Quarta-feira, 09 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 29 de outubro de 2023
Oito em cada dez mulheres lésbicas já sofreram algum tipo de violência e 70% delas têm medo de dizer a orientação sexual nos atendimentos de saúde. É o que aponta o primeiro censo voltado para a população lésbica brasileira, realizado pela Liga Brasileira de Lésbicas e Mulheres Bissexuais (LBL), em parceria com a associação lesbofeminista Coturno de Vênus.
O resultado foi apresentado durante o 11º Seminário Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais, realizado neste final de semana em Recife.
“A cada dez mulheres lésbicas, oito já sofreram lesbofobia, é um número muito alto. Se a gente for pensar na questão do acesso à saúde, mais de 70% têm medo de dizer a orientação sexual quando vai procurar um serviço de saúde e isso tem a ver com todo esse processo de discriminação que a gente tem”, explicou a coordenadora da pesquisa Grazielle Tagliamento.
Para Grazielle, o mapeamento – que entrevistou 21.051 mulheres de todo o Brasil – deve servir de base para o planejamento de políticas públicas. A pesquisadora considera que os resultados refletem o que já é acompanhado na prática, mas que até então não era constatado com dados quantitativos.
“[O resultado] Não surpreendeu porque é algo que a gente já sabia a partir da nossa vivência. O número de violência que a gente sofre, a dificuldade de acesso a políticas públicas. Com esses dados, agora a gente tem um material consolidado para falar aquilo que a gente sabia na nossa experiência prática de movimento social”, explicou a pesquisadora.
Pesquisa em fases
Os resultados divulgados essa semana são a primeira fase, de um total de três, do estudo que contou com supervisoras em todos os estados. Segundo Grazielle Tagliamento, a segunda fase do estudo teve recursos garantidos pelo Ministério das Mulheres. As mulheres lésbicas que demonstraram interesse na primeira etapa serão entrevistadas para complementar o censo com dados qualitativos.
“A gente começou a coletar os dados em agosto de 2021, ainda na pandemia. Era um questionário que a gente disponibilizava na internet, nas redes sociais. [..] Além disso, já no início de 2022, a gente conseguiu ir a presídios e entrevistar as [mulheres lésbicas] que estão privadas de liberdade e a população em situação de rua”, disse Grazielle.
Grazielle explicou que o estudo focou apenas no grupo de lésbicas, incluindo 1664 mulheres transexuais que se identificam como lésbicas. A próxima fase incluirá mulheres bissexuais e demais identidades sáficas, que abrangem mulheres que sentem desejo ou afeto também por mulheres, mas não necessariamente de maneira exclusiva.
Perfil geral
– 36,46% disseram não ter religião; 12,22% eram adeptas do candomblé ou umbanda; e 11% se declararam católicas;
– 2,39% das que responderam a pesquisa tinham alguma deficiência;
– 27,71% tinham ensino superior incompleto; 26,29% tinham ensino superior completo; 17,18% tinham pós-graduação;
– 60,43% estavam num relacionamento. Destas, 84,23% estavam num relacionamento exclusivo; 8,79%, num relacionamento aberto; e 1,91% viviam um relacionamento poliamoroso.
Violência
– 78,61% já sofreram lesbofobia;
– Destas, 19,66% foram violentadas na rua; 14,68% sofreram violência em casa; e 11,90% declaram terem sido agredidas em locais de lazer;
– 38,36% disseram não ter feito nada após serem vítimas de violência.
Trabalho
– 73,4% estavam trabalhando, enquanto 26,6% não trabalhavam no momento;
– 56,1% tiveram mudanças na renda durante a pandemia;
– Destas, 27,77% tiveram perda de renda pela diminuição de clientes ou serviços; 25,93% tiveram redução de salário; e 14,99% tiveram acúmulo de função sem aumento de rendimento.
Família
– 90% não tinham filhos;
– Entre as que tinham filhos, 9,64% sofreram lesbofobia durante a gestação, parto ou puerpério;
– 28,08% viveram situações de lesbofobia com seus filhos ou filhas.
Saúde
– 24,98% já sofreram discriminação ou violência por ser lésbica/sapatão durante um atendimento ginecológico;
– 72,94% disseram ter medo, receio ou constrangimento de falar sobre sua sexualidade num atendimento de saúde;
– 39,19% declararam que faziam exame ginecológico anualmente; 26,07% dissera que faziam exames sem regularidade e 12,53% disse que nunca fez exames ginecológicos;
– 81,62% não usava proteção para Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs); 37,26% nunca havia feito teste para HIV; e 14,86% declararam já terem tido alguma IST.