Sexta-feira, 02 de maio de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 1 de maio de 2025
Num momento em que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) busca retomar a popularidade, a proibição do curso de Enfermagem à distância impacta um eleitorado que é caro ao petista: trabalhadores com renda de até três salários mínimos. Esse é o perfil de quem faz a graduação na modalidade on-line, que passou de 4% das matrículas em 2017 para 40% em 2023 — quase 200 mil pessoas. O modelo deve ser vetado pelo Ministério da Educação por nem sempre garantir o mínimo de atividades práticas, especialmente em atendimentos de média e alta complexidade, na avaliação de especialistas.
“O que vemos é uma fraude generalizada nos estágios e falta de aulas práticas”, critica Manoel Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).
O questionário socioeconômico do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade) de 2023 mostrou que a renda de até três salários mínimos é comum entre a maioria dos estudantes de Enfermagem em instituições privadas, seja em cursos presenciais ou on-line. Mas o grupo de alunos que estudam à distância se caracteriza pela idade acima de 35 anos e ter de trabalhar, tanto por necessidade própria como para ajudar ou sustentar também suas famílias. Com esta condição, é provável que não possam estudar, caso precisem estar nas salas de aula todos os dias.
O ministro da Educação, Camilo Santana, anunciou em março que a proibição dos cursos de Enfermagem à distância constará no novo marco regulatório do ensino à distância (EaD) no Brasil. O texto, que deveria ter sido divulgado no fim do ano passado, já foi mandado para a Casa Civil. No entanto, a divulgação foi adiada três vezes. O novo prazo para ser publicado é 9 de maio. O governo não explicou os motivos da demora.
Críticas do setor
Representantes do setor já defendem publicamente a ideia de que o MEC prejudica a inclusão dos mais pobres no ensino superior criando regras que restringem a oferta da educação à distância. “Presidente Lula, o senhor vai mesmo assinar uma medida contra a maioria da população que encontrou um caminho para subir na vida pela educação?”, afirmou João Vianney, um influente defensor da modalidade nas redes sociais.
As instituições de ensino defendem a expansão da modalidade alegando que ela proporciona inclusão de pessoas que moram em áreas sem cursos de graduação ou que não têm tempo para frequentar aulas presenciais. Além disso, a mensalidade costuma ser bem mais barata. As entidades alegam, inclusive, que as novas exigências do MEC aumentarão os preços cobrados nos cursos.
Mas alguns grupos educacionais chegam a ter uma média de 500 alunos por professor e promovem diversos artifícios para facilitar a aprovação e evitar a evasão. Com isso, diminui a qualidade do aprendizado.
Formação
Por conta do boom de matrículas, a proibição específica do curso de Enfermagem tem sido um ponto de disputa especial nesse processo. Atualmente, a única obrigatoriedade é de que 20% da formação seja presencial, nos estágios — cabe às instituições de ensino definir a carga horária dos laboratórios. Algumas, no entanto, nem possuem esses equipamentos.
Diretor da Escola Superior de Saúde Única do Centro Universitário Internacional (Uninter), Cristiano Caveião defende que é possível formar um enfermeiro à distância, caso o aluno passe por formação prática. Mas ressalva que o MEC precisa regulamentar uma carga horária mínima de aulas no laboratório:
“Os alunos têm condições plenas de estudar em casa a parte teórica, assistindo videoaulas gravadas, lendo materiais e interagindo em aulas on-line. Mas qualquer curso precisa de uma parte em que o estudante vá até a unidade para aulas práticas. No nosso curso, quase metade é presencial”, defende .
Mas o presidente do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), Manoel Neri, diz que, em um grande número de instituições, nem mesmo os estágios são feitos. Neri lembra que a capilaridade da educação à distância conseguiu chegar a cidades sem nenhuma estrutura médica para atividades de média e alta complexidade. Além disso, os polos, locais de apoio presencial para estudantes EaD, costumam ser estruturas simples e sem laboratórios.
“O enfermeiro tem uma formação generalista na graduação. Ele precisa passar pela experiência de baixa, média e alta complexidade. Boa parte dos polos estão em cidades pequenas que não possuem essas estruturas. Assim, o aluno se forma sem ter visto uma UTI, um centro cirúrgico ou uma sessão de hemodiálise”, salienta Neri.
Entre as medidas discutidas pelo MEC, está a exigência de parâmetros mínimos para esse polos. Eles precisariam ter laboratórios físicos, dependendo do curso que oferecem. A estimativa é que a metade destes locais será fechada.