Domingo, 28 de setembro de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 27 de setembro de 2025
Você toma uma taça de vinho tinto e, de repente, seu nariz entope, suas bochechas ficam vermelhas, a cabeça aperta ou o cansaço bate forte. Seria uma alergia? Uma reação aos sulfitos? Uma intolerância ao álcool? O que você sente pode ser… uma intolerância à histamina, um distúrbio pouco conhecido, mas relativamente comum. E não é a única causa possível.
As reações de hipersensibilidade a bebidas alcoólicas, especialmente ao vinho tinto, são relativamente frequentes e afetam cerca de 10% da população em geral.
A histamina é uma molécula produzida pelo nosso corpo, principalmente durante reações alérgicas. Mas ela também está presente nos alimentos, especialmente em produtos fermentados ou envelhecidos, como queijos curados, embutidos… e vinhos.
No vinho, a histamina vem principalmente de uma segunda fermentação, chamada fermentação malolática, conduzida por bactérias lácticas. Esse processo, muito valorizado para suavizar os vinhos tintos, também favorece a produção de histamina e de outras “aminas biogênicas” (tiramina, putrescina…).
O vinho tinto apresenta maior risco de hipersensibilidade à histamina do que o branco, devido ao processo de vinificação. Ele fermenta junto com as cascas da uva, ricas em precursores de aminas. Já o branco é prensado antes da fermentação, o que limita a carga de histamina. Além disso, os vinhos tintos quase sempre passam por fermentação malolática, ao contrário de muitos vinhos brancos secos ou espumantes.
Resultado: o vinho tinto pode conter até dez vezes mais histamina que o branco. Um estudo austríaco, realizado com 100 vinhos tintos de alta qualidade, mostrou que 34% deles ultrapassavam o limite de 10 mg/l de histamina.
Embora nenhuma política oficial tenha sido implementada, na Europa a indústria vinícola adotou limites entre 2 e 10 mg de histamina por litro de vinho. Mas, atualmente, não existe regulamentação específica sobre o teor máximo de histamina nos vinhos.
Normalmente, a histamina ingerida é eliminada no intestino pela enzima chamada DAO (diamina oxidase). A DAO está presente principalmente no trato gastrointestinal (sobretudo no intestino delgado), no fígado, nos rins e nos mastócitos. A histamina também pode ser degradada pela histamina N-metiltransferase (HNMT), presente em todos os tecidos.
Mas algumas pessoas têm atividade enzimática reduzida, seja por herança genética (mutação no gene AOC1), seja por doenças digestivas crônicas (como síndrome do intestino irritável ou doença celíaca), seja devido a medicamentos (antidepressivos, anti-inflamatórios…).
Nelas, mesmo pequenas quantidades de histamina podem desencadear uma série de sintomas em até uma hora após o consumo:
* vermelhidão no rosto, ondas de calor;
* nariz entupido, espirros;
* urticária, coceira;
* dores de cabeça, enxaquecas;
* distúrbios digestivos (cólicas, diarreia);
* sonolência repentina, queda de pressão.
Segundo o Instituto Internacional de Deficiência em DAO, mais de 10% da população teria essa deficiência.
O álcool inibe a ação da DAO e provoca acúmulo de histamina. Ele também aumenta a permeabilidade intestinal, facilitando a passagem da histamina ingerida para o sangue e seu acúmulo no cérebro. A histamina se liga a receptores H3 nos pequenos vasos cerebrais, causando vasodilatação e dores de cabeça induzidas.
Por tudo isso, se você for intolerante à histamina e estiver diante de uma mesa com álcool e alimentos ricos em histamina, como queijos, pode passar por maus bocados.
Atenção: a intolerância à histamina não é o mesmo que uma alergia. Numa verdadeira alergia, há uma reação do sistema imunológico envolvendo anticorpos IgE — o que não ocorre na intolerância.
Vale destacar que reações de hiperatividade brônquica após o consumo de álcool também são mais frequentes em pessoas asmáticas com rinite.
O vinho é um concentrado químico complexo. Outros componentes também podem estar envolvidos:
* Sulfitos (conservantes), principalmente no vinho branco, podem desencadear crises de asma;
* Etanol e seus metabólitos (como o acetaldeído) podem causar reações pseudoalérgicas;
* Flavonoides e taninos, abundantes no vinho tinto, podem favorecer enxaquecas ao interferirem em enzimas cerebrais.
Além de dar cor ao vinho tinto, os flavonoides inibem enzimas como a catecol-O-metiltransferase (COMT) e a fenol sulfotransferase (PST). Assim, o corpo não consegue desintoxicar os fenóis que chegam ao cérebro e provocam enxaqueca, semelhantemente ao efeito da histamina. Ou seja, os polifenóis — frequentemente exaltados como benéficos à saúde — também podem ter efeitos nocivos.
Já os congêneres, substâncias secundárias da fermentação, intensificam os efeitos indesejáveis e a famosa “ressaca”.
Se você sofre de intolerância ao vinho tinto, pode optar por outros tipos de vinho… ou aproveitar para migrar para bebidas não alcoólicas. Caso escolha vinhos, saiba que o champanhe também contém mais histamina do que o rosé ou o branco.
Também é recomendável evitar refeições que combinem muitos alimentos ricos em histamina (queijos, embutidos, frutos do mar…) com vinho tinto.
Em caso de reação de hipersensibilidade, recomenda-se retirar por alguns dias os alimentos ou bebidas alcoólicas suspeitos e reintroduzi-los gradualmente para identificar o responsável.