Segunda-feira, 08 de dezembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 10 de setembro de 2025
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux apresentou em seu voto no julgamento da trama golpista uma série de divergências em relação aos crimes imputados aos réus na denúncia. Além de acolher a maioria dos pedidos das defesas, Fux considerou que os réus não incorreram nos crimes de organização criminosa e dano ao patrimônio, além de entender que os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição de Estado de Direito devam ser incorporados em uma só conduta.
O posicionamento do magistrado contrariou o que haviam entendido os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
Veja as principais divergências de Fux:
* Organização criminosa
— O que diz a lei:
O crime de organização é descrito na Lei 12.850, de 2013, no qual é definido como uma “associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.
– O que diz Fux:
O ministro defendeu que não é suficiente apenas a reunião de quatro pessoas ou mais para o cometimento de um crime “específico” para configurar o crime de organização criminosa. Segundo ele, é preciso ter “estabilidade, permanência e intenção” de cometer delitos futuros — o que ele não viu na ação dos denunciados.
“A existência de um plano criminoso não basta para a caracterização do crime de organização criminosa”, afirmou Fux.
Ele ainda destacou que não se pode “banalizar” esse conceito e que as condutas se “encaixam melhor” no crime de “concurso de pessoas” — um tipo penal mais leve do que o de organização criminosa.
Na interpretação de criminalistas, Fux levou em consideração a necessidade de haver uma série indeterminada de crimes pelo grupo.
* Golpe de Estado e abolição do Estado Democrático
– O que diz a lei:
O artigo 359-L, do Código Penal, define como crime “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais.” Já o artigo 359-M, do mesmo Código, criminaliza “a tentativa de depor o governo legitimamente’ por “meio de violência ou grave ameaça”.
– O que diz Fux:
O ministro defendeu a “absorção” dos crimes de golpe de Estado e de abolição do Estado Democrático de Direito. Na visão dele, um crime complementa o outro e, portanto, devem ser unificados e não terem as penas somadas, sob risco de uma dupla punição.
“Nesta situação específica, a que nos estamos referindo, a tentativa de golpe de Estado, na minha visão, absorve o crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, disse ele. “O golpe é um meio para a abolição do Estado Democrático de Direito”, acrescentou.
De acordo com especialistas, Fux já havia sinalizado antes que votaria pela “consunção” das duas infrações.
“Essa questão da consunção é uma tese que o ministro já tinha levantado de algum modo, que é a tese da defesa, que o crime de maior gravidade engloba o de menor gravidade. É uma questão de opinião”, afirmou Lenio Streck, jurista e professor de Direito Constitucional da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).
* Dano ao patrimônio
— O que diz a lei:
O artigo 163 do Código Penal afirma que incorre no crime quem “destrói, inutiliza, deteriora” o “patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviços públicos”.
— O que diz Fux:
O ministro afirmou que a acusação não conseguiu comprovar a autoria de cada acusado no tipo penal. Segundo ele, a Procuradoria-Geral da República não individualizou as condutas no crime de dano qualificado contra o patrimônio da União.
“Reconhecer autoria mediata seria postura excessivamente paternalista e aniquiladora da autonomia dos criminosos que depredaram o patrimônio público”, afirmou Fux, que prosseguiu:
“O contexto de um evento multitudinário (relativo a multidões, como o caso do 8 de Janeiro), embora dispense um detalhado, exagerado, exame da conduta de cada réu, ele não desobriga o órgão acusatório em estabelecer um liame (vínculo) mínimo entre cada acusado e o ato ilícito. E esse vínculo não foi demonstrado.”
Na opinião de especialistas, Fux “descaracterizou” os elementos que configuram o delito.
“Cada crime tem elementos que o integram. O ministro descaracterizou todos os requisitos que a lei exige, dizendo que não estão presentes no caso concreto”, disse o advogado Alexandre Wunderlich. (Com informações do jornal O Globo)