Quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Rússia usa sequestros para intimidar moradores da Ucrânia

Há semanas, centenas de milhares de ucranianos passaram a conviver com a ocupação russa. Sequestros estão na ordem do dia como meio de exercer pressão e forçar cooperação. Políticos e jornalistas são os principais alvos. As tropas russas conseguiram avançar rapidamente no sul da Ucrânia desde a invasão do país no final de fevereiro.

Em Melitopol, por exemplo, os ocupantes estabeleceram a prática de prender prefeitos, os substituir por políticos locais pró-Rússia e perseguem ativistas pró-Ucrânia, incluindo jornalistas. Há relatos de prisões, muitos falam de sequestros. Os ocupantes oferecem cooperação − e prendem parentes para usá-los como pressão. A DW falou com pessoas afetadas.

Melitopol é uma pequena cidade na região de Zaporíjia, que fica na península da Crimeia, anexada pela Rússia. A cidade foi capturada pelas tropas russas praticamente sem luta nos primeiros dias da guerra. O prefeito Ivan Fedoriv foi sequestrado e após alguns dias foi trocado pelo governo de Kiev por prisioneiros de guerra russos. Halyna Danylchenko, uma deputada local do partido pró-russo Bloco de Oposição, declarou-se prefeita interina.

Svitlana Salisetska é a chefe e proprietária de uma agência de notícias local em Melitopol. Ao telefone, Salisetska disse que Danylchenko havia oferecido a cooperação com os ocupantes, mas ela rejeitou e deixou a cidade. Seus pais, de saúde precária, ficaram: “Eles disseram que nada nos aconteceria”. Um erro, como acabou se revelando.

“No dia 23 de março às 7 horas da manhã, três ou quatro ocupantes vieram à minha casa. Um estava em roupas civis, os outros usavam uniformes militares russos e carregavam metralhadoras. Eles revistaram a casa, colocaram meu pai no carro e o levaram para um lugar desconhecido”.

Nessa mesma noite, Salisetska recebeu um telefonema de um homem com sotaque caucasiano que se dirigiu a ela citando-a pelo nome. Ela logo ouviu a voz do pai, de 75 anos, que disse estar “em algum lugar em uma adega”, relata Salisetska. Ao narrar o caso, ela luta com as lágrimas. O desconhecido disse à jornalista que ela deveria retornar a Melitopol para ficar com o pai. Salisetska disse que não, e a chamada foi cortada.

Após alguns dias, ela conseguiu falar com o pai pelo telefone novamente. Não lhe havia acontecido nada e ele fora libertado. Antes disso, Salisetska havia concordado em entregar seu meio de comunicação a terceiros. No Facebook, ela escreveu que não havia concordado em “colaborar com os ocupantes”.

Instagram

Por volta da mesma época em Melitopol, a família da estilista Tetiana Kumok também teve uma experiência com os ocupantes russos. O pai dela era coproprietário de uma empresa de mídia local. Sua família e três jornalistas foram presos no final de março e interrogados durante horas.

“O objetivo era forçar a cooperação para que o jornal trabalhasse para as forças de ocupação, minha mãe e eu éramos reféns”, lembra Kumok. No final, diz ela, eles a fizeram assinar uma declaração de que ela não havia sido espancada. “É verdade, foi assim”, diz a jovem mulher. Seu pai se recusou a cooperar com os ocupantes e fechou o jornal, que já estava em situação difícil, e o site na internet.

Nem todos são tratados como a família Kumok. “Muitas pessoas são raptadas todos os dias. De alguns, não se tem notícia há dez dias”, diz Tetiana. Inicialmente, diz ela, havia comícios pró-Ucrânia na cidade todos os dias, com a participação de milhares de cidadãos. “Após o sequestro do prefeito, os comícios foram interrompidos. Mesmo os transeuntes comuns foram presos, os jovens foram espancados”, diz Kumok.

“É perigoso estar nas ruas. É por isso que agora as pessoas estão se manifestando no Instagram. Os cidadãos escrevem que não querem pertencer à Rússia e que Melitopol é ucraniana”. Em 2014, cerca da metade dos habitantes da cidade era pró-russos, mas esta guerra virou o clima: “Não vi uma única vez que os soldados russos tenham sido recebidos aqui com flores.”

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