Sexta-feira, 09 de maio de 2025

Vírus “zumbis”: quais os riscos à saúde dos agentes que estão acordando após 50 mil anos com o aquecimento do planeta?

Acampar durante duas semanas nas margens lamacentas e infestadas de mosquitos do rio Kolyma, na Rússia, pode não parecer a mais luxuosa das viagens de trabalho. Mas é um sacrifício que o virologista Jean-Michel Claverie estava disposto a fazer para descobrir a verdade sobre os vírus zombies – mais um risco que as alterações climáticas representam para a saúde pública.

As suas descobertas lançam luz sobre a sombria realidade do aquecimento global, à medida que este descongela solos que estavam congelados há milênios. Claverie, 73 anos, passou mais de uma década estudando vírus “gigantes”, incluindo aqueles com quase 50 mil anos encontrados nas profundezas das camadas do permafrost da Sibéria.

Com o planeta já 1,2°C mais quente do que nos tempos pré-industriais, os cientistas preveem que o Ártico poderá ficar sem gelo nos verões até 2030. As preocupações de que o clima mais quente irá libertar gases com efeito de estufa retidos, como o metano, na atmosfera, à medida que o permafrost da região derrete, foram bem documentadas, mas os agentes patogênicos latentes são um perigo menos explorado. No ano passado, a equipe de Claverie publicou uma investigação que mostrava que tinham extraído vários vírus antigos do permafrost siberiano, todos eles infecciosos.

Ainda estão surgindo formas pelas quais isso pode representar uma ameaça. Uma onda de calor na Sibéria no verão de 2016 ativou esporos de antraz, causando dezenas de infecções, matando uma criança e milhares de renas. Em Julho deste ano, uma equipe separada de cientistas publicou descobertas que mostram que mesmo organismos multicelulares poderiam sobreviver às condições do permafrost em um estado metabólico inativo, chamado criptobiose. Eles reanimaram com sucesso uma lombriga de 46 mil anos do permafrost siberiano, apenas reidratando-a.

Durante anos, as agências de saúde globais e os governos têm monitorizado doenças infecciosas desconhecidas contra as quais os humanos não teriam imunidade nem terapias medicamentosas. A Organização Mundial da Saúde adicionou em 2017 uma “Doença X” genérica a uma lista de agentes patogênicos considerados de alta prioridade para investigação e para os quais pretende desenvolver um roteiro para prevenir ou conter uma epidemia. Desde que a pandemia de Covid-19 fechou o mundo durante meses, os esforços apenas se intensificaram.

Claverie mostrou pela primeira vez que vírus “vivos” poderiam ser extraídos do permafrost siberiano e revividos com sucesso em 2014. Por razões de segurança, sua pesquisa se concentrou apenas em vírus capazes de infectar amebas, que estão suficientemente distantes da espécie humana para evitar qualquer risco de contaminação inadvertida, mas ele sentiu que a escala da ameaça à saúde pública que as descobertas indicaram foi subestimada ou erroneamente considerada uma raridade.

Assim, em 2019, a sua equipe isolou 13 novos vírus, incluindo um congelado debaixo de um lago há mais de 48.500 anos, a partir de sete amostras diferentes do antigo permafrost siberiano. Ao publicar as descobertas num estudo de 2022, ele enfatizou que uma infecção viral de um patógeno antigo e desconhecido em humanos, animais ou plantas poderia ter efeitos potencialmente “desastrosos”.

O permafrost, solo que já foi repleto de vida animal, oferece as condições perfeitas para a preservação da matéria orgânica: é natural, escuro, desprovido de oxigênio e permite muito pouca atividade química. Na Sibéria, pode atingir até um quilômetro de profundidade – o único lugar no mundo onde o permafrost desce tão longe – e cobre cerca de dois terços do território russo. Descobriu-se que apenas um grama abriga milhares de espécies de micróbios adormecidos, de acordo com um artigo publicado na revista Nature em 2021.

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