Sexta-feira, 26 de abril de 2024

Saiba os motivos da explosão de covid na Rússia, que pode ter levado o país a ultrapassar o Brasil em número de mortes

Uma combinação de falhas no enfrentamento da pandemia, estatísticas sob suspeita, vacinação lenta e explosão de casos e mortes por Covid-19 retrata os últimos meses de pandemia na Rússia.

Agravando o quadro, cálculos extra-oficiais indicam que pode estar havendo uma enorme subnotificação de casos e mortes no país, o que sugere que a Rússia pode já estar ocupando o desagradável segundo lugar na lista mundial em número total de mortes por Covid-19, talvez superando o Brasil e ficando atrás apenas dos Estados Unidos.

Oficialmente, os números russos já são altos: em 11 de janeiro, o centro oficial de controle de Covid-19 russo calculou haver um acumulado de 10,6 milhões de casos de Covid-19 e 317,6 mil mortes.

Mas antes, em 30 de dezembro, a agência de notícias Reuters estimou, a partir de dados de excesso de mortalidade no país desde o início da pandemia, que o total de mortes pelo coronavírus chegaria a 658 mil – o dobro dos dados oficiais. E há quem acredite que esse número possa ser ainda maior.

Com isso, o país ultrapassaria a marca de 620 mil mortes oficialmente registradas até o momento no Brasil, que só é superada em números oficiais de mortes pelos Estados Unidos. É bom lembrar, porém, que diversos especialistas apontam que a soma real de mortos por Covid-19 no Brasil também provavelmente supera bastante a dos dados oficiais, devido a subnotificações ocorridas principalmente nos picos da pandemia.

Além disso, o Brasil vive atualmente um apagão de dados e uma escassez de testes de Covid-19, que também mascaram o atual estágio da pandemia no País.

A Reuters usou como base as 835 mil mortes excedentes registradas na Rússia desde o início do surto de Covid-19, em abril de 2020.

Esse excesso de mortes – ou seja, o quanto mais se morreu em um país, em comparação com os anos “típicos”, de antes da pandemia do coronavírus – tem sido usado por estatísticos em diferentes países (também no Brasil) para estimar a subnotificação dos óbitos em meio à Covid-19.

O pico de casos na Rússia ocorreu no último trimestre do ano passado e é atribuído ainda à variante delta, e agora as preocupações são com o avanço da ômicron.

Mas o que explica números tão altos e díspares no país que foi o primeiro do mundo a aprovar uma vacina contra a Covid-19, ainda em agosto de 2020?

Desconfiança

A vacina Sputnik V foi anunciada com grande entusiasmo ainda no primeiro semestre da pandemia.

Em 11 de agosto de 2020, o presidente Vladimir Putin afirmou que seu país seria o primeiro a dar aval regulatório a um imunizante contra o coronavírus, depois de dois meses de testes em humanos, o que foi exaltado como símbolo da proeza científica de Moscou.

“Sei que (a vacina) funciona com muita eficiência, forma imunidade forte e, repito, passou em todos os testes necessários”, afirmou Putin à época.

Alguns meses depois, o centro de pesquisas Gamaleya, responsável pela Sputnik V, informou que a vacina teria eficácia de 92%, sem efeitos colaterais inesperados – abrindo o caminho para uma “vacinação em massa”. Mas muitos observadores externos, embora ressaltem que a vacina parece de fato ter boa qualidade, se queixaram da ausência de transparência na divulgação dos dados do imunizante.

Passado mais de um ano, a Sputnik V já é exportada para mais de 70 países (no Brasil, ela não recebeu o aval da Anvisa).

E, no entanto, apesar da disponibilidade de vacinas nacionais, menos de 50% dos russos estão plenamente vacinados, aponta a plataforma Our World in Data.

Em comparação, o Brasil, que começou sua campanha de vacinação com atraso, já vacinou com duas doses mais de 67% da população.

A lentidão russa se deve a uma resistência à imunização com características bem peculiares, não necessariamente igual aos focos “antivacina” vistos no Ocidente, segundo especialistas.

A tecnologia por trás da Sputnik V é sólida e seu preço internacional é competitivo, mas a forma pouco transparente como ela foi apresentada pelo governo russo acabou, inadvertidamente, desencorajando a população russa a tomar a vacina, avalia a pesquisadora americana Judy Twigg, professora na Universidade de Virgínia Commonwealth, especializada em saúde global e Rússia e Eurásia.

“Existe um sentimento antivacina na Rússia que, assim como no Ocidente, vem de muitas fontes: dos rumores, da pseudociência, dos médicos que espalham desinformação, tudo isso muito antes da Covid-19. (Mas), sob Putin, há um segmento da população que não confia em nada que venha do governo – a ideia é de ‘se o governo nos diz para fazer algo (como vacinar), é porque deve ser a coisa errada a fazer’”, explica Twigg.

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