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Por Redação do Jornal O Sul | 17 de março de 2022
A estagnação da cobertura vacinal contra a covid no País, juntamente com a alta de casos do novo coronavírus na Europa e na Ásia e as recentes flexibilizações no uso de máscaras no Brasil, são elementos que preocupam especialistas.
Apesar do “confortável” avanço da campanha nos últimos meses, a desigualdade na vacinação de diferentes faixas etárias é um alerta principalmente para a população mais vulnerável, como os idosos e imunossuprimidos, mas também um lembrete para que o Brasil não cometa os mesmos erros que outros países no enfrentamento à pandemia.
“Todos os recursos disponíveis para impedir a circulação do vírus devem ser tomados de forma concomitante. Portanto, estimular o aumento da cobertura vacinal não exclui as demais estratégias de proteção, sejam individuais ou coletivas”, defendem pesquisadores da Fiocruz em uma nota técnica.
De acordo com o documento, que analisou os dados diários da cobertura vacinal contra covid até o dia 13 de março, o principal desafio agora no País é a vacinação das crianças de 5 a 11 anos – grupo que hoje representa 9,5% da população brasileira. Nessa faixa etária, a cobertura da 1ª dose não chega à 40%.
Ainda segundo a análise da Fundação, os grupos com idades entre 12 e 49 anos são os únicos que não têm cobertura de primeira dose acima de 90%.
Diego Xavier, epidemiologista e pesquisador do Observatório Covid-19 da Fiocruz, explica que essas divergências ocorrem por três principais motivos: subnotificações que atrasam a distribuição da informação; hesitação vacinal, principalmente no caso da vacinação de crianças; e a comunicação “falha” da importância da campanha.
“O governo federal desacreditou o imunizante, e isso leva medo a alguns pais. Por isso, eles estão evitando a vacinação”, diz o pesquisador.
Em fevereiro, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga chegou a dizer que não se pode obrigar crianças a tomarem vacina. No mesmo mês, Queiroga também foi convocado pela Comissão de Direitos Humanos do Senado para explicar a nota elaborada por técnicos da pasta contrária à vacina e a demora na imunização infantil.
Na nota, a Fiocruz também reconhece que, como a análise se refere ao país como um todo, há uma desigualdade regional na cobertura vacinal, pois além das divergências de acesso e logística, alguns municípios têm apresentado dificuldade no envio de dados para o sistema de informação do Ministério da Saúde.
Quando se fala em segunda dose, o destaque negativo fica para o grupo de jovens abaixo de 29 anos, a única faixa da população com cobertura vacinal de esquema completo abaixo de 80%.
Segundo a Fiocruz, uma vez que a população brasileira ainda possui um grande volume de pessoas nesta faixa etária, a baixa cobertura concentrada nestas idades acaba influenciando diretamente a cobertura total.
“Basicamente, nós não temos um incentivo à vacinação hoje no Brasil”, avalia Ethel Maciel, pós-doutora em epidemiologia pela Universidade Johns Hopkins. “O que tivemos foi, na verdade, uma campanha muito forte de desincentivo do governo federal. Um caso muito mais grave. Com disseminação de notícias falsas sobre efeitos adversos pós-vacinais que nem estavam analisados”.
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Para reverter esse quadro, o epidemiologista Diego Xavier argumenta que é necessário um investimento nas campanhas de capacitação de profissionais a nível regional tendo em vista que a informação sobre a importância da vacina pode melhor atingir públicos diferentes de uma forma específica.
“A gente precisa investir nos municípios, a gente precisa contratar e treinar a equipe nesses municípios mais pobres e oferecer a oportunidade desses municípios informarem de forma adequada [os dados da campanha]”, diz. “Uma campanha que funciona no extremo Norte do Brasil pode não funcionar no Sul ou no Sudeste”.
O estudo da Fiocruz também analisou a cobertura vacinal por faixa etária da dose de reforço e concluiu que, até o momento, nenhum grupo etário alcançou o patamar de 80% de vacinados com essa dose, nem mesmo os idosos, que foram os primeiros a serem vacinados.
Diego Xavier explica que, apesar de alguns estudos apontaram que esse índice de 80 a 90% permita um bloqueio vacinal mais eficiente, a covid é uma doença que “veio para ficar” e que, por isso, à medida que normativas de relaxamento são estabelecidas, é preciso observar como grupos mais vulneráveis vão se comportar e como a queda da imunidade ao longo do tempo ocorrerá.
“A gente precisa acompanhar os estudos para entender essa queda. A gente já sabe que ela acontece, em torno de 5 a 6 meses, você tem essa queda de imunidade. Por isso precisamos tomar essa dose de reforço”, alerta o pesquisador.