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Por Redação Rádio Pampa | 21 de janeiro de 2023
O céu tem cada vez menos estrelas. Isso, pelo menos, é o que nossos olhos parecem nos mostrar. Estudo publicado na revista científica Science, que analisou o período de 2011 a 2022, mostrou que nossa visão não está mentindo: a visibilidade das estrelas está se “deteriorando rapidamente”, ao passo que o brilho artificial do céu noturno, uma forma de poluição luminosa, aumentou em uma média de 9,6% ao ano.
Para se ter uma ideia do efeito prático do avanço da poluição luminosa nessa taxa, em um período de 18 anos, um local com 250 estrelas visíveis veria esse número reduzir para 100. É como se o brilho artificial do céu estivesse dobrando a cada oito anos.
Os cientistas Christopher Kyba e Yigit Oner Altinta, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ-Potsdam), e Constança Walker e Mark Newhouse, do Laboratório Nacional de Pesquisa de Astronomia Óptica-Infravermelha (NOIRLab), dos Estados Unidos, recorreram a um método de ciência cidadã para chegar a esses resultados.
Eles investigaram a mudança no brilho global usando 51.351 observações de “amadores”. Dentro do projeto Globe at Night, do NOIRLab, esses cientistas cidadãos de várias partes do planeta viram mapas do céu com diferentes níveis de poluição luminosa e foram questionados sobre qual combinava mais com a visão que tinham, o que permitiu aos cientistas observar o quanto a poluição luminosa afeta a visão a olho nu das estrelas.
No artigo, os pesquisadores destacam que a taxa que encontraram é bastante superior à estimada por observações que recorrem apenas a satélites (que mostraram, anteriormente, aumentos do brilho artificial em uma taxa de 2,2% ao ano). Eles explicaram que essa diferença se dá por causa da sensibilidades limitadas desses equipamentos, que não conseguem detectar luz com comprimentos de onda abaixo de 500 nm (nanômetros).
Assustador
Especialistas destacam que a taxa identificada é “assustadora”, mas não é uma surpresa. “O fundo do céu está cada vez mais brilhante e as estrelas mais fracas, estão sumindo, desaparecendo. Uma pessoa que nasceu agora e que nunca saiu da cidade vai achar que o céu só poucas estrelas brilhantes, jamais vai entender a natureza, não consegue nem entender onde é que ela está”, afirma Wagner José Corradi Barbosa, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
“Infelizmente, nós estamos vendo que a poluição luminosa, como um todo, está colocando em risco a possibilidade do ser humano conhecer a si mesmo”, diz, frisando a importância da astronomia para compreensão do Universo.
A preocupação com a maneira com que a poluição luminosa afeta nossa visão do céu, de fato, não é de hoje. Em 2016, o Atlas Mundial do Brilho Artificial do Céu Noturno, publicado na revista Science Advances, por Kyba e pesquisadores da Itália, Estados Unidos e Israel, com base em dados de satélite de alta resolução e medições de precisão do brilho do céu, revelou que mais de 80% do mundo e mais de 99% das populações dos EUA e da Europa vivem sob céus poluídos pela luz.
O estudo também mostrou que a Via Láctea, há pouco mais de 100 anos vista no arco do céu de qualquer cidade, estava escondida para mais de um terço da humanidade.
No estudo de 2016, os pesquisadores disseram ser possível imaginar dois cenários para o futuro. Em um deles, a poluição luminosa é controlada com sucesso e a geração atual seja última a experimentar um mundo tão poluído por luz. No outro, o mundo continua a brilhar, com quase toda a população nunca experimentando uma visão das estrelas.
Os impactos desse último caminho, traçado pelo estudo mais recente, conforme os especialistas, são grandes e ultrapassam prejuízos à ciência e observação do céu. Há efeitos adversos à saúde humana, que tem ciclos naturais do corpo, como o circadiano (ritmo em que o organismo realiza suas funções ao longo de um dia), que são ditados pela exposição à luz; e ecossistêmicos, com alterações em padrões migratórios dos animais e relações de predação.