Domingo, 06 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 29 de novembro de 2023
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou uma tese que vai nortear os parâmetros sobre liberdade de expressão e o direito à indenização por danos morais devidos em razão da publicação de matéria jornalística que imputa prática de ato ilícito a uma pessoa. A questão será paradigma para futuros julgamentos. O plenário definiu nessa quarta-feira (29) que os veículos só podem ser punidos por entrevistas se “houver indícios concretos da falsidade da imputação”.
Por maioria de votos, venceu a tese proposta pelo ministro Alexandre de Moraes, que defende que a liberdade de imprensa deve ser consagrada com “responsabilidade” e que não é um direito absoluto. Para ele, embora não se admita censura prévia, é possível responsabilizar a publicação por “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas”.
Diz a tese proposta por Moraes: “a plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.
Ainda segundo o enunciado do ministro, “na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.
Outras propostas
Além da proposta de Moraes, havia outras três sugestões de tese em discussão propostas por outros ministros: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio, hoje aposentado, que era o relator do caso. A ideia vencedora, porém, conseguiu angariar o consenso entre os demais ministros após algumas mudanças.
Após o julgamento, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que o objetivo da tese definida pela Corte não é praticar nenhuma forma de “censura prévia”, mas coibir o uso de informações “sabidamente inverídicas”.
“Se uma pessoa foi absolvida, faz parte do dever de cuidado do jornalista dizer que a pessoa foi absolvida. Portanto, esse é o debate. Não há nenhuma restrição à liberdade de expressão. Não há censura prévia. E, como tudo na vida, por mais que cada um de nós defenda a liberdade de expressão e de imprensa, e eu me considero um defensor permanente da liberdade de expressão, nenhum direito é absoluto. Portanto, as pessoas têm que se responsabilizar pelo que dizem”, declarou o ministro.
Repercussão
Samira de Castro, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), afirmou, após o julgamento, que a tese firmada pelo STF traz um “grau de responsabilização minimamente condizente” com as práticas do jornalismo de qualidade, priorizando o chamado “outro lado”. Ela pondera, contudo, a necessidade de uma “atenção redobrada” para as entrevistas ao vivo, quando o contraditório não pode ser feito de forma imediata.
Em nota, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) disse que a definição da tese final sobre a responsabilidade de veículos de comunicação em relação a declarações de terceiros foi um “avanço positivo” diante da “grave ameaça à liberdade de imprensa” que pairava sobre o julgamento.
A ANJ espera que, na elaboração e publicação do Acórdão de Inteiro Teor sobre o julgamento, tais dúvidas sejam dirimidas, bem como outras situações não explicitadas, como no caso de entrevistas ao vivo, sempre em favor da preservação do preceito constitucional da liberdade de imprensa”, diz o texto.
Kátia Brembatti, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), observa que o resultado do debate no STF “poderia ter sido pior”, e que as entidades de jornalismo seguirão em contato com a Corte para entender os efeitos da decisão.
Origem
No caso que fez com que o tema chegasse ao Supremo está uma disputa entre o jornal Diário de Pernambuco e a família do ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho, morto em 2017. O diário pernambucano foi condenado a pagar indenização pela publicação de uma entrevista publicada em 1995 em que o entrevistado imputou ao ex-parlamentar uma conduta ilícita. Zarattini foi acusado de responsável pelo atentado a bomba no aeroporto de Guararapes, em 1968, auge da Ditadura Militar.