Domingo, 06 de julho de 2025

Movimento de políticos e intelectuais pede que o Rio de Janeiro volte a ser capital do Brasil

A historiadora Marly Motta brinca que, desde a fundação de Brasília em 1960 e a fusão dos Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara em 1975, há uma espécie de nuvem que paira no céu fluminense e ocasionalmente se espalha pelo país.

A nuvem é uma metáfora para o inconformismo com a perda do posto de capital brasileira pelo Rio de Janeiro e com a incorporação desse antigo Distrito Federal (que de 1960 a 1975 se tornou o Estado da Guanabara) ao Estado do Rio de Janeiro.

“De vez em quando, chove”, diz Motta, professora aposentada da Fundação Getúlio Vargas no Rio (FGV-RJ) e especialista em história política do Rio de Janeiro (principalmente da cidade), comparando os pingos de chuva a projetos que buscam reparar essas mudanças do passado.

“Por exemplo, quando há algum evento como a ECO-92 (Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio em 1992), vem esta ideia de transformar o Rio novamente em capital do Brasil.”

Em maio deste ano, “choveu” de novo: os pesquisadores Christian Edward Cyril Lynch, Igor Abdalla Medina de Souza e Luiz Carlos Ramiro Junior organizaram e publicaram o livro Rio, 2º Distrito Federal: Diagnóstico da crise estadual e defesa da federalização, com propostas que vão desde a transformação do que hoje é a cidade do Rio em segunda capital ou em cidade federal à sua separação do restante do Estado do Rio de Janeiro.

Lynch é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Souza é diplomata de carreira do Itamaraty e Junior é coordenador-geral do Centro de Pesquisa e Editoração da Fundação Biblioteca Nacional.

Segunda capital

Em entrevista por telefone, Lynch afirmou que a cidade do Rio de Janeiro é hoje um “segundo distrito federal” encoberto e uma capital estadual artificial, precisamente por ter essa vocação nacional, que remonta à história de ter sido capital imperial e republicana até a fundação de Brasília, em 1960.

“O Estado do Rio é um minotauro federativo: tem uma cabeça de capital (nacional) e corpo de Estado”, diz o cientista político. “Uma decisão tomada em Brasília tem muito mais impacto na economia do Rio (cidade) do que uma decisão tomada pelo governador do Estado.”

A estreita ligação entre a cidade do Rio e a identidade nacional é materializada, segundo Lynch, nos muitos nomes de ruas, instituições e monumentos em solo carioca que remetem à história nacional, além do símbolo brasileiro que o Rio é para estrangeiros e turistas.

Os tempos de capital deixaram também como herança na cidade muitas propriedades pertencentes à União, além de sedes e escritórios centrais de companhias e órgãos governamentais nacionais, como a Petrobras, uma empresa de capital misto controlada pela União; a Fundação Nacional de Arte (Funarte), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Casa da Moeda do Brasil, entre outros.

O contingente de funcionários públicos ainda é grande no Rio — são 223 mil servidores do Executivo federal ali (incluindo ativos e inativos), o segundo maior número no País, atrás do Distrito Federal, que tem 307 mil deles, de acordo com dados da plataforma Painel Estatístico de Pessoal, do governo federal. Nas posições seguintes, vêm Minas Gerais (94 mil servidores) e São Paulo (69 mil).

“Que Estado da federação tem isso (forte presença federal)? Nenhum. Muitas vezes, isso é colocada como uma vantagem do Estado do Rio, mas é um problema, porque você não consegue estadualizar a região. Criou-se um problema de cultura política”, diz Lynch, exemplificando como contraponto São Paulo, com instituições e símbolos estaduais fortes.

Origem

O cientista político conta que suas críticas e propostas tiveram origem em uma pesquisa que fez por volta de 2017, quando o Estado do Rio estava “quebrado”. No ano seguinte, em 2018, houve uma intervenção federal na segurança pública do Estado, na qual o governo federal atuou diretamente nos órgãos e na gestão desta área.

Lynch cita também as mais de 10 operações de Garantia da Lei e Ordem (GLO) no Rio desde 2010, com ação temporária das Forças Armadas em cenários de ameaça à ordem pública; e a declaração de calamidade na saúde em 2005 e de calamidade financeira em 2016. Para ele, estas intervenções evidenciam que, na prática, a União ainda é responsável pelo Rio.

“Cheguei à conclusão que um Estado que tem 40 anos, já passou por todos tipos de governadores e partidos e não consegue se estabilizar tem um problema crônico devido à mudança da capital e à fusão imposta pela ditadura militar”, conclui o cientista político.

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