Sábado, 25 de outubro de 2025

Pampa Gaúcho – do bioma esquecido ao protagonismo climático

O Rio Grande do Sul assumiu protagonismo na preparação para a COP30 ao lançar a “Carta do Bioma Pampa”, documento que consolida compromissos e propostas para o bioma que ocupa cerca de 68% do território gaúcho e é exclusivo do Brasil, Uruguai e Argentina. Apresentada em 9 de outubro, durante o 12º Fórum Gaúcho de Mudanças Climáticas (FGMC), a minuta foi submetida à consulta pública até 23 de outubro, permitindo que a sociedade civil e as vozes regionais participassem da construção coletiva.

A Carta traz diretrizes claras: conservação, uso sustentável e valorização do Pampa, reconhecendo-o como território estratégico para a biodiversidade, a produção agropecuária e a mitigação das mudanças climáticas. Outro ponto relevante é o caráter subnacional da iniciativa: Estado e Fórum Gaúcho atuaram diretamente, reforçando a importância da articulação local para que o RS leve à COP30 uma voz autêntica e representativa.

Mas o processo não está livre de críticas. Entidades ambientais alertam para a “ilusão” da queda nos índices de desmatamento no Pampa. O argumento é pertinente: a vegetação campestre — majoritária no bioma — continua desaparecendo diante da expansão da soja e da silvicultura (principalmente eucaliptos), ainda que esse processo não seja registrado como desmatamento tradicional.

Os números confirmam a gravidade. Segundo o MapBiomas, o Pampa perdeu cerca de 3,3 milhões de hectares entre 1985 e 2023, o que representa aproximadamente 28% da vegetação nativa. Outro levantamento aponta que, em 2024, 45,6% do bioma já estava ocupado por atividades humanas, com um recuo de 3,9 milhões de hectares de campos nativos desde 1985. O problema, portanto, não é apenas “menos árvores”, mas a conversão de ecossistemas específicos e pouco reconhecidos como desmatamento — o que exige atenção diferenciada.

A Carta surge em momento decisivo: o RS, único estado com o bioma, tenta apresentar à COP30 um plano que vá além do discurso e se traduza em compromissos concretos. A consulta pública reforça a abertura do processo, convocando cidadãos, agricultores, comunidades tradicionais, academia e setor produtivo a colaborar.

E o que o RS pode levar à COP30?

* Visibilidade para um bioma frequentemente marginalizado no debate climático nacional.

* Ampliação da agenda climática e da bioeconomia para além da Amazônia, sem diminuir sua relevância global.

* Demonstração de força subnacional, mostrando que estados, municípios e comunidades têm voz e ferramentas para contribuir.

Os desafios, no entanto, são imensos: transformar a minuta em ações concretas, garantir financiamento, implementar governança territorial eficiente e frear o avanço da monocultura de soja e das florestas comerciais sobre os campos nativos. O alerta das entidades ambientais é claro: “menos desmatamento” não significa, necessariamente, “menos impacto”.

Ainda assim, há sinais positivos. A abertura à sociedade e a agenda de governança climática indicam que o Pampa pode deixar de ser visto como “o bioma mais degradado do país” e se tornar exemplo de transição estratégica em ecossistemas de pastagem. É simbólico pensar que a pecuária bovina nativa, em pastagens naturais, pode ser aliada nesse processo de regeneração. Se transformado em “laboratório de inovação para clima, solo e produção sustentável”, o Pampa poderá entrar no radar global, ampliando a contribuição gaúcha para um futuro mais verde.

Vale lembrar: o Acordo de Paris estabeleceu o compromisso de limitar o aquecimento global a 1,5 °C em relação aos níveis pré-industriais. Não se trata de reduzir a temperatura do planeta em 1,5 °C, mas de evitar que o aumento ultrapasse esse limite crítico. Nesse contexto, cada bioma conta — e o Pampa pode ser peça-chave para que o Brasil cumpra sua parte.

A Carta do Bioma Pampa é mais que um documento: é um convite à ação — aos gaúchos, à sociedade brasileira e à agenda da COP30. Porque preservar e valorizar o Pampa não é apenas um dever regional: é uma missão nacional.

Renato Zimmermann – Desenvolvedor de Negócios Sustentáveis e Ativista pela Transição Energética

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