Quinta-feira, 02 de outubro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 25 de maio de 2022
A Rússia está disposta a permitir o estabelecimento de corredores humanitários para navios que transportam alimentos deixarem a Ucrânia, contanto que algumas sanções que sofre sejam suspensas, informou nesta quarta-feira (25) o vice-chanceler russo, Andrei Rudenko, citado pela agência Interfax.
Os portos ucranianos do Mar Negro estão bloqueados e cerca de 22 milhões de toneladas de grãos estão presos em armazéns no país desde a invasão russa em 24 de fevereiro, desatando a ameaça de uma crise alimentar global.
A guerra bloqueou as exportações de grãos da Ucrânia por via marítima, sua principal porta de saída, cortando um abastecimento crucial para países que vão da Somália ao Egito.
A interrupção, agravada pelo clima quente e pelas secas que estão prejudicando as colheitas de trigo em outras partes do mundo como a Índia, elevou os preços do grão a níveis quase recordes, e gera a ameaça de fome em partes do Oriente Médio e do Norte da África.
Potências ocidentais vêm discutindo a ideia de estabelecer “corredores seguros” para as exportações de grãos dos portos da Ucrânia, acrescentando que tais vias precisariam do consentimento russo.
O vice-chanceler da Rússia disse que o país está em contato com as Nações Unidas sobre o assunto e apresentou as exigências de Moscou:
“Temos afirmado repetidamente nesse ponto que uma solução para o problema alimentar requer uma abordagem abrangente, incluindo o levantamento das sanções impostas às exportações e transações financeiras russas”, disse Rudenko. “E também exige a desminagem pelo lado ucraniano de todos os portos onde os navios estão ancorados. A Rússia está pronta para fornecer a passagem humanitária necessária, o que faz todos os dias.”
O ministro das Relações Exteriores ucraniano, Dmytro Kuleba, chamou a proposta de Moscou de “chantagem”, acrescentando que os políticos que pensarem em aceitá-la devem primeiro visitar os túmulos das crianças ucranianas mortas.
A Rússia e a Ucrânia são os principais fornecedores de trigo e óleo de girassol para o mundo. Os dois países estão entre os poucos do mundo que exportam grandes volumes dos alimentos que cultivam para muitos países diferentes.
A Ucrânia também está entre os seis maiores exportadores de milho, frango e mel. Tradicionalmente, o país envia milhões de toneladas de grãos por ano através do Mar Negro, obtendo cerca de 10% de seu Produto Interno Bruto do setor agrícola e alimentar.
Nesta quarta, a parlamentar ucraniana Yevheniia Kravchuk disse que o tempo está se esgotando para tirar a safra atual dos armazéns, de modo a liberar espaço para a próxima colheita.
“Temos cerca de um mês e meio antes de começarmos a coletar a nova colheita”, disse à agência de notícias Reuters nos bastidores do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
Segundo Kravchuk, a nova colheita deve equivaler a cerca de 70% da safra do ano passado, já que alguns dos campos estão agora sob controle russo.
“Os grãos estão bem porque trocamos alguns dos campos. Já os girassóis, que crescem principalmente no Sul, seriam um grande problema”, acrescentou, referindo-se a uma parte do país onde a Rússia ocupou grande parte do território.
O secretário de Defesa britânico, Ben Wallace, rejeitou a ideia da Rússia de suspender as sanções em troca do desbloqueio dos portos ucranianos.
“Peço à Rússia que faça a coisa certa no espírito da humanidade e deixe sair o grão da Ucrânia, pare de roubar o grão para seus próprios meios”, disse ele.
Na última segunda-feira (23), o chefe do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas, David Beasley, disse no Fórum Econômico Mundial que a falta de acesso a alimentos pode estimular milhões de pessoas a migrar.
“A falta de abertura dos portos é uma declaração de guerra à segurança alimentar global”, disse.
Segundo ele, cada aumento de 1% na fome resulta em um aumento de 2% na migração. Atualmente 49 milhões de pessoas estão “batendo à porta da fome” em 43 países, disse.
“Esses são os 43 países com os quais devemos estar extremamente preocupados, que enfrentarão desestabilização e migração em massa se não nos anteciparmos a isso”, disse.
Enquanto bloqueia o trigo ucraniano, Moscou fatura. A Rússia continuou a enviar seu trigo ao preço agora mais alto, encontrando compradores dispostos a pagar e arrecadando mais receitas por tonelada.
O país também espera uma próxima safra abundante de trigo, sugerindo que continuará lucrando com a situação. Os preços globais do trigo subiram mais de 50% este ano, e o Kremlin arrecadou US$ 1,9 bilhão em receitas com impostos de exportação do produto até agora nesta temporada, segundo estimativas da consultora agrícola SovEcon.
“Isso é usar comida como arma de guerra, em vez de atacar diretamente uma população”, disse à Bloomberg Tim Benton, diretor de pesquisa para riscos emergentes da Chatham House, aludindo aos comentários russos de que só desbloquearia o porto ucraniano de Odessa se as sanções forem suspensas.