Segunda-feira, 27 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 27 de outubro de 2025
Faltam poucos dias para a COP30 em Belém, e confesso: estou ansioso. Como voluntário dedicado à transição energética e atuante na Fundação Gaia, organizei uma extensa agenda de eventos, reuniões e contatos com lideranças indígenas, institutos, membros do governo e colegas da sociedade civil. Sinto que este momento representa uma convergência rara entre ciência, diplomacia e povos tradicionais – e por isso a expectativa é grande.
A transição energética que defendo não é apenas substituir combustíveis fósseis por painéis solares e turbinas eólicas. Trata-se de uma transformação sistêmica: descarbonizar a matriz elétrica, expandir geração distribuída descentralizando e democratizando, fortalecer redes elétricas inteligentes, investir em armazenamento (baterias para armazenamento), melhorar eficiência energética nos setores industriais e urbanos e garantir financiamento que chegue a projetos locais e comunidades não conectadas. É igualmente essencial priorizar a justiça energética – proteger comunidades vulneráveis, gerar empregos qualificados e garantir consulta prévia a povos indígenas sobre projetos em seus territórios. Sem esses elementos técnicos e sociais, a transição corre o risco de ser desigual e ineficaz.
Carrego comigo a lembrança e os ensinamentos de José Lutzenberger (1926-2002) — um dos grandes ambientalistas brasileiros – e o trabalho contínuo da Fundação Gaia, hoje presidida por sua filha, Lara Lutzenberger. O Velho Lutz foi decisivo na mobilização que levou à Rio-92, mostrando que comprometimento político e qualidade técnica caminham lado a lado. A Fundação Gaia tem mantido essa tradição: promover conhecimento científico aliado a ações concretas de conservação e sensibilização pública. Para mim, destacar essa trajetória em Belém é lembrar que a luta ambiental exige ética, técnica, coragem e pragmatismo.
A COP30 tem um papel claro: reunir líderes, técnicos, cientistas, sociedade civil e setor privado para definir rumos concretos da ação climática global. Ali serão discutidos financiamento climático, metas renovadas das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), mecanismos para lidar com perda e dano, e políticas para conservação de florestas e energia limpa. Se negociadas com ambição real e implementadas com instrumentos financeiros e tecnológicos adequados, essas decisões podem acelerar a descarbonização e fortalecer resiliência local.
Minha ansiedade também vem das vozes que encontrei nas últimas semanas: comunidades indígenas da Amazônia que reivindicam respeito aos seus direitos territoriais; pesquisadores que pedem metas mais ambiciosas; jovens inovadores que querem apoio para escalar soluções limpas. Eles exigem ação executável – não apenas discursos bonitos. E é aqui que surge a pergunta difícil: estaremos à altura do legado de Lutzenberger?
Há sinais positivos – atenção de chefes de Estado e de grandes investidores – mas também um risco palpável. Sem compromisso político real, financiamento adequado e mecanismos de governança que acompanhem a execução, a COP30 pode se reduzir a mais um registro de intenções. A história ambiental brasileira e global exige que este não seja o caso.
Por isso, exijo, com a mesma urgência de sempre, uma conferência inclusiva – com participação plena da sociedade civil, das comunidades tradicionais, da juventude e dos setores técnicos. A Fundação Gaia e tantos outros atores mostram que unir conhecimento, ética e ação constrói transformação. A transição energética é possível – técnica e economicamente viável – mas precisa de vontade política e de recursos comprometidos.
Concluo com uma mensagem de otimismo realista: a COP30 pode – e deve – ser um êxito transformador, colocando o Brasil e o mundo em curso efetivo de descarbonização e justiça climática. Mas isso só acontecerá se líderes e nações cumprirem compromissos além do discurso. Se houver coragem e compromisso, estaremos à altura da herança de Lutzenberger e do futuro que devemos às próximas gerações. Caso contrário, corremos o risco de perder uma oportunidade histórica. A responsabilidade é de todos nós – e eu sigo trabalhando para que a esperança vença.
Renato Zimmermann – Desenvolvedor de Negócios Sustentáveis e Ativista pela Transição Energética.