Terça-feira, 25 de novembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 25 de novembro de 2025
Retornando de Belém, onde a COP30 reuniu líderes mundiais em torno da pauta climática, trago comigo não apenas memórias de debates acalorados, mas também o peso de uma constatação amarga: a vitória da indústria do petróleo. Os poderosos lobbies conseguiram bloquear a criação de um “mapa do caminho” para a saída das energias fósseis. Em vez de avançarmos rumo a uma transição energética justa e urgente, vimos retrocessos que comprometem o futuro do planeta.
A bandeira da transição energética
Como colunista e ativista, assumi há anos o compromisso de defender um planeta mais limpo. A transição energética não é apenas uma pauta técnica: é uma bandeira de sobrevivência. Os dados são claros. Segundo o IPCC, as emissões globais de CO₂ precisam cair 43% até 2030 para que possamos limitar o aquecimento a 1,5°C. No entanto, em 2024, o mundo registrou 37,4 bilhões de toneladas de CO₂ emitidas, o maior nível da história.
Ainda assim, há quem tente desviar o debate. Alguns me chamam de ingênuo, outros dizem que os cientistas estão errados, que tudo não passa de “coisa de comunista”. Há até quem invoque teorias conspiratórias como a do HAARP — um programa de pesquisa atmosférica dos Estados Unidos, voltado originalmente para estudar a ionosfera, mas que conspiracionistas transformaram em suposta “arma climatológica” capaz de manipular o clima. Nada disso me tira do caminho. O respeito às opiniões é necessário, mas não podemos confundir respeito com complacência diante da desinformação.
Por que não queremos mudar?
Essa é a pergunta que ecoa após a COP30. Por que resistimos tanto a abandonar as energias sujas? A resposta está nos interesses econômicos. No Brasil, a indústria do gás natural ocupa lugar de destaque. Nos últimos anos, grandes grupos empresariais adquiriram usinas termelétricas em série, consolidando um poder que se estende sobre a política energética nacional.
Basta pesquisar quem é chamado de “rei do gás” para encontrar um dos protagonistas dessa concentração. O resultado é um setor elétrico cada vez mais dependente de contratos bilionários que favorecem poucos e perpetuam a lógica das energias fósseis.
Não por acaso, o ex-presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, denunciou que medidas provisórias vinham sendo manipuladas para favorecer negócios bilionários ligados ao setor energético. Sua saída da estatal foi marcada por atritos com o governo e acusações de “intrigas palacianas”.
Em entrevistas, Prates apontou pressões para moldar políticas públicas em benefício de grupos específicos, especialmente no mercado de gás e termelétricas. Embora parte das denúncias tenha sido arquivada pela Comissão de Ética Pública, o episódio expôs a fragilidade institucional diante de interesses privados e reforçou a percepção de captura regulatória.
O golpe final
O golpe final veio em 24 de novembro de 2025, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, sem vetos neste ponto, a Lei nº 15.269, oriunda da MP 1.304. O dispositivo pró-carvão perpetua a contratação obrigatória de energia de termelétricas a carvão mineral até 2040, além de prorrogar por 25 anos as concessões dessas usinas. Trata-se de uma decisão que garante vida longa a uma das fontes mais poluentes da matriz elétrica brasileira, em contradição direta com os compromissos climáticos assumidos pelo país.
O preço da inação
Enquanto isso, os eventos extremos se multiplicam. Em Erechim (RS), um temporal de granizo com pedras do tamanho de ovos feriu mais de 200 pessoas e destruiu milhares de casas.
No Oeste do Paraná, um tornado associado a um ciclone extratropical deixou mortos, feridos e destruição em larga escala, com ventos que ultrapassaram 250 km/h. No Rio Grande do Sul, enchentes recordes se repetiram em 2024 e 2025, deixando centenas de mortos, milhares de desabrigados e cidades inteiras submersas.
Ninguém pode garantir que não irão se intensificar nos próximos anos. Já no cenário global, os furacões estão cada vez mais imprevisíveis e violentos. Em outubro de 2025, o furacão Melissa, categoria 5, atingiu a Jamaica com ventos de até 280 km/h, considerado mais forte que o Katrina.
A Indonésia, embora não esteja na rota tradicional de furacões, sofre com ciclones tropicais e tempestades intensas no Pacífico, mostrando que os extremos climáticos não respeitam fronteiras. Enquanto ondas de calor recordes assolam a Europa e a Ásia. As estiagens trarão escassez de alimentos, falta de água potável, energia e os terríveis incêndios de floresta.
Cada desastre é um lembrete de que o custo da inação é pago em vidas, em perdas econômicas, colapsos energéticos, fome e em sofrimento humano.
Um fechamento necessário
Este é o rescaldo da COP30: a percepção de que estamos muito longe de resultados práticos. Mas também é o chamado para que a sociedade clame por mais ações e mais resultados concretos. Não podemos nos permitir o luxo do descanso. A luta pela transição energética é longa, árdua e cheia de obstáculos, mas é também a única que pode garantir um futuro habitável.
Descansar não é prioridade. O planeta não espera. E nós não podemos parar o que começamos, porque ainda estamos muito distantes do que realmente importa: resultados práticos que salvem vidas e preservem a Terra para as próximas gerações.
* Renato Zimmermann é desenvolvedor de negócios sustentáveis e ativista da transição energética