Quinta-feira, 16 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 23 de abril de 2022
A jornada de Marine Le Pen está levando a direita radical da França a uma ponto próximo da Presidência do país.
Mesmo depois de assumir a liderança do partido Rassemblement National (Reagrupamento Nacional) de seu pai em 2011, ela passou anos tentando chegar ao ponto de equilíbrio considerado necessário para transformar uma força extremista em um grupo que acredita estar à beira do poder.
As propostas políticas de Le Pen sobre imigração e a ideia de priorizar casas e empregos para cidadãos franceses ainda são considerados projetos da direita radical, mas a mulher que lidera o renovado partido transmite uma imagem moderada e acessível de populismo.
“Sim, sou uma criadora de gatos profissional e uma agricultora”, disse ela à emissora France Inter em janeiro.
Le Pen tem seis gatos e eles aparecem em seus vídeos do TikTok e até em uma conta privada especial que ela mantém no Instagram.
Quando a cientista política Chloé Morin perguntou a um painel de eleitores na cidade de Lille no ano passado qual era a imagem que Le Pen transmitia, foram os gatos que se destacaram. Afinal, quem não confiaria em uma mulher fã de felinos?
Ela pode parecer mais moderada, mas as políticas que adota não são menos radicais em temas como imigração, nacionalidade e islamismo. Emmanuel Macron, atual presidente e adversário nas eleições de segundo turno, diz que o programa de governo dela é racista.
James Shields, professor de estudos franceses da Universidade de Warwick, no Reino Unido, entende que as referências racistas e antissemitas ficaram para trás, mas as velhas medidas de lei e ordem anti-imigrantes e autoritárias do antigo partido do pai de Le Pen permanecem praticamente inalteradas.
Às vésperas da eleição, marcadas para este domingo (24), Le Pen segue apenas alguns pontos atrás nas pesquisas, depois de um debate televisionado contra Macron.
O cenário atual é bem diferente do que ocorreu há cinco anos, quando ela estava despreparada, e parecia perturbada durante o debate antes da eleição, em que Macron conquistou dois terços dos votos.
Desacordo com o pai
Mesmo antes de assumir como líder do Reagrupamento Nacional, ficou claro que ela tinha dúvidas sobre algumas das ideias mais desagradáveis sobre a história nazista ditas pelo pai.
Quando, em 2005, Jean-Marie Le Pen declarou a uma revista que a ocupação alemã da França “não era tão desumana, mesmo que houvesse algumas manchas”, ela considerou deixar a vice-liderança do partido. O assessor dela, Bruno Bilde, acreditava que no fundo ela cogitava até abandonar a política.
O destino do pai foi selado de vez quando ele garantiu apenas 10% dos votos em 2007. Em quatro anos, Marine Le Pen estava no comando do partido.
Enquanto fazia campanha para ser eleita líder, o futuro rosto do Reagrupamento Nacional já estava provocando indignação. Ela disse aos apoiadores em Lyon, na França, que a visão de muçulmanos rezando na rua era semelhante à ocupação nazista. Primeiro vieram “mais e mais véus”, depois “mais e mais burcas”. Agora não havia tanques ou soldados “mas ainda é uma ocupação e pesa sobre as pessoas”, declarou à época.
“Direita radical com rosto humano” foi como o filósofo francês Bernard-Henri Lévy a descreveu. À época, ela acabou sendo inocentada de incitar o ódio.
Le Pen então procurou se livrar de alguns nomes da geração mais velha de apoiadores do pai, muitos dos quais compartilhavam uma visão simpática do regime francês que colaborou com os nazistas na Segunda Guerra Mundial.
Mas o financiamento de um partido de direita radical ainda era tóxico na França e ela foi à Rússia em busca de 11 milhões de euros em empréstimos no mesmo ano em que Vladimir Putin encenou uma apropriação de terras na Ucrânia. Ela até apoiou a anexação da Crimeia pelos russos.
A partir de então, Le Pen concentrou-se em criticar o que ela considera ameaças contra a vida francesa: “islamificação”, globalização, União Europeia e euro. Com essas bandeiras, ela ficou em terceiro lugar nas eleições presidenciais de 2012.
Em 2017, o Reagrupamento Nacional era dirigido por jovens profissionais habilidosos que administravam canais do YouTube e atraíam apoio em toda a França. O partido acumulou vitórias em eleições locais, regionais e na Europa, inclusive conquistando apoiadores judeus e muçulmanos.
Embora tenha sido derrotada por Emmanuel Macron no segundo turno presidencial, ela atraiu 7,7 milhões de votos.