Sábado, 19 de abril de 2025

Autonomia do Banco Central impede que presidente da República tome decisão de acabar com o Pix

Um vídeo que viralizou no Facebook traz alegações enganosas sobre o Pix — sistema de pagamentos instantâneos implementado pelo Banco Central (BC). Um homem afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) poderia cancelar o Pix caso seja eleito — mas a autonomia do BC impede que o presidente tome sozinho essa decisão.

O vídeo traz outras informações erradas sobre o Pix, como a de que banqueiros teriam deixado de lucrar R$ 40 bilhões com o sistema de pagamento. Na realidade, a perda de receita com tarifas de pagamentos gira em torno de R$ 1,5 bilhão.

A autonomia do Banco Central foi definida pela Lei Complementar nº 179/2021, que desvinculou a autarquia do Ministério da Economia. O Artigo 6º da lei prevê que a instituição seja caracterizada pela ausência de vinculação, de tutela ou de subordinação hierárquica a ministérios. O objetivo é que o BC tenha autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira.

De acordo com o meste em Direito e economista Alessandro Azzoni, professor na Universidade Nove de Julho (Uninove) e coordenador do Núcleo de Estudos Socioambientais (Nesa) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o fim do Pix não pode se dar por ato discricionário do Poder Executivo. A única maneira de haver uma interferência de um presidente neste sentido seria influenciar politicamente a cúpula do Banco Central a propor o fim da ferramenta de pagamentos.

Com a autonomia, foram determinados mandatos fixos de quatro anos ao presidente e diretores do BC com o intuito de evitar interferências políticas. Azzoni ressalta que o Presidente da República é quem indica o presidente e membros da diretoria do Banco Central. Os indicados então são sabatinados pelo Senado e precisam ser aprovados em votação.

“Apesar da independência do Banco Central, acho que ainda poderia haver uma interferência do Executivo”, ponderou. “Mas numa ferramenta tão consolidada (como o Pix) eu acho que seria um desgaste grande para o Executivo e que não seria o caminho”.

O professor observa, ainda, que todas as discussões sobre o sistema financeiro passam também pelo crivo do Comitê de Política Monetária (Copom), formado pelo presidente do órgão e diretores. “O fim do Pix não é uma coisa muito simples de se mobilizar e se desfazer por um ato do Executivo”, afirmou. “O presidente acaba não tendo essa autonomia sobre a gestão da regulamentação do mercado financeiro, tudo passa pelo Copom. Existe uma fundamentação para as decisões”.

O doutor em economia Giliad de Souza Silva, professor da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará e diretor da Sociedade Brasileira de Economia Política, afirma que a autonomia do Banco Central foi pensada para dificultar que o Poder Executivo altere as políticas definidas pela instituição, sobretudo as monetárias e financeiras.

“Se houver uma ação nesse sentido, basicamente o presidente vai estar incorrendo em algum tipo de crime porque vai estar colocando em contradição o que regula a autonomia do Banco Central”, disse. “A lei que regula essa autonomia impede uma ação desse caráter”.

O professor disse não acreditar que haja interesse em acabar com o Pix. “Já há um nível de consolidação institucional. Os sistemas bancário e financeiro já funcionam de modo bastante regular através do Pix e há uma adaptação dos bancos em sentido amplo sobre o uso desse instrumento”, opinou.

O doutor em administração Paulo Roberto Feldmann, professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (USP), afirma que a legislação atual não permite que o detentor do cargo faça alterações no pagamento eletrônico. “Assim como o Banco Central implantou sem consultar ninguém, ele pode remover se assim quiser.”

Para o professor, não faria sentido para um presidente promover mudança em uma política que funciona bem e que é bem avaliada pela população, além de gerar um volume grande de transações para os bancos.

Sobre o assunto, Lula se posicionou em sua conta no Twitter afirmando ser invenção que pretende acabar com o Pix e se posicionando a favor da inclusão bancária.

O autor do vídeo afirma ainda que os banqueiros deixaram de receber R$ 40 bilhões ao ano após o lançamento da ferramenta de pagamento em 2020. Trata-se de uma reprodução do discurso do ministro da Casa Civil Ciro Nogueira (PP-PI), que afirmou no Twitter que o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez os banqueiros perderem esse valor por ano.

Para Nogueira, isso teria levado representantes do sistema financeiro a classe a assinar a Carta em Defesa da Democracia. Bolsonaro também afirmou que a assinatura do documento é uma reação dos banqueiros à criação do Pix e a um suposto fim do monopólio do setor bancário.

Em 2021, no entanto, Itaú Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Santander – as quatro maiores instituições do Brasil – tiveram o maior lucro dos últimos 15 anos, de R$ 81 bilhões. Neste mesmo período, o Pix resultou em perda de R$ 1,5 bilhão em receitas com tarifas dos mesmos bancos. A “perda” com o Pix representou, assim, menos de 2% do lucro daquele ano.

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