Terça-feira, 23 de abril de 2024

Vingança na hora de dormir: conheça o hábito de adiar o sono

Nicóli Tombini, de 21 anos, acorda todos os dias às 6h. Mas sua hora de dormir é cada vez mais tarde, sempre postergada por conta de outras atividades que se tornaram parte de sua rotina. Meia noite, 1h, 2h: o tempo passa e ela continua a ler o livro que estava na sua lista há meses. O sono pode esperar.

A jovem faz parte de um fenômeno crescente, descrito por especialistas como “vingança na hora de dormir”. A expressão se refere ao hábito de empurrar a hora de repousar para abrir espaço para atividades prazerosas depois das demandas do dia. A tal vingança consiste em usar o tempo destinado ao descanso para ganhar um senso de liberdade de se fazer apenas o que a vontade determina.

O fenômeno foi descrito pela primeira vez para tratar de jovens chineses, que costumam encarar jornadas de trabalho em torno das 12 horas diárias. A expressão “vingança na hora do sono” ganhou popularidade depois de um post da jornalista chinesa Daphne K. Lee que viralizou nas redes sociais.

A pneumologista Erika Treptow, pesquisadora do Instituto do Sono, explica que o comportamento é uma forma de procrastinação com uma característica diferente da usual: quem adere costuma saber que pagará um preço alto pela atitude.

Faixa etária

Um estudo da Sociedade de Pesquisa do Sono de Oxford mostrou que indivíduos que engajam em altos níveis de procrastinação na hora de dormir têm mais sintomas de depressão e ansiedade, além sofrerem mais risco de insônia e terem sono pior.

Trabalhos recentes apontam que o fenômeno é mais comum em jovens entre 20 e 30 anos, que têm mais energia para sustentar as noitadas de lazer. Com a agenda cheia, eles encontram na noite um momento de fazer aquilo que não coube ao longo do dia.

Outro traço comum no comportamento vingativo é o fato ser uma escolha impulsiva, sem planejamento prévio.

Psicóloga clínica formada pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora da Associação Brasileira do Sono, Silvia Conway explica que, por conseguirem se recuperar rápido das noites de pouco sono, os jovens se privam do descanso. Depois tentam compensar em outros momentos livres, como no fim de semana.

Relógio biológico

Existem ainda os cronotipos, perfis de como cada pessoa lida com o ritmo biológico. As matutinas preferem acordar nas primeiras horas da manhã e dormir cedo; as vespertinas costumam acordar mais tarde e ter picos de produtividade à noite. Já as intermediárias conseguem se adaptar a diferentes rotinas.

O fator cronotipo de cada um influencia diretamente nas escolhas sobre a hora de dormir. Até os 18 anos, todos os seres humanos tendem ao perfil vespertino, com picos de energia durante a tarde e à noite. Já a partir dos 30 anos, segundo a teoria de ontogênese do sono, o perfil matutino passa a ser dominante.

— No Brasil, 60% da população têm um perfil biológico intermediário. Se chega tarde em casa, dorme tarde, se chega cedo, dorme cedo. Desde que isso seja ritmado, a pessoa consegue seguir assim. Os outros 40% são distribuídos por igual entre tendência matutina e vespertina — destaca Conway.

Pessoas que moram em cidades grandes e enfrentam a agitação da vida urbana diariamente têm mais predisposição a ter problemas de insônia a longo prazo.

“A procrastinação é mais comum nos grandes centros. Se a pessoa já trabalha bastante e ainda encara o deslocamento, não sobra tempo para mais nada. Essas pessoas têm uma chance maior de adiar hora de dormir. Elas pensam: “não tive nenhum momento feliz hoje”, explica Conway .

Em pesquisa recente da Proceedings of the National Academy of Sciences, o estresse foi relacionado diretamente ao envelhecimento do sistema imunológico, o que faz o corpo ter respostas menos ordenadas às ameaças feitas ao organismo. Isso também pode afetar o sono, porque nessa condição o cérebro fica mais ativo.

Duração ideal

É consenso entre especialistas que o corpo humano necessita de sete a nove horas de sono por dia para seus processos biológicos. O descanso abreviado não pode ser recuperado. Ou seja, a técnica de compensar a semana insone no fim de semana não faz sentido do ponto de vista científico.

— As pessoas costumam achar que dormir é sinônimo de não querer trabalhar, mas é o contrário. Estudos mostram que quem dorme a quantidade de horas diária adequada é mais produtivo, criativo, tem mais capacidade de convivência — ressalta Erika Treptow.

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