Quinta-feira, 07 de agosto de 2025

Mudança no foro privilegiado não beneficiaria Bolsonaro no caso da trama golpista, avaliam juristas

Juristas apontam que o movimento de aliados de Jair Bolsonaro para tentar derrubar o foro privilegiado e alterar a instância do processo da trama golpista é, na prática, muito mais político do que jurídico. Poderia, sim, impactar inquéritos de deputados e senadores que atualmente estão no Supremo Tribunal Federal (STF), mas não conseguiria mudar a tempo o caso do ex-presidente.

Nos últimos dias, o projeto para acabar com o foro de ex-presidentes e ex-parlamentares entrou no que o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) classificou como “pacote da paz”. O caso específico do foro, disse, seria uma forma de diminuir a “pressão” que a Corte exerceria sobre a classe política.

A oposição ao governo Lula (PT) afirmou que a cúpula do Congresso concordou em pautar a proposta, assim como a da anistia, em troca da desobstrução da pauta — acordo que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), negou que tenha acontecido.

Professores de Direito, no entanto, encaram com ressalvas o eventual impacto imediato para Bolsonaro, mesmo se o Congresso aprovar a jato, antes do julgamento da trama golpista, o fim do foro.

“Impossível (descer para a primeira instância), primeiro porque não dá mais tempo de se fazer uma alteração dessas em tão pouco tempo, até porque o processo está praticamente na fase de sentença, questão de dias”, afirma o advogado Jean Menezes de Aguiar, professor da pós-graduação da FGV.

“Também porque o juiz (Moraes) já finalizou a instrução, colhendo provas e depoimentos, surgindo aí o princípio da identidade física do juiz. Ou seja, deverá, em regra, ser este órgão, este juiz, o que dará a sentença. Aqui, o Código de Processo Penal quer a válida percepção do juiz sobre as provas colhidas”.

Também professor da FGV, Thiago Bottino complementa:

“Regras processuais penais aplicam-se imediatamente aos processos em curso. No entanto, a jurisprudência do STF por diversas vezes já entendeu que mudanças nessas regras não se aplicariam a processos já em curso ou em fase final de julgamento”, explica.

“Um exemplo foram as alterações trazidas pelo Pacote Anticrime que criou o juiz de garantias. O STF estabeleceu um prazo de 12 meses para a implementação do novo sistema, de modo que seriam válidos os atos praticados pela regra antiga dentro desse prazo”.

Em 2018, recorda Bottino, o STF determinou que o foro especial só seria válido no caso de crimes cometidos “durante e em função do mandato”. Já em 2025, estabeleceu que a medida segue válida “mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício” — caso de Bolsonaro com a trama golpista.

É interessante observar, diz Jean Menezes de Aguiar, a inversão que o debate atual representa: o foro sempre foi visto como “privilegiado”, um benefício. Como o processo já começa na segunda instância ou até mesmo no próprio Supremo, a depender do cargo ocupado pelo político, existia a ideia de que o instrumento protege o processo de influências políticas sobre juízes locais, por exemplo.

Ao tecer uma leitura mais político-jurídica do movimento de agora do bolsonarismo, Aguiar explica que o Legislativo tem a prerrogativa legítima de tentar mudar a lei, desde que a mudança não seja inconstitucional. O avanço da pauta reforçaria, no entanto, a percepção de que o Congresso está atuando em causa própria, leitura feita por 78% dos entrevistados na última pesquisa Quaest.

Na chegada à Câmara nesta quinta-feira (7), Motta deu a entender que não houve o acordo anunciado pela oposição.

“A presidência da Câmara é inegociável. A negociação feita pela retomada (dos trabalhos da Casa, boicotados pelos bolsonaristas) não está vinculada a nenhuma pauta. O presidente da Câmara não negocia prerrogativa com oposição, governo, ninguém”, disse.

O acordo foi feito à revelia de Motta. Líderes partidários se reuniram com o ex-presidente da Casa Arthur Lira (PP-AL), fiador da eleição do atual comandante da Câmara. Participaram da reunião os líderes do PP, Doutor Luizinho (RJ); do União Brasil, Elmar Nascimento (BA); do PSD, Antonio Brito (BA); e do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), além dos deputados Marco Feliciano (PL-SP) e Mendonça Filho (União Brasil-PE).

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