Quarta-feira, 25 de junho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 3 de setembro de 2023
Aécio ressurge e fala em endurecer oposição: ‘Não pode ficar no nem-nem’
Deputado diz que PSDB, apesar de “destroçado”, deve ser opção a “extremos”.
O Estado de S. Paulo.3 Sep 2023VERA ROSA MONICA GUGLIANO
PABLO VALADARES/CÂMARA DOS DEPUTADOS
“Eu defendo que o PSDB seja oposição sem adjetivos. Ah, ‘oposição responsável’, ‘oposição light’. Não. É oposição que questiona equívocos do governo”
“O Ministério do Lula é uma arca de Noé: tem espaço para todas as espécies. Eu não condeno negociação com partidos. Mas construir uma estrutura de governo a partir de demandas de sua base é um saco sem fundo”
Ex-governador de Minas e ex-senador, tucano é hoje deputado. Disputou o Planalto em 2014, mas foi derrotado por Dilma Rousseff (PT)
Alvejado pela Lava Jato e por denúncias de corrupção no caso JBS, o deputado Aécio Neves (PSDB-MG) ressurgiu na cena política com uma barba grisalha e forte discurso contra o governo Lula depois da sentença que o absolveu das acusações. Em seu gabinete da Câmara, onde desponta uma imagem de São Francisco de Assis na parede, Aécio disse que o PSDB, apesar de “destroçado”, precisa se apresentar desde já como alternativa de poder nas próximas eleições. “Tentaram nos matar, mas não conseguiram. Estamos vivos”, afirmou.
Para ele, é preciso endurecer o discurso oposicionista. “Não dá para ficar nesse nemnem, que ninguém sabe o que é”, afirmou Aécio ao Estadão, numa referência à retórica daqueles que não querem nem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nem Jair Bolsonaro (PL). Em meados deste mês, o partido vai criar um núcleo de acompanhamento dos programas lançados no terceiro mandato de Lula. Segundo o tucano, Lula governa hoje “muito mais com olhar no retrovisor do que no para-brisa da história”.
Como o sr. se sentiu sendo acusado de corrupto?
Foi muito dolorido na vida política e pessoal. Depois de vários episódios veio Bolsonaro, com o atraso que significou para o Brasil, e agora o retorno do PT. Dois mil e quatorze foi um momento de inflexão. O resultado daquela eleição mudou a história do Brasil, que de virtuosa passou a ser dramática. Eu não me curvei. Fui abatido por denúncias infames e hoje me sinto mais leve para ajudar o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que é nossa potencial alternativa presidencial em 2026, a dizer para o Brasil que existe possibilidade de termos um projeto diferente desses dois que estão colocados hoje.
O ex-chanceler Aloysio Nunes disse ao ‘Estadão’ que o PSDB não serve mais nem para oposição. Concorda?
O PSDB foi destroçado. O João Doria (ex-governador de São Paulo) foi um tsunami na vida do PSDB. Estamos vivendo as consequências daquilo. Ele até pode, na sua ingenuidade política, ter achado que seria candidato à Presidência, mas nunca seria. Ele estava, na verdade, impedindo que o PSDB tivesse candidatura. Por uma razão simples: a candidatura presidencial dele inviabilizaria a do vice-governador Rodrigo Garcia em São Paulo. Qual a consequência disso? O PSDB deixou de ser alternativa.
Mas o sr. também contribuiu para a derrocada do partido ao ser atingido por denúncias de corrupção. O sr. era presidente do PSDB.
Todas elas se mostraram falsas e foram desmascaradas.
O sr. disse que Lula deveria reparar o Brasil dos prejuízos causados pelo governo Dilma, em vez de pedir reparação pelo impeachment. Por quê?
Quando fala em reparação, ele passa para a sociedade a péssima sinalização de que malfeitos cometidos pelos seus são desculpáveis. O governo Dilma foi trágico. Ela cometeu, sim, as pedaladas fiscais. Ela não foi cassada pela oposição. Foi cassada, principalmente, por sua própria base de apoio.
Muitos dizem que, ao pedir uma auditoria dos votos, o sr. abriu caminho para Jair Bolsonaro em 2018.
Essa é a narrativa do PT. Eu liguei para a presidente da República cumprimentando-a pela vitória. Ali, na liturgia da democracia, é o momento que você aceita o resultado da eleição. Não houve contestação.
Como não?
Eu não pedi recontagem de votos. A auditoria era a favor da credibilidade das urnas eletrônicas porque, no momento em que se chegasse à conclusão de que elas são infalíveis, estaria sanado esse problema. Mas a conclusão foi a de que elas não são auditáveis.
