Segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Feministas religiosas exigem igualdade de direitos para rezar no Muro das Lamentações

Todo mês, quando o sol de Jerusalém começa a se levantar no horizonte atrás do Monte das Oliveiras, um grupo de mulheres se reúne na entrada do Muro das Lamentações com um objetivo: contrabandear um livro religioso para dentro de um dos lugares mais sagrados do judaísmo.

O livro é o Rolo da Torá, também chamado de Sefer Torá. Em algumas vertentes do judaísmo ortodoxo, o acesso das mulheres ao objeto é restrito: elas não podem recitá-lo, apenas escutar sua leitura pelos homens.

Não é no que acreditam as Mulheres do Muro. Desde 1988, as ativistas feministas fazem questão não só de ler os rolos, mas também de adotar hábitos tradicionalmente masculinos na religião, como usar kipá na cabeça e, nos ombros, o talit, o xale para cerimônias religiosas.

Na luta por direitos iguais, as ativistas já compraram briga com judeus ultraortodoxos, a Suprema Corte, o Parlamento e o governo de Israel. Por causa delas, ir ao muro com uma Sefer Torá privada foi proibido. Como o lugar é separado entre mulheres e homens e só no lado masculino há rolos públicos, a proibição garante que só eles possam rezar.

“Já fui presa cinco vezes: quatro por usar o talit e uma por tentar entrar com o rolo da Torá”, conta Lesley Sachs, que pega a estrada de Tel Aviv todo mês para se juntar à reza.

A Sefer Torá não é um livro comum. Há uma versão da Torá impressa, à qual mulheres têm acesso. Já os rolos são produzidos por um escriba com pena e tinta preta num pergaminho de pele de animal costurado à mão. Podem demorar um ano para ficarem prontos.

As mulheres não são proibidas de rezar no muro (ou Kotel, seu nome em hebraico). Têm, inclusive, uma área reservada. O que incomoda alguns ramos ortodoxos é a adoção de papéis que consideram masculinos. É também objeto de revolta que a reza igualitária “obrigue” os homens a ouvirem vozes femininas.

“Homens ultraortodoxos não querem ouvir a voz das mulheres. É considerado obsceno”, diz Lesley.

Em resposta ao grupo, o governo passou uma lei dizendo que a reza teria de respeitar os costumes do muro. Domingo passado, a confusão começou cedo. Jovens ortodoxos reclamavam das ativistas que usavam o raio-X masculino.

“A placa separa a entrada de homens da de mulheres, mas eu acho que tanto faz, entro por onde achar melhor”, diz a diretora-executiva Yochi Rappeport.

No dia da reza feminista, a revista é mais intensa do que o normal. Os guardas sabem que elas tentarão entrar com uma Sefer Torá e são orientados a revistar fundos de mochilas e bolsas. Não é toda a sociedade israelense que se opõe às feministas. Em abril, o rabino reformista Gilad Kariv, recém-eleito para o Parlamento, fez um gesto de solidariedade usando sua imunidade para levar uma Sefer Torá ao muro. Kariv prometeu repetir a visita em novembro, mas suspendeu os planos depois que o presidente Isaac Herzog se comprometeu a mediar o diálogo para “baixar a temperatura”.

Um juiz também reconheceu os direitos das mulheres de rezarem como os homens, abrindo precedente para a discussão sobre a construção de um espaço igualitário para a reza. Apesar de ter se comprometido com isso no “Acordo do Kotel” de 2016, a pressão dos ultraortodoxos fez o então premier Benjamin Netanyahu voltar atrás. Hoje, o espaço existe, mas está degradado.

“Não há pressão contra da sociedade, é só um grupo que está contra nós. É o grupo da ortodoxia, que não quer compartilhar a religião judaica com outros grupos. A maioria da população israelense está conosco”, diz a rabina Sandra Kochmann.

A última eleição mudou as perspectivas. Saiu do comando Netanyahu e, junto com ele, foram alijados do poder os partidos ultraortodoxos. Em campanha para voltar à liderança, o ex-premier aproveita agora para capitalizar no antifeminismo e agradar à base ultraortodoxa. Quando um parlamentar tuitou chamando contra a cerimônia, Netanyahu endossou retuitando o conteúdo que pedia a fiéis que rezassem no local para impedir que o “Kotel fosse profanado.”

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