto, com que justificativas, para que? A investigação tem de avançar.
6. A família Bolsonaro está preocupada com as investigações…
Não sei, seria um prazer dar opinião como cientista político, ou cidadão, mas como diretor adjunto da Abin não posso me manifestar.