Segunda-feira, 06 de outubro de 2025

“Efeito Trump” faz 96 doutorandos brasileiros desistirem dos Estados Unidos

Diante do corte do financiamento da Casa Branca para pesquisa e ciência e das ofensivas do presidente Donald Trump contra alunos estrangeiros e universidades, pesquisadores têm desistido do sonho americano para estudar.

Entre os motivos, estão o medo de problemas pessoais, como eventuais recusas de visto, ou de cerceamento de suas pesquisas. Neste ano, 96 pesquisadores que receberam bolsa da Capes, agência de fomento vinculada ao Ministério da Educação (MEC), desistiram do doutorado-sanduíche nos Estados Unidos. Esses estudantes já estavam com o aceite para ir a uma universidade americana, mas mudaram o país de destino – prática que não ocorria até o ano passado.

O doutorado-sanduíche é um modelo que permite cursar parte da pós-graduação em uma universidade estrangeira, fazendo uma extensão da pesquisa iniciada no país de origem. Espanha, Canadá, Portugal, Reino Unido, França e Holanda estão entre os principais novos destinos escolhido pelos 96 doutorandos.

A Capes aprovou 2.463 bolsas de doutorado-sanduíche no exterior em 2025, sendo 458 delas (18,5%) em universidades americanas. Todos os pedidos de troca foram de pesquisadores que iam para os Estados Unidos.

O número de desistentes é maior, uma vez que pesquisadores podem obter bolsa para a pós-graduação no exterior por meio de outros mecanismos, como programas estrangeiros ou por outras agências brasileiras de fomento à pesquisa.

Doutoranda em Políticas Científicas e Tecnológicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Thais Capovilla ganhou bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Com pesquisa sobre a produção científica em inteligência artificial, o Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), em Boston, liderava sua lista de preferências, uma vez que os Estados Unidos são os principais produtores de trabalhos acadêmicos na área. Mas desistiu.

“A surpresa veio quando o próprio governo começou a atacar suas universidades de ponta, inclusive Harvard, outra grande universidade de Boston”, conta a doutoranda.

“Quando tomei conhecimento de que estudantes, principalmente os estrangeiros, se sentiam inseguros, comecei a me sentir insegura também. Percebi que nos Estados Unidos atualmente não basta mais estar dentro da lei”, relata.

Como Thaís ainda não estava com o doutorado acertado em uma universidade americana, seu orientador na Unicamp sugeriu que ela buscasse alternativas na Europa. Agora, ela estuda ir, no próximo ano, para Inglaterra, Alemanha ou Holanda, onde também há estudos relevantes na área de IA.

“A pesquisa precisa de um grau de liberdade. Que a instituição vai respaldar, seja lá o que acontecer, principalmente se você pesquisa temas delicados”, afirma.

A Fapesp não tem levantamento sobre o número de pesquisadores que desistiram de alguma bolsa nos Estados.

“A oportunidade de fazer doutorado sanduíche fora do País é importante tanto para nossa formação profissional, como para o currículo”, resume Thais.

Também pesquisador de Inteligência Artificial, Rodrigo Nogueira teve seu visto negado quando planejava uma viagem para dar uma palestra em Harvard, em fevereiro. Ele acredita que foi barrado devido à sua área de atuação, que se tornou campo de disputa global entre as principais potências globais.

“Fiz a entrevista no Consulado em São Paulo. Estava tudo normal até que falei que trabalhava com inteligência artificial. Naquele momento, tudo mudou. Parece que chegou uma nuvem de chuva na conversa”, contou ele.

Na entrevista, seu visto foi aprovado, conta Nogueira. No dia seguinte, porém, recebeu uma comunicação do consulado exigindo seu currículo, uma cópia da sua tese de doutorado feita na Universidade de Nova York, todos os seus artigos publicados e o motivo de uma viagem que havia feito para Taiwan.

Ele enviou os documentos, mas recebeu comunicação negando a permissão de entrada e dizendo que não poderia se candidatar a um novo visto pelos próximos doze meses. Com isso, ele não pôde comparecer ao evento para o qual havia sido convidado.

No mês seguinte, Trump entrou em rota de colisão com a Harvard, com ameaças de cortes de verba e veto a alunos estrangeiros. Isso ocorreu após a universidade se negar a cumprir exigências da Casa Branca, que foram vistas pela instituição como ataques à liberdade de expressão e de cátedra.

A emissão de vistos para estudantes nos consulados americanos chegou a ser suspensa e depois foi retomada com novas regras. Agora as autoridades fazem uma varredura do conteúdo nas redes sociais dos requisitantes, a fim de traçar um perfil dos candidatos, que precisam manter seus perfis abertos.

(Com informações do jornal O Estado de S. Paulo)

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