Segunda-feira, 30 de junho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 29 de junho de 2025
Com um orçamento engessado por mais de 90% de gastos obrigatórios, a falta de recursos para investimentos e para a manutenção da máquina já afeta o dia a dia de instituições públicas no atendimento direto ao cidadão e à economia. É o caso de agências reguladoras, universidades federais, do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e das Forças Armadas, alguns dos órgãos que estão enfrentando dificuldades orçamentárias diante do aperto fiscal.
Neste ano, o Orçamento já tem congelamento de R$ 31,3 bilhões em gastos por causa de frustração de receitas e alta de despesas. É um número que representa 14,1% da verba não obrigatória dos órgãos e que pode crescer após a derrubada do decreto que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
O bloqueio impactou diretamente as agências reguladoras, que tiveram corte médio de 25% de sua verba para este ano. O quadro agrava reduções orçamentárias que já vinham sendo vistas nos últimos anos. Para especialistas, como Juliana Inhasz, do Insper, só um ajuste estrutural de longo prazo poderá liberar recursos para investimentos e serviços básicos para a população. Caso contrário, há risco de apagão da máquina pública.
Pirataria à solta
Na extensa lista de exemplos de serviços afetados, a agência de telecomunicações, a Anatel, informou que a “restrição orçamentária atingiu diversos projetos em andamento”, entre eles ações de bloqueio de bets ilegais, combate à pirataria em TV por assinatura e iniciativas contra a desinformação junto ao Tribunal Superior Eleitoral.
A agência de mineração, a ANM, corre o risco de paralisar completamente a fiscalização de barragens, rejeitos e lavra ilegal, de suspender contratos de tecnologia da informação e segurança patrimonial e de interromper serviços administrativos. O órgão disse que opera “no limite” para dar conta de suas atribuições legais e que a limitação de recursos afeta diretamente atividades essenciais à segurança da população e à integridade do setor mineral.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou que, com o bloqueio, precisará parar atividades essenciais, mesmo adotando novos cortes de custos. O agendamento dos exames teóricos exigidos para obtenção de licenças e habilitações de profissionais como pilotos e mecânicos foi suspenso.
Atividades como a supervisão e inspeção da conformidade de requisitos mínimos de segurança de operações e oficinas de manutenção podem ser reduzidas a até 60% do patamar planejado.
“O cenário é preocupante na medida em que pode aumentar o risco para as operações da aviação civil. Questões de segurança poderão passar despercebidas ou não serem corrigidas tempestivamente, elevando a possibilidade de incidentes ou acidentes aeronáuticos”, afirma o órgão.
“Autoridades de aviação civil de outros países têm manifestado formalmente a preocupação com capacidade de supervisão da segurança aérea no Brasil”, diz a agência. Segundo a Anac, isso pode resultar em restrições para companhias brasileiras em outros destinos, como os EUA, ou afetar parcerias comerciais.
Menos fiscalização
No segmento de energia, a Aneel demitiu mais de 140 funcionários terceirizados na semana passada. Em carta, a associação dos servidores alertou que os cortes podem levar a serviços mais caros e menos confiáveis, atraso na modernização e inovação setorial, a afastar investidores e prejudicar usuários e consumidores.
“A redução das fiscalizações aumentará os riscos de falhas no fornecimento de energia elétrica e o aumento dos períodos de reestabelecimento de serviços de energia elétrica falhados”, assinala o documento.
Queda na qualidade
Professor da FGV Direito SP, Fernando Eberlin diz que o principal risco é o coletivo, de queda na qualidade dos serviços das empresas com o enfraquecimento da fiscalização. “As agências precisam de autonomia e estrutura financeira e organizacional. Se isso não é garantido ou é precarizado, a atuação é prejudicada”, diz.
No setor de petróleo, a ANP vai suspender o monitoramento de combustíveis. Outra ação é redução da pesquisa de preço de produtos.
Já a agência de água e saneamento, a ANA, diminuiu a frequência de manutenção das estações de monitoramento, essenciais para prever eventos extremos como secas e enchentes. Programas como o Qualiágua, que monitora a qualidade da água dos rios brasileiros, e o Progestão, que apoia a gestão estadual dos recursos hídricos, tiveram repasses suspensos.