Sábado, 27 de abril de 2024

Brasileiros compram clube inglês e apostam em tecnologia e boas finanças para subir de divisões

Quando brincava no Championship Manager, um jogo de videogame em que se comanda um clube de futebol, o jovem Guilherme talvez não imaginasse que, um dia, isso se tornaria realidade. Seu interesse por futebol europeu surgiu na Copa do Mundo de 1990, o que o fez comprar revistas sobre as principais ligas do continente, antes mesmo da popularização delas pelo público brasileiro na última década. Mas a vida adulta levou-o para o mercado financeiro e hoje ele é o CEO e um dos fundadores da VO2 Capital, empresa que oferece soluções de gestão de patrimônio com ênfase em investimentos imobiliários e alternativos no Brasil e Estados Unidos.

O sonho de garoto de Guilherme Decca de comandar um clube começou a se materializar no ano passado. A VO2 Capital, que conta com clientes que trabalham ou têm contatos nos bastidores do futebol, recebeu a oportunidade de investir em clubes europeus.

A ideia de realizar o sonho de criança cativou Decca, mas ele precisou convencer seu parceiro André Ikeda e a empresa, que estavam receosos com o investimento no futebol. Eles analisaram as principais ligas europeias e decidiram investir no futebol inglês, apesar dos problemas que identificaram em muitos clubes.

“Olhamos da 3ª a 6ª divisões inglesas, mas vimos clubes muito mal administrados por anos e jogadores com salários bem altos. Só para você ‘voltar para o zero’, tem anos de trabalho pela frente. Entendemos que era melhor descer de divisão, sem esse legado de problemas e reconhecer o aprendizado que precisamos ter ainda. Por isso, demos um passo atrás”, diz Decca, que mora há mais de 10 anos nos Estados Unidos e chegou a residir na Inglaterra, assistindo a jogos de diferentes divisões.

Depois de tanta procura, encontraram o Wakefield AFC, da cidade de mesmo nome – a maior da Inglaterra sem um time profissional –, próximo a Leeds e localizado em uma região metropolitana de 340 mil habitantes. A avaliação extensa dos investidores brasileiros era de que o clube criado em 2019 não apresentava dívidas e possuía grande potencial de crescimento, ainda que em divisões mais abaixo do que o planejamento inicial.

Havia na região um time chamado Emley FC, mas localizado no vilarejo de mesmo nome. No início dos anos 2000, passou por grandes transformações: mudou sua sede para a cidade de Wakefield, trocou as cores do uniforme e o nome Emley FC virou Wakefield FC. Os problemas financeiros do clube levaram à sua falência em 2014.

O projeto dos empresários brasileiros busca tornar o clube autossustentável financeiramente. Decca entende que todo esse processo é demorado e projeta, em até 20 anos, alcançar a quarta divisão, quando há um salto de investimentos, especialmente com a entrada do dinheiro da transmissão dos jogos. Caso o clube suba para as primeiras divisões, onde o fluxo de dinheiro envolvido é bastante elevado, os donos também vislumbram, claro, ganhar dinheiro.

“O clube não dá lucro ainda, isso é um processo demorado. Nossa visão é a longo prazo. Não podemos achar que toda solução é sempre investir mais dinheiro. A gente sabe como os clubes em divisões acima da nossa gastam, como podemos gastar e é bem razoável chegar lá nesse tempo”.

Futebol e comunidade lado a lado

Apesar de ser a principal liga de futebol europeu hoje, o Campeonato Inglês conviveu – e ainda convive – com donos de clubes sem relação com o esporte, desconectados da torcida e da cidade e com seus reais interesses direcionados para fora do campo.

“Na Premier League, tem um pouco de tudo, cada clube é um caso. Muitos investidores compram só por ser negócio. Qual o interesse da Arábia Saudita no Newcastle? É puro sportswashing. A Federação Inglesa também jamais deveria permitir que donos comprem clubes que burlam o Fair Play Financeiro. Eu acho isso um absurdo”, opina.

Um dos lemas de Decca desde a compra do Wakefield AFC é aproximar o clube da comunidade e dos negócios locais e que todos se fortaleçam nessa relação. Os investidores apostam nesse pilar para projetar um crescimento estruturado a longo prazo.

“Muitos clubes ingleses falham em tratar mal a torcida. Fizemos um acordo com os donos anteriores do Wakefield AFC de que não queríamos comprar todas as ações: 15% delas hoje são dos torcedores. Nosso objetivo é estar nas escolas e penetrar na sociedade. Também estamos em processo de comprar um terreno que vamos usar para treinar, mas que também possa ficar para as escolas locais usarem para outras atividades”.

Tecnologia para derrotar rivais

O Wakefield AFC também aposta na tecnologia como um trunfo para vencer os adversários em uma liga com raros recursos para a área. Decca explica que, antes da compra, mergulhou não só nos estudos sobre os negócios do esporte, mas também de outras áreas, como scouting de jogadores. Os novos donos criaram recentemente um departamento de análise e performance e compraram câmeras que usam inteligência artificial e lente de 180 graus para gravar as partidas.

“Não existem dados (de jogadores) da quarta divisão até a nossa. Estamos criando dados que não existem, não estamos analisando o que já está disponível. Eu estudo muito o caso do Brentford (clube da região metropolitana de Londres que chegou à primeira divisão ao apostar em metodologia de inteligência analítica)”, explica Decca, que conta com a ajuda de André Ikeda para analisar de perto as métricas do time.

O foco em dados faz com que o Wakefield AFC reforce seu elenco apostando no monitoramento detalhado de atletas, além da observação de jovens dispensados de clubes das primeiras divisões localizados na região, como Leeds United, Huddersfield Town, Sheffield United e Sheffield Wednesday.

A aproximação do clube inglês com o público brasileiro também está em curso. Decca revela que estuda realizar transmissões próprias dos jogos do time para o país, além de produzir podcasts sobre a história do clube em inglês e português.

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