Sábado, 27 de abril de 2024

Juros, surpresa com os Estados Unidos e intervenções: o que explica a saída de dinheiro estrangeiro da Bolsa brasileira

Os investidores estrangeiros tiraram mais de R$ 20 bilhões da Bolsa brasileira neste primeiro trimestre, mostram os dados da B3. Trata-se de uma virada de humor dos estrangeiros com o País, logo depois de uma série de fechamentos em pontuação recorde no ano passado.

Analistas atribuem a situação majoritariamente a fatores externos, mas com um bom “tempero” de problemas nacionais.

São três questões principais:

* Sempre depois de um momento de alta, vêm os períodos de realizações de lucro de investidores e ajuste de posições;

* Houve uma reavaliação da situação econômica e do patamar de juros nos Estados Unidos, que deslocou recursos para lá;

* O quadro fiscal brasileiro e as intervenções do governo federal em empresas de peso no índice de ações trouxeram prejuízo extra ao País.

Para entender, é preciso voltar um pouco no tempo. No fim do ano, a economia global sinalizava para um momento de arrefecimento da inflação e possibilidade de corte de juros mais cedo em economias desenvolvidas.

Nos EUA, havia expectativa de que o Federal Reserve (Fed) começasse a reduzir os juros americanos em março. A mensagem para investidores era a de que as Treasuries americanas, títulos de renda fixa mais seguros do mundo, logo passariam a pagar menos.

Na Europa, a inflação dava sinais de alívio, e o Banco Central Europeu (BCE) passou também a considerar o início dos cortes de juros.

No mercado financeiro, tudo se antecipa. E ambos os fatos beneficiam as bolsas porque, com juros menores, é preciso tomar mais risco para que os investidores garantam uma boa rentabilidade.

Assim, países emergentes voltam a ser considerados, pois suas empresas mais rentáveis podem garantir um bom dinheiro. E o alívio do cenário externo somou-se a bons indicadores brasileiros.

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro veio acima do esperado, a inflação de serviços mostrava desaceleração e o país já estava em meio a um ciclo de corte da taxa básica de juros desde agosto.

O Ibovespa, principal índice acionário da Bolsa de Valores brasileira, passou por uma arrancada no fim de 2023. De volta aos dados de investimentos estrangeiros, entraram quase R$ 40 bilhões nos últimos dois meses do ano.

Só no mês de dezembro, o Ibovespa acumulou ganhos de mais de 5% e bateu sucessivos recordes de pontuação. Terminou o ano com ganho de mais de 22%.

Na virada para 2024, quase todos esses fatores mudaram.

Virada

O caldo começou a entornar por obra do Fed, o banco central americano. Ao publicar a decisão de dezembro, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) informou que indicadores recentes sugeriam que a atividade econômica do país “desacelerou em relação ao ritmo forte registrado no terceiro trimestre”.

Em outro trecho, o colegiado reafirmou que a inflação americana seguia elevada, mas reconheceu que os preços haviam diminuído no último ano, além de ganhos “moderados” no emprego. O mercado financeiro entendeu que a hora de baixar juros estava próxima.

Em janeiro, o tom foi bem mais cauteloso. O Fed disse que não considerava apropriado reduzir o intervalo de juros até que se tenha “maior confiança de que a inflação está evoluindo de forma sustentável para 2%”, a meta do país.

Além da inflação resistente acima dos 3% na janela de 12 meses, o PIB americano trouxe surpresas neste primeiro trimestre. Em dados dessa quinta-feira (28), o indicador registrou alta anualizada de 3,4% no quarto trimestre de 2023, acima do que se esperava no início do ano passado.

O mercado de trabalho dos EUA segue forte. O desemprego chegou a subir para 3,9% em fevereiro, mas ainda está baixíssimo e com demonstrativo de alta de salários, o que gera mais pressão na inflação.

Segundo Luís Stuhlberger, presidente da Verde Asset, parte do motivo para a economia dos Estados Unidos estar forte mesmo com o patamar elevado de juros é o forte aumento de gastos visto durante a pandemia.

“A política monetária e fiscal dos Estados Unidos na Covid, a distribuição de dinheiro, não tem paralelo na história”, afirmou o executivo durante evento promovido recentemente pela Hedge Investiments.

“Sabia-se que já existia uma boa vcina em outubro e [os EUA] continuaram distribuindo dinheiro e com uma política extremamente agressiva por mais um ano, para só depois acordarem que tinham ido longe demais”, completou.

Ou seja: com atividade econômica forte e salários em alta, há dúvidas na cabeça do Fed se é possível baixar os juros sem botar em risco a inflação. Com isso, o mercado financeiro, que estimava uma queda dos juros no país em março, passou a apostar em maio e, hoje, já tem dúvidas sobre junho.

Para Daniel Cunha, estrategista-chefe da BGC Liquidez, a atualização desse conjunto de informações torna natural que os EUA tenham destaque. Com juros altos em aplicações seguras ao mesmo tempo em que a economia mostra sinais fortes, há uma preferência de alocação de recursos por lá.

“Houve ganho até em termos do fluxo de investimento em bolsa, por hospedarem ali as principais empresas de tecnologia, que se beneficiam da Inteligência Artificial e que parecem ser o grande tema de investimentos do momento”, afirma.

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