Quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Criminosos pagavam “mesada” para evitar investigações de delegacia comandada por Rivaldo, o delegado que teria mandado matar Marielle; propina podia chegar a R$ 300 mil, diz Polícia Federal

O relatório da Polícia Federal (PF) sobre as investigações do caso Marielle cita um documento que afirmava que o delegado Rivaldo Barbosa, preso no domingo pela morte da vereadora Marielle Franco e Anderson Gomes, interferia no andamento e na elucidação de casos envolvendo bicheiros. O relatório aponta que pagamentos para obstruir investigações poderiam chegar a R$ 300 mil por caso, além de um valor mensal que era pago ao grupo.

O documento que falava sobre Rivaldo e foi citado pela PF foi produzido durante a intervenção na segurança pública no Estado do Rio de Janeiro, em 2018, e que foi encaminhado aos generais Walter Braga Netto, então interventor, e Richard Fernandez Nunes, o secretário de Segurança.

Segundo as investigações, a intenção da obstrução destes casos era proteger os contraventores e seus crimes. O material está dentro do relatório da Polícia Federal que embasou a prisão de Rivaldo e dos irmãos Brazão.

O relatório aponta o indício do envolvimento de Rivaldo com diversos crimes, como organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O documento destaca que ele manteve um esquema criminoso enquanto foi chefe da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC).

Em depoimento aos policiais federais, Orlando Curicica contou que existia um sistema de pagamento mensal previsto para que o comando da Delegacia de Homicídios não investigasse os assassinatos. O pagamento funcionava como uma mesada e variava entre R$ 60 mil a R$ 80 mil. Segundo ele, remessas adicionais deveriam ser pagas nos casos dos crimes que deixavam provas e rastros.

Curicica dá como exemplo de mortes ligadas à contravenção que não foram devidamente investigadas. Ele cita as mortes de Marcos Falcon, presidente da Portela morto a tiros em setembro de 2016; Haylton Carlos Gomes Escafura, assassinado com a mulher em um hotel na Barra da Tijuca em 2017; e Geraldo Antônio Pereira, morto em um tiroteio em uma academia de ginástica no Recreio dos Bandeirantes em 2016.

O documento afirma que a DHC teria recebido de uma pessoa ligada ao contraventor Rogério Andrade cerca de R$ 300 mil para não “perturbar” os prováveis envolvidos na execução de Pereira.

O advogado de Rivaldo Barbosa, Alexandre Dumans, disse que seu cliente não obstruiu as investigações das mortes de Marielle e Anderson.

“Ao contrário. Foi exatamente durante a administração dele que o Ronnie Lessa foi preso”, afirmou.

Inerte

O relatório destaca que “toda essa dinâmica não seria possível se o principal órgão responsável por reprimir a ação desses grupos não fosse conveniente com o esquema” e “permanecer inerte”.

Ainda de acordo com o documento, o grupo era responsável por garantir a impunidade.

Existiam “diversas denúncias que dão conta da existência de um acordo entre a Delegacia de Homicídios da Capital a contravenção, para encobrir a verdadeira autoria e motivação dos crimes de homicídios vinculados à contravenção”. Ou seja, a “polícia garante a impunidade e a continuidade da dinâmica criminosa”.

A filha de Marcos Falcon, Marcelle Guimarães, afirmou em depoimento que todos com os quais conversava com a morte do pai, sobretudo policiais, a desestimulavam a procurar a DHC, pois a delegacia estaria “comprada”.

Em depoimento ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), Brenno Carnevalle, atualmente secretário de Ordem Pública do capital fluminense, e em 2018 lotado na DHC e responsável pela apuração dos homicídios envolvendo agentes de segurança pública – vítima ou autor -, contou que havia indicativos da existência de um esquema de corrupção no cerne da delegacia.

Aos promotores do MPRJ, Carnevalle afirmou que entre agosto de 2016 e março de 2018 não houve nenhuma elucidação de crimes envolvendo bicheiros na especializada.

Ao Gaeco, Brenno disse também que vivenciou situações “estranhas”, como o sumiço de inquéritos, como o do assassinato do ex-policial André Luiz Barreto Serralho, de 43 anos, em agosto de 2016, em Curicica, na Zona Oeste. O delegado também afirmou que era corriqueiro o desaparecimento de materiais apreendidos; havia excesso de burocracias nas investigações contra contraventores; e a súbitas trocas de delegados em investigações.

O delegado contou também que Rivaldo o questionava com frequência como estava o caso de Falcon, pedindo que ele informasse sobre qualquer novidade na investigação.

Haylton Escafura era filho de outro contraventor, José Caruzzo Escafura, o Piruinha, e tomava conta de parte dos negócios da família.

Geraldo Antônio Pereira teve o nome citado pela CPI das Milícias, que o apontou como um dos integrantes de um grupo que atuava em Curicica, na Zona Oeste da capital fluminense.

A morosidade nas investigações de mortes relacionadas ao jogo do bicho foi citada pelo juiz Bruno Rulière, da 1ª Vara Criminal Especializada em Organização Criminosa, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em agosto do ano passado. Na sentença em que os irmãos Leonardo e Leandro Gouvêa da Silva, conhecidos, respectivamente, como Mad e Tonhão, a 13 anos e 4 meses de prisão, foram condenados, o magistrado critica as investigações.

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Brasil

Fuga de estrangeiros faz a Bolsa brasileira perder R$ 21 bilhões neste ano
Investigações do caso Marielle são ampliadas e delegado Rivaldo é o fio condutor; mas tem mais?
Pode te interessar
Baixe o app da TV Pampa App Store Google Play