Quinta-feira, 05 de dezembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 25 de fevereiro de 2024
Homem, casado, com ensino médio e superior. Esse é o perfil médio do público que, encorajado pela flexibilização do acesso às armas do governo Bolsonaro, pleiteou um registro de CAC. O predomínio é de homens (97%), casados (62%), com ensinos médio (34,1%) e superior (33,3%) e moradores das regiões Centro-Oeste e Sul, segundo a Polícia Federal.
Os dados são baseados no recadastramento das 962.782 armas adquiridas no país depois de 2019, medida prevista no decreto do governo Lula que restringiu o acesso incentivado pelo antecessor. As profissões mais armadas são administrador (13,6%), comerciante varejista (7,5%) e produtor agropecuário (6,7%).
Um cruzamento do número de armas por município com suas populações mostrou maior concentração em áreas dominadas pelo agronegócio, principalmente a pecuária. Os locais com mais armamento de CACs são o Sul de Goiás, nas regiões de Rio Verde e Jataí; o Leste do Mato Grosso, no entorno do Parque do Xingu; todo o Norte gaúcho; e o interior de Santa Catarina e Paraná. Clevelândia (PR) é a campeã da lista: há uma arma para cada 15 moradores.
Em quatro anos, o número de brasileiros que tiraram o certificado de CAC mais que sextuplicou, passando de 117.467, em 2018, para 783.385 no final de 2022. O policial federal Roberto Uchôa, conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que o perfil deles mudou. O ponto de virada, acredita, foi 2017, no governo Temer, com a publicação de uma portaria do Exército que regulamentou o porte de trânsito.
“Até aquele ano, eram os esportistas de fato que frequentavam os clubes. Esse público que chega depois quer o porte de trânsito. As pessoas começam a virar CAC porque querem andar armadas”, afirma Uchôa, autor do livro “Armas para quem”, resultado de uma pesquisa sobre clubes de tiros e seus frequentadores.
Mudança com decreto
Até 2003, qualquer brasileiro com mais de 21 anos podia ir a bares, shoppings, parques e teatros com uma arma. Com a aprovação do Estatuto do Desarmamento, o porte foi proibido para civis, com exceções para poucas categorias profissionais. Com a portaria do governo Temer, a categoria ganhou o direito de se deslocar de casa até o clube ou competição com a arma municiada e pronta. CACs aproveitaram a dificuldade de comprovação do trajeto para andarem armados, e clubes de tiros pipocaram pelo Brasil.
A popularização da categoria, diz Uchôa, criou um mal-estar entre a velha guarda do tiro e os novatos. O pesquisador destaca que os recém-chegados têm um poder aquisitivo menor, porque os preços para praticar tiro ficaram mais baratos, e são mais ideologizados.
“Por volta de 2018, começa a chegar uma turma com camiseta do Brasil, falando em Bolsonaro”, observa.
O empresário Alexsandro de Godoy, de 51 anos, morador de Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba, comprou a primeira arma há 30 anos, no balcão da Mesbla. Casado e pai de duas filhas, tem licença de autodefesa pela Polícia Federal. Ao ter negado o pedido de uma segunda arma para proteger um segundo estabelecimento onde trabalhava, tirou a licença de CAC, em 2020. A partir daí, comprou duas pistolas 380, um revólver 44 Magnum e uma pistola 9mm — o calibre favorito, segundo o recadastramento.
“Comecei a participar de competições, de treinamentos, e comprei mais para ter opção para competir”, justificou Godoy.
Programa de família
O empresário catarinense Thiago Barboza, de 41 anos, deu seu primeiro tiro num estande a convite de um amigo. Gostou tanto que decidiu fazer parte desse mundo. Nos clubes de Florianópolis, Barboza encontrou um lugar para “desestressar”. Aos poucos, foi levando a mulher e o casal de filhos de 6 e 8 anos para curtir o clube. Tirou sua carteirinha de Caçador, Atirador e Colecionador (CAC) junto ao Exército Brasileiro em agosto de 2022.
“Para mim, é uma terapia, um lugar onde esqueço de tudo. Ainda trabalho nível de concentração, segurança e hierarquia”, conta.