Quinta-feira, 02 de outubro de 2025

Hiperindependência no amor: autonomia precisa ter limite para manter relacionamentos?

Criada por mãe solo, a paulistana Beatriz Di Giovanni aprendeu desde cedo a não depender de ninguém para resolver seus problemas, comportamento que ganhou força após um relacionamento abusivo que durou seis anos. “Coloquei na minha cabeça que não deixaria outra pessoa entrar na minha vida e fazer o que bem entendesse”, relembra a engenheira de produção, de 27 anos. No ano passado, Beatriz engatou novo namoro, mas percebeu que levava ao extremo a promessa de não abrir mão da própria autonomia.

A dificuldade em dividir responsabilidades e aceitar ajuda escancara um padrão cada vez mais comum entre mulheres: a hiperindependência nos relacionamentos, que faz com que o medo de perder o controle erga barreiras para a construção de vínculos afetivos.

“Tinha pavor de pedir ajuda, queria resolver tudo sozinha, para depois comunicar. E isso foi o principal motivo do meu último término”, diz a engenheira, reconhecendo a necessidade de encontrar um equilíbrio. “Não quero viver sozinha, desejo ter uma família um dia.”

Para a psicanalista Ana Suy, autora do best-seller “A gente mira no amor e acerta na solidão” (Paidós), a hiperindependência é um sintoma do nosso tempo. Segundo ela, vivemos em uma cultura que valoriza o individualismo, com o “mito” de que podemos dar conta de tudo sozinhos — impulsionados por tecnologia e a promessa de autossuficiência. “Mas esse ideal é ilusório. Amar é, inevitavelmente, se colocar em uma posição de vulnerabilidade”, diz.

Entre mulheres, Ana afirma que a questão ganha ainda outras nuances. Afinal, há uma memória histórica de dependência forçada e da liberdade constantemente tutelada por figuras masculinas. “É compreensível que muitas se agarrem à independência, uma grande conquista diante de todo o passado que nos privou de direitos”, explica a psicanalista. “A questão é só saber a medida. É necessário que nos coloquemos como pessoas autônomas, ao mesmo tempo em que precisamos reconhecer que, enquanto seres sociais, é vital criar e cultivar laços com os outros.”

A gerente de marketing Giulia Porro, de 29 anos, sabe bem o que isso significa. Muitos de seus relacionamentos foram atravessados pelo individualismo e pela dificuldade em demonstrar afeto. Atitudes que, para ela, eram sinônimo de força e autonomia. “Aos 23, ouvi de um namorado que era difícil se relacionar comigo, porque eu não precisava dele para nada. Aquilo me bateu muito estranho. Por que eu deveria precisar?”, lembra-se ela.

Com o tempo — e muitas sessões de terapia —, Giulia percebeu que não se tratava de precisar de alguém, mas de permitir-se incluir o outro na relação. “Essa ‘aversão’ ao amor romântico tinha a ver com a narrativa da mulher forte. Hoje, entendo que posso me dar ao direito de ter afeto, e que isso não anula a minha autonomia”, diz ela, que está namorando há um ano e meio. “Foi um processo até eu me soltar. Mas, agora, levo meu relacionamento com mais fluidez e tranquilidade.”

A psicóloga Adleana Gomes observa que a hiperindependência, muitas vezes, anda de mãos dadas com padrões ansiosos, especialmente por haver uma necessidade de controle. A especialista atesta que essa autossuficiência dentro da relação pode levar não só à ruptura, mas à sobrecarga emocional. “A separação acaba sendo mais fácil do que a tentativa de reparar”, afirma. Para ela, o caminho terapêutico envolve flexibilizar crenças e permitir a construção de vínculos seguros, nos quais independência e vulnerabilidade possam coexistir. “Trabalhamos para que as parceiras consigam delegar atividades e melhorar a comunicação, para, com isso, aumentar a fluidez da dinâmica do casal, até na parte sexual, que também acaba sendo afetada.” É que um carinho, diriam Peninha e Caetano Veloso, às vezes, cai bem. As informações são do jornal O Globo.

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