O sr. desconfia das urnas?
Nada. Mas que existem questionamentos, existem. Agora, a discussão está contaminada. Se questionar, você é bolsonarista.
Aliás, o que se dizia é que o sr. era bolsonarista.
O fato de você não ser petista e não apoiar o PT o fazia imediatamente ser tachado de bolsonarista. O PSDB pagou um preço muito alto, por não ser uma coisa nem outra. O nosso papel na política brasileira não pode ser medido pelo número de parlamentares ou de prefeitos. É pelo segmento de pensamento que a gente representa. Existe uma larga avenida no centro que o PSDB tem que liderar.
Mas essa avenida não está congestionada?
Não. O PT é hoje partido de centro-esquerda, pragmático. Na direita, você tem um extrato mais radicalizado, e esse grupo vai ser sempre representado pelo bolsonarismo. Eu defendo que o PSDB seja oposição sem adjetivos. “Ah, ‘oposição responsável’, ‘oposição light’.” Não. É oposição que questiona os equívocos do governo. Nós temos que dizer: “Existe alternativa ao lulopetismo que não é o radicalismo da extrema direita”.
Mas há outros nomes de centro e de direita para 2026, além de Eduardo Leite. O governador de Minas, Romeu Zema, e o do Paraná, Ratinho Jr.
Eu acho que essas forças tenderão a se encontrar. E vai ser candidato quem tiver maior viabilidade. Temos de buscar liderar um caminho ao centro.
É que a terceira via nunca foi para frente no Brasil…
Nós temos de encontrar uma via alternativa.
Na gestão passada o PSDB votou a favor de várias medidas de Bolsonaro.
Mas não fomos bolsonaristas. Votamos várias medidas do governo Lula agora. Essa é a forma corajosa de se fazer oposição. Então teria de votar contra a reforma tributária? Estou propondo criar um núcleo de acompanhamento de metas e resultados do governo.
Como vai funcionar?
O governo do PT tem um vício: não faz avaliação de suas políticas públicas. Você não sabe como estão os alunos do ensino médio hoje, tem 5 milhões de jovens do Bolsa Família que o governo não sabe se estão na escola ou na rua. Acho que o PT se acostumou com a pobreza, nunca se interessou em superar a pobreza no Brasil.
O governo faz essa análise.
Não faz, não divulga. Acho que Lula governa hoje muito mais com olhar no retrovisor do que no para-brisa da história.
Seria um governo paralelo?
Shadow cabinet? Não. Isso não é ideia só minha. É uma construção de muita gente que quer ajudar na área de educação, economia… É um núcleo técnico que deve se hospedar na Fundação Teotônio Vilela. Vamos bimestralmente apresentar a avaliação das políticas públicas do governo: se avançaram ou não, se gastaram mais ou menos. O viés gastador do governo continua o mesmo. Estou vendo aí o ministro (Fernando) Haddad (da Fazenda) num esforço imenso, numa sanha arrecadadora.
O sr. apoiaria mais cortes?
O Ministério do Lula é uma arca de Noé: tem espaço para todas as espécies. O que seria o correto? Seria reorganizar o governo pensando quais são os ministérios importantes. Eu não condeno negociação com partidos. Mas construir uma estrutura de governo a partir de demandas de sua base é um saco sem fundo. Lula já começou entregando os dedos, agora vai acabar entregando os braços. E agora essa coisa insana de 38 ministérios, que não se justifica do ponto de vista de gestão em país nenhum.
Qual é o perfil que o sr. busca para o PSDB?
O PSDB tem de se apresentar como alternativa de poder, não temos de nos curvar à força de outros partidos. Qual é a lógica da maioria dos partidos hoje? É fazer o maior número de deputados para ter fundo eleitoral e fazer o maior número de deputados para apoiar o governo. Mesmo menorzinho, temos que registrar a importância do PSDB. Nós não queremos ir para o governo e não queremos ir para o outro extremo. Temos que ser um partido mais propositivo. Eu sou das vozes do partido que acham que temos de endurecer um pouco nosso discurso oposicionista. Não dá para ficar nesse nem-nem que ninguém sabe o que é. Temos de liderar essa fração da sociedade que votou no Lula contra o Bolsonaro, mas não é petista, e vice-versa.
O sr. vai disputar o governo de Minas, em 2026?
Não cogito. Quero ajudar o Eduardo Leite a construir um novo PSDB. •