Terça-feira, 14 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 14 de outubro de 2025
Com apenas 59 países tendo apresentado novas metas climáticas até a Assembleia da ONU, o mundo chega à Pré-COP em Brasília com mais dúvidas do que direção. É o último momento, antes da COP30 em Belém, para converter frustração em convergência, e para o Brasil articular seu plano de jogo com as demais delegações.
A Pré-COP, reunião ministerial que antecipa os debates da conferência do clima, reúne na segunda e terça-feira chefes de delegação no Centro Internacional de Convenções do Brasil, em Brasília.
Eles não vêm para discutir parágrafos de decisões, mas será a última prévia sobre o que é possível ser alcançado em Belém.
Num ano de impasses nas negociações em Bonn, pouca ambição no ciclo de apresentação das novas metas (NDC) e promessas não cumpridas sobre financiamento, o mundo observa se Brasília será capaz de recolocar o multilateralismo em marcha pela ação climática.
O encontro precisa enviar sinais nítidos de credibilidade e convergência: que os países estão dispostos a construir o pacote de Belém.
Financiamento e metas para adaptação, transição para longe dos combustíveis fósseis e transição justa são os principais avanços da COP30 esperados pela sociedade.
Sinais da economia real
Há, pelo menos, uma boa notícia. A economia real já está se movendo. Os investimentos em energias renováveis reduziram a dependência de combustíveis fósseis e pouparam 1,3 trilhão de dólares entre 2011 e 2023, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA).
A agência identificou 107 países que diminuíram sua dependência de importações fósseis para gerar eletricidade, graças à expansão de fontes renováveis como a energia solar e eólica. A transição energética não é mais uma agenda ambiental, é uma nova lógica de desenvolvimento: racional, competitiva e de menor custo no longo prazo.
Mas a IEA também deixa claro o que ainda falta. O mundo está cerca de 400 GW por ano abaixo da meta de triplicar a capacidade de energia renovável até 2030. No ritmo atual, alcançaremos apenas 2,6 vezes o nível de 2022. Apesar do crescimento de renováveis sistematicamente superar as previsões da agência, há grandes desafios a serem vencidos pela infraestrutura elétrica de fontes renováveis.
Redes elétricas saturadas, antigas e sem capacidade de armazenamento de energia travam a aceleração da penetração das renováveis. No Brasil cerca de 15 % da geração solar e eólica é desperdiçada anualmente. Em 2024, empresas de energia renovável sofreram prejuízo de mais de 1,6 bilhão de reais devido aos cortes na geração de energia de fontes renováveis ordenados pelo Operador Nacional do Sistema (ONS).
Mesmo assim, há espaço para otimismo fundamentado, não ingênuo. A IEA admite que o avanço das renováveis vem superando suas próprias previsões, impulsionado pela queda dos custos e pelo aumento dos investimentos privados. O mundo tem instalado muito mais energia limpa do que o previsto pela IEA. É um sinal de aceleração estrutural. Se esse ritmo se mantiver, a lacuna pode ser fechada antes do fim da década. Podemos ter um novo paradigma energético ainda em 2030.
O papel do Brasil
O Brasil está no centro desse tabuleiro. Seu histórico de diálogo multilateral o credencia como ponte entre o Norte e o Sul, e não é coincidência que foi no Rio de Janeiro, há 33 anos, que nasceram as convenções das Nações Unidas sobre clima, biodiversidade e desertificação.
Agora, o desafio não é só diplomático, é político e econômico. Transformar a agenda climática em uma agenda de desenvolvimento, que combine crescimento, inclusão e transição energética. Tudo ao mesmo tempo e navegando num cenário global fragmentado, marcado por guerras, tarifas e competição tecnológica.
Entre Brasília e Belém, o país tem poucas semanas para amarrar os sinais políticos para a Cúpula de Líderes e um Pacote Climático de Belém que alinhe ambição e viabilidade, conecte financiamento e adaptação, reconcilie política e ciência, e reenergize o multilateralismo.
Gustavo Tosello Pinheiro é Associado Sênior do think tank de diplomacia climática E3G e sócio-fundador do Grupo Triê