Terça-feira, 03 de dezembro de 2024

Tomar banho sem passar sabão: entenda os motivos do médico que aderiu à prática

Há cinco anos, o médico e escritor James Hamblin decidiu fazer um experimento em seu próprio corpo: passou a tomar banho sem passar sabão. A prática começou inicialmente por ele precisar “economizar tempo, dinheiro e espaço”, após se mudar da Califórnia para um estúdio no Brooklyn, Nova York, no intuito de seguir a carreira de escritor. Professor na Escola de Saúde Pública de Yale e autor de podcasts da revista americana The Atlantic, ele começou a estudar a ciência dos microbiomas, então resolveu descobrir o que aconteceria com as bactérias e micro-organismos de sua pele se parasse de passar sabão sobre ela.

A única área do corpo que “se salvou” do experimento foram as mãos – que devem ser lavadas sempre ao chegar da rua, antes de comer e após usar o banheiro.

Temos trilhões de bactérias, fungos e vírus que vivem em simbiose com o nosso corpo – tanto do lado de dentro, como no intestino, como no lado de fora, na pele. Esses pequenos bichinhos formam a nossa microbiota. A presença destes micro-organismos não é necessariamente ruim – na verdade, muitas vezes eles têm função crucial na proteção do corpo.

Microbiologistas e marcas que desenvolvem produtos para pele estão descobrindo cada vez mais benefícios que estes germes podem proporcionar. Isso vai desde seus papéis principais no desenvolvimento de nosso sistema imunológico, protegendo-nos de patógenos (criando substâncias antimicrobianas e competindo com eles por espaço e recursos) até a diminuição da probabilidade de doenças autoimunes, como eczema. Portanto, há uma crescente conscientização de que limpá-los, juntamente com os óleos naturais dos quais se alimentam, ou encharcá-los com produtos antibacterianos pode não ser a melhor ideia.

O estigma do odor corporal começou como uma estratégia publicitária que ajudou a quadruplicar as vendas de sabonetes nos anos 1920. Um século depois, ainda vivemos com medo de que alguém sinta qualquer indício de “cecê” em nós. Por isso, exageramos e estamos mais perfumados, hidratados e esfoliados do que nunca.

Em contrapartida, apesar dos avanços nos cuidados com a pele e na medicina moderna, condições como acne, eczema e psoríase, bem como outras doenças autoimunes, têm aumentado constantemente.

Em seu livro Clean: The New Science of Skin and the Beauty of Doing Less (“Limpeza: A nova ciência da pele e da beleza de fazer menos”, em tradução literal), Hamblin conta que o odor corporal que ele tinha quando tomava banho não era tão intenso durante seus anos sem tomar banho. Ele conta também que, conforme seu experimento evoluía e “dava certo”, ele decidiu também abandonar o uso do desodorante.

“Minha pele tornou-se lentamente menos oleosa e tive menos manchas de eczema. Eu não cheirava a pinheiros ou lavanda, mas também não fedia que nem cebola, cheiro que eu costumava sentir quando deixava de passar desodorante por um dia”, disse ele em entrevista ao jornal britânico The Guardian.

Hamblin acha que nossos cheiros naturais são muito mais sutis e informativos do que acreditamos. Durante o experimento ele percebeu que seu corpo exalava mais odor quando ele estava estressado. Para o livro, ele entrevistou um pesquisador que estuda o treinamento de cães para farejar câncer e também com pessoas que se relacionavam com outras que não usavam sabão no banho (essas achavam que o cheiro dos seus parceiros era bom).

“As centenas de sinais químicos voláteis sutis que emitimos podem desempenhar papéis na comunicação com outras pessoas (e outras espécies) de maneiras que estamos apenas começando a entender”, escreveu ele no livro.

O médico relatou também em seu livro o caso de uma amiga jornalista que aderiu aos banhos sem sabão. Ela tinha acne e recebeu a indicação de todos os tratamentos possíveis. O único que funcionou foi não passar nada. Ela havia tentado adstringentes, para secar a pele; antibióticos orais e tópicos; o anticoncepcional; e isotretinoína, uma droga que tem sido associada a efeitos colaterais, como pensamentos suicidas e doença inflamatória intestinal. Essas opções não só foram ineficazes, mas também prejudiciais: ela também desenvolveu artrite reumatoide — uma doença autoimune agonizante. Quando ela começou a tomar medicação imunossupressora para isso, seu cabelo começou a cair.

A amiga então parou de tomar qualquer medicamento para a pele. Depois de alguns meses extremamente oleosos, a pele se acomodou. Agora, as únicas coisas que tocam seu rosto são um pano de microfibra e água.

Talvez como resultado de experiências como as relatadas no livro, microbiologistas, dermatologistas e empresas de cuidados com a pele estão se esforçando para criar novos medicamentos para doenças da pele, juntamente com produtos de beleza convencionais que contêm bactérias vivas ou ingredientes que podem alimentar nossos microbiomas. Existe até a perspectiva de produtos sob medida de gigantes da beleza, como a L’Oréal, que são adaptados aos nossos próprios microbiomas da pele, que são tão únicos quanto nossas impressões digitais.

O dermatologista Igor Manhães, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, diz que um experimento como este seria impraticável no Brasil, principalmente nas regiões mais quentes, devido ao clima tropical.

“Este médico mora em Nova York, um local mais seco, onde as pessoas não suam muito e já tomam menos banho. No Brasil, esta prática teria outros tipos de consequências. Aqui nós suamos muito mais e ficaria um pouco impraticável a convivência se todo mundo parasse de usar sabonete.”

 

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