Domingo, 19 de maio de 2024

Empresários e banqueiros brasileiros assinam nova carta aberta de apoio à democracia; divulgação será nesta terça

Um variado grupo de empresários brasileiros aderiu à carta em tom duro em defesa da democracia brasileira e ao sistema eleitoral – e com críticas a “desvarios autoritários” –, com divulgação programada para esta terça-feira (26). O manifesto, que vem sendo gestado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e circula desde a semana passada, ganhou assinaturas de peso no mundo empresarial e financeiro.

Entre os nomes que assinaram o texto estão o de Roberto Setubal, Cândido Bracher e João Moreira Salles (Itaú), representantes da indústria como Walter Schalka (Suzano) e de empresas de bens de consumo como Pedro Passos e Guilherme Leal (Natura). Assinaram a carta também Eduardo Vassimon (Votorantim), Horácio Lafer Piva (Klabin), Pedro Malan (ex-ministro da Fazenda do governo Fernando Henrique Cardoso) e o economista José Roberto Mendonça de Barros.

A polêmica reunião entre o presidente Jair Bolsonaro e embaixadores de vários países, na qual o presidente da República colocou em dúvida o sistema eleitoral do Brasil, impulsionou o movimento de defesa do sistema eleitoral, apesar da dificuldade em se costurar um consenso entre empresários de diferentes inclinações políticas.

No entanto, o texto final faz uma defesa clara do regime democrático, deixando claro que todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) devem trabalhar para proteger o que diz a Constituição Federal. O texto afirma ainda que houve ações que colocam em “perigo a normalidade democrática”. Além disso, a carta termina com a frase “Estado democrático de direito sempre” escrita em letras garrafais.

A carta cita a Carta aos Brasileiros, um texto de repúdio ao regime militar, redigida pelo jurista Goffredo Silva Telles, e lida em 8 de agosto de 1977 na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. A carta continua a seguinte frase: “Queremos dizer (…) que nós aqui estamos e aqui permanecemos, decididos, como sempre, a lutar pelos Direitos Humanos, contra a opressão de todas as ditaduras.”

A dificuldade em costurar um texto final para a carta se deu, segundo uma fonte, porque a maior parte dos empresários está nos grupos dos “anti”, seja contra a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou Jair Bolsonaro (PR). Desta forma, havia um medo generalizado entre determinados executivos – especialmente os que tendem a apoiar Bolsonaro – que, ao assinar uma carta de apoio à democracia, estariam em direto assinando um atestado de apoio a Lula.

Segundo essa fonte, existe uma “multiplicidade de posicionamentos” entre os empresários, mais ou menos como ocorre na população brasileira em geral. Outros dois grupos bem definidos seriam os que têm o voto cristalizado em Lula ou Bolsonaro e a turma que quer, a todo custo, evitar a polarização. No entanto, a essa altura, o consenso de que uma terceira via venha a surgir é considerada bem improvável entre o setor produtivo.

Leia a íntegra da carta, divulgada pela Faculdade de Direito da USP:

Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito

Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o Estado Democrático de Direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais. Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal. Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular. A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição: ” Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição “.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral. Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em um país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude. Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos. Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições. Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional. Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão. Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e aos brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições. No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições. Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona: Estado Democrático de Direito Sempre!

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