Terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Minha jornada à Aspirante a Oficial do Exército Brasileiro

Nasci em 14/05/2006 e cresci na comunidade da Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre. Estudei sempre em escolas públicas: ensino fundamental EMEF São Pedro, ensino médio EEEM Padre Rambo e EEEM Agrônomo Pedro Pereira.

Foi nesse ambiente, entre amigos de infância e desafios que muitos não enxergam, que comecei a ser moldado. Nunca imaginei que um dia estaria contando esta história — ainda menos como primeiro colocado geral do CPOR de Porto Alegre. Minha trajetória nunca foi sobre perfeição, e sim sobre insistir quando parecia mais fácil desistir.

Para ser sincero, não estudei para entrar no CPOR. Entrei praticamente no susto. Não tinha estratégia ou preparação. Porém, depois de iniciar o curso, percebi que, se eu quisesse realmente crescer, teria que encontrar meus próprios métodos.

Um deles foi estudar enquanto ficava de laranjeira(militar que pernoita no quartel durante a semana). A maioria dos outros alunos enxergava como desperdício de tempo; eu enxergava uma oportunidade de concentração e aprendizado. Pode não parecer, mas esses minutos fizeram diferença.

Meu Curso Básico foi no Pelotão Carcará, com instrutores de Intendência (serviço responsável pela parte logística do combate no EB) . Foi ali que, em uma noite de laranjeira comum, estudando para a primeira prova do período básico, percebi que apenas esforço e empenho eu poderia mudar a minha vida e a da minha família. Terminei o Básico como primeiro colocado, algo que me surpreendeu.

Depois, na Infantaria (principal arma base que atua na linha de frente dos campos de batalha), a história se repetiu: fechei o ano como primeiro colocado geral do CPOR. Mas essas conquistas escondem o que aconteceu durante a jornada.

No meio do ano, sofri um acidente jogando futebol que resultou em oito pontos duplos no joelho. Na hora, pensei que tudo estava perdido. Quem já passou por lesão sabe: a dor é uma coisa; a dúvida pesa mais. Com paciência e teimosia, consegui voltar.

Fiz todos os campos (campos são exercícios no terreno que visam revisar instruções e cultivar valores essenciais na formação do militar): o Campo Básico, FIT (Operação Fibra, Iniciativa e Tenacidade) e o Infante de Ferro. Esse último dispensa comentários. É o tipo de experiência que te quebra um pouco para te construir muito.

Também tive a oportunidade de apoiar o Campo do Recruta como monitor, junto ao Curso de Infantaria. Ali aprendi lições importantes sobre liderança: como compreender pessoas, saber puxar quando necessário e, principalmente, estar junto. Liderar não é mandar; é caminhar ao lado e ajudar o outro a encontrar forças que nem ele sabia que tinha.

Ao longo do ano, participei de diversos PCI (Pedido de Cooperação e Instrução) para o CI Bld, 7º BIB, 3º BPE, 18º BI Mtz e 19º BI Mtz. Os PCI servem para ampliar nossos conhecimentos e conhecer rotinas de outras organizações militares. Cada um acrescentou algo na minha formação, especialmente no que diz respeito a trabalhar com pessoas. Já que nada no Exército é feito sozinho.

Nessa caminhada, alguns irmãos de farda marcaram minha trajetória. O Bairros — hoje Aspirante — foi um companheiro constante de estudo, principalmente quando tínhamos provas em comum. Ele seguiu para a Intendência, eu para a Infantaria, mas a parceria continuou.

O meu parceiro (canga) do Básico, o Moreno, que por motivos pessoais não pôde concluir o curso, também deixou sua marca. Dividimos peso, dificuldades e dias longos que moldam qualquer um. E o Heytor, hoje Aspirante também, que me acompanhou desde o início do Curso de Infantaria — uma amizade inesperada, mas que se tornou uma das mais fortes da minha formação.

E é impossível falar da Infantaria sem falar da união que ela exige. As dificuldades do dia a dia, o calor, o frio, as marchas, os campos, as instruções puxadas e as responsabilidades que só aumentam moldam mais do que o corpo: moldam o caráter.

Na Infantaria, a gente aprende que ninguém chega sozinho. A gente só chega porque alguém puxa junto, alguém carrega um pouco do nosso peso, alguém estende a mão quando o terreno fica mais inclinado. A camaradagem nasce na lama, na exaustão, na superação coletiva. Foi ali que muitos dos maiores laços da minha vida foram criados.

Um momento marcante foi a viagem aos Estados Unidos, como premiação pela minha colocação geral. Fui junto com o segundo e terceiro colocados, acompanhado pelos CPOR/SP, do CPOR/BH e pelo Major Costa Lemos. A viagem, patrocinada por oficiais da reserva também ex-alunos, foi a primeira vez que pisei fora do país. Conhecer lugares, culturas e conversar com militares de outra realidade abriu a minha visão de mundo e mostrou o quanto ainda há para aprender.

Hoje, meu objetivo é seguir como oficial temporário e aplicar tudo que aprendi. Levo comigo técnica, preparo e disciplina, mas principalmente caráter, humildade e o desejo de inspirar jovens da comunidade onde cresci. Cresci ouvindo que muitas coisas não eram para a gente. Hoje sei que são. Basta coragem, persistência — e que você acredite.

Minha história não é sobre ser o melhor. É sobre não aceitar ser menos do que posso ser. É sobre cair, levantar, aprender e continuar andando — às vezes mancando, às vezes com o joelho cheio de pontos — mas sempre em frente. E, se um dia eu puder servir de exemplo, que seja para mostrar que qualquer menino da Lomba do Pinheiro pode chegar onde quiser, desde que decida dar o primeiro passo.

* Allan Daniel de Paula Knop
1º Colocado geral CPOR/PA 2025
Asp Of R/2 Inf 2025

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