Terça-feira, 08 de julho de 2025

Neonazistas do Telegram driblam a Justiça Eleitoral e debatem estratégias contra bloqueio

A suspensão do Telegram no Brasil coincidiu com uma onda de conteúdos extremistas migrando de volta para a deep web. Na plataforma alvo de decisão da Justiça Federal do Espírito Santo na quarta-feira, grupos e canais neonazistas buscavam retomar espaço após as primeiras ofensivas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado. Uma forma de driblar a Justiça era recriar os chats com outros nomes.

A proibição do funcionamento do aplicativo — também multado em R$ 1 milhão por dia caso não colabore com a investigação — representa um baque nas estratégias de cooptação de novos integrantes, segundo avaliação do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

“A suspensão do Telegram dificultará o processo de recrutamento e obrigará que (extremistas) entrem ainda mais no subterrâneo”, afirma o coordenador-geral de Inteligência da Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Carlos Eduardo Sobral, que é delegado da Polícia Federal.

Nesta semana, grupos de extrema-direita buscavam seguir em atividade no Telegram através de soluções tecnológicas que, inclusive, fornecem o anonimato na internet. No Twitter, outra plataforma no radar do Ministério da Justiça e Segurança Pública, ao longo do dia, administradores desses fóruns ensinavam a outros usuários formas de continuar usando a rede de troca de mensagens.

“Diminuiu bem (a movimentação desses grupos no Telegram). Mas os mais ativos e criminosos continuam “, diz o pesquisador Leonardo Nascimento, da Universidade Federal da Bahia, que acompanha chats de extrema-direita.

Bloqueado

No fim do ano passado, um dos principais chats fascistas do Telegram, o Canais Antissemitas BR, foi bloqueado por determinação da Justiça Eleitoral. Mas em novembro, seus administradores refundaram o chat com outro nome, resgataram o backup com centenas de links para outros grupos e canais com conteúdo neonazista e passaram a discutir táticas de como escapar de novos bloqueios.

O chat reuniu um acervo de parceiros que divulgavam conteúdo abertamente violento, misógino, racista e homofóbico. Repaginado, passou a incluir uma “lista de canais e grupos inimigos” ligados à esquerda com “fins investigativos”. Diversos chats haviam sido bloqueados nos meses anteriores, mas até anteontem, operavam espalhados por outros grupos menores.

Muitos desses usuários recorriam ontem a soluções como uso de VPN e Orbot — uma plataforma proxy gratuita que fornece anonimato na Internet — para manter o uso do aplicativo. A expectativa de autoridades, no entanto, é que o Telegram mude de postura e passe a colaborar mais com a polícia após medida da Justiça.

Ódio perde visibilidade

A ação da força-tarefa do governo federal contra a divulgação de discursos de ódio na internet desde o ataque a uma escola de São Paulo e a uma creche em Blumenau (SC) teria forçado a volta dos extremistas que vinham operando em redes sociais abertas para a deep web. A conclusão é do setor de inteligência do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que colocou no ar o canal digital de denúncias Escola Segura. A ferramenta começou a funcionar no dia 7 de abril, dois dias após o massacre na creche Cantinho do Bom Pastor.

Enquanto entre os dias 10 e 12 deste mês, o total de denúncias diárias chegou a mais de mil — período em que uma onda de boatos com ameaças sobre ataques, impulsionada por grupos extremistas, espalhou pânico pelo país — nesta semana foram registrados os números mais baixos: na terça, foram apenas 25 denúncias enviadas ao link, e na quarta, 24. O delegado Carlos Eduardo Sobral afirma que os conteúdos extremistas passam agora por movimento inverso.

“Primeiro a gente identificou o fenômeno de que algumas comunidades que atuavam no subterrâneo da internet vieram para a superfície, para redes sociais abertas, como Twitter, Tiktok e Instagram. E esse movimento é muito nítido com a quantidade de denúncias, que chegaram a mais de 1.800 num dia, indicando a grande quantidade de conteúdo sendo publicizado nas redes abertas”, afirma Sobral.

“Na sequência, e junto ao trabalho de um sistema de cooperação, com exclusão de conteúdo, investigação, prisões e apreensões, percebemos que essa migração para a superfície se inverteu: as pessoas decididas a praticar esse tipo de conduta estão voltando para o subterrâneo da internet, o que levou a uma diminuição do volume de conteúdo na superfície. Por isso, recebemos cada vez menos denúncias.”

Mesmo com esses grupos ainda em atividade em meios obscuros da internet — o que torna investigações mais difíceis e demoradas —, Sobral avalia que essa mudança tem um lado positivo ao frear o recrutamento nas redes abertas: “Um dos objetivos de quem alimenta essa subcultura é o recrutamento e cooptação de pessoas em estado de vulnerabilidade. E na internet aberta o alcance desse discurso de ódio é muito maior, e o recrutamento mais eficiente. A gente tirar da internet aberta esse conteúdo diminui o alcance dessa prática. Nas comunidades fechadas, participa quem já esta envolvido”, diz.

“Dados impossíveis”

O Telegram foi suspenso no Brasil por não entregar à PF dados de grupos neonazistas que teriam mantido contato e incentivado o adolescente que, em novembro do ano passado, matou quatro pessoas e feriu outras 12 em dois ataques a escolas em Aracruz (ES). Entre as informações solicitadas pela polícia à plataforma, estavam nomes, CPFs, endereços, dados bancários e de cartões cadastrados, contatos de recuperação de contas, dispositivos vinculados e logs de criação.

Sobre a suspensão determinada na quarta, o cofundador do Telegram Pavel Durov afirmou ontem pelo seu canal no aplicativo que a Justiça brasileira ordenou a entrega de dados “impossíveis” e que a empresa vai recorrer da decisão.

“No Brasil, um tribunal solicitou dados que são tecnologicamente impossíveis de obter. Estamos recorrendo da decisão e aguardando a resolução final. Não importa o custo, defenderemos nossos usuários no Brasil e seu direito à comunicação privada”, disse Durov.

